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Delito de Opinião

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Luís Naves, 18.03.20

Samuel Pepys escreveu no seu diário, um dos mais famosos da literatura inglesa, páginas muito citadas sobre o incêndio de Londres de 1666 e tem entradas terríveis sobre a peste de 1665: é fácil perceber que não houve medidas de mitigação; o ceifeiro fazia a sua colheita e a sociedade arrastava-se na melancolia de contemplar a mortandade, sem imaginar como combater aquilo. No romance de Albert Camus, A Peste, Orão está isolada, em quarentena, mas a vida mantém-se, apesar da calamidade pública: os cafés estão abertos, é possível ir ao cinema. Em consequência, a doença alastra durante uma eternidade. No livro de José Saramago, Ensaio Sobre a Cegueira, as vítimas de epidemia são colocadas num campo de concentração, uma espécie de zona vermelha mais próxima do que estamos a viver. A quarentena que calhou ao nosso tempo, e que terá a sua própria literatura, vai um passo além, separando cada indivíduo o mais possível de todos os outros. Somos ilhas num arquipélago, mas a vida prossegue, ligada à velocidade da luz, através de meios de comunicação que superam o contacto físico. Estamos separados uns dos outros e muito perto, o que é paradoxal.

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