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Delito de Opinião

O Benfica e a Ucrânia

jpt, 31.01.23

Bandeira ucraniana acenada em meio à destruição provocada pela guerra

Acaba agora o Janeiro - incrível como isto voa... E se assim acaba o Janeiro seguir-se-á, dirão que teria dito o Senhor de La Palice, o Fevereiro. Por isso há hoje dois marcos: para quem se interessa pelo assunto encerra hoje o mercado de transferências futebolísticas; e neste próximo mês cumprir-se-á um ano da guerra russo-ucraniana (sim, como disse acima, o tempo voa...). Por isso volto atrás, a esse início de 22 e à que Moscovo julgou uma "guerra relâmpago", na crença putinista da adesão ucraniana aos libertadores russos - "contra o poder nazi e drogado" - e da emergência do silêncio fariseu europeu e da atrapalhação bidenesca, esta antes demonstrada em torno de Cabul.
 
Lembro esse início por cá, os russos saudados, implícita e explicitamente, pelos do "compromisso histórico", aquele entre os comunistas brejnevistas (os do "simpático" António Filipe, que se desdobrou em dislates russófilos) e dos enverhoxistas, maoístas, trotskistas, polpotistas e quejandos, em tempos agregados sob os velhos Louçã/Rosas/Fazenda e agora ditos "sociais-democratas" sob as "meninas" do Rosas. Todos esses neste putinismo agregados aos fascistas, ditos "soberanistas", esses do tipo Tanger, o dirigente do CHEGA em tempos tão peculiar nosso cônsul em Goa - "once a fascist always a fascist" poder-se-ia clamar se não tivéssemos dado o nome de um hitleriano ao aeroporto da capital...
 
Enfim, devaneio, a embrulhar o que foi óbvio: no início da guerra ucraniana fascistas e comunistas ergueram-se a defender a legitimidade do "espaço vital" russo - o argumento nazi então adoptado pela futura professora do ISCTE Mortágua, a "inteligente" do BE. E a maioria da sociedade ergueu-se, irada ou incomodada, em defesa da agredida Ucrânia, tal como aconteceu nas congéneres democracias. Desde então seguiu o apoio possível (apesar das trapalhadas ministeriais - vão os tanques diz o MNE, não vão os tanques diz a ministra da Defesa, enfim, quem conheça os ministros que lhes pergunte o que andam para ali a fazer...). O país aderiu, Milhazes mandou os russos para o "caralho" e virou ícone, cerrámos fileiras com as democracias ocidentais contra o imperialismo russo e nisso até aturámos os generais comunistas e os académicos "alterglobalistas" e "abissais" a defender Putin nas tvs e jornais "de referência". "Comme il faut" na democracia, dar a voz pública aos trastes...
 
Isso implicou as possíveis sanções económicas (dada a dependência energética) - mas ainda assim imensamente maiores do que o então foi alvitrado. Cesuras político-diplomáticas. Enorme apoio militar a Kiev, e económico. E ruptura de relações desportivas, pois estas entendidas como vector de propaganda nacionalista. E tudo isso implicando, por cá e alhures, inflação, empobrecimento, convulsão política e aquecimento intelectual. No início também uma, compreensível mas logo combatida, xenofobia: alguns factos de "cancelamento" ou censura a vultos russos. Logo revertidos, no entendimento que as objecções a ter não são contra os cidadãos russos (muitos em êxodo após as mobilizações generalizadas). Mas sim contra o Estado de Putin, os seus grandes apoiantes (ditos "oligarcas") e as empresas russas. Tudo isso são os custos da luta (guerra) pela democracia, por defeituosa que esta seja e surja aqui e ali.
 
Mas entretanto, hoje, 31 de Janeiro, quando avançamos para um ano de guerra inaceitável, o Sport Lisboa e Benfica, instituição de utilidade pública e sempre sequiosa do apoio estatal, anuncia o segundo acordo com clubes moscovitas para transferência de jogadores de futebol. Não há um ruído na imprensa, não há um desconforto governamental, um remoque partidário. Nem um protesto dos "democratas" benfiquistas. A direcção do popular clube vira as costas ao Estado, à sociedade, no afã de uns milhõezinhos de euros naquela economia paralela do jogo. Ou seja, a escumalha da bola faz o que quer no país de opereta... E os nossos líderes nada mais anseiam do que o convite para os camarotes, enquanto os "colunistas" nada mais querem do que o fakeorgasm do Marquês...
 
E se isto não é um sinal da derrota democrática então não sei do que precisais. Eu reencho-me de Queen Margot e ouço o velho "Safe European Home". Porque o punk não são os putinistas identitários...
 

London Calling_Safe European Home/The Clash in Japan1

Constituições do Mundo (1)

Angola: Constituição de 2010

Pedro Correia, 31.01.23

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«Angola é uma República soberana e independente, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade do povo angolano, que tem como objectivo fundamental a construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social.»

 

«1. A República de Angola é um Estado Democrático de Direito que tem como fundamentos a soberania popular, o primado da Constituição e da lei, a separação de poderes e interdependência de funções, a unidade nacional, o pluralismo de expressão e de organização política e a democracia representativa e participativa.

2. A República de Angola promove e defende os direitos e liberdades fundamentais do Homem, quer como indivíduo quer como membro de grupos sociais organizados, e assegura o respeito e a garantia da sua efectivação pelos poderes legislativo, executivo e judicial, seus órgãos e instituições, bem como por todas as pessoas singulares e colectivas.»

 

Artigos 1.º e 2.º da Constituição da República de Angola

Umas chamuças no Carvalhal

jpt, 31.01.23

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Ontem avancei até ao mar, ali ao novo Algarve, este que olha a Arrábida. Acobertado por um dia soalheiro, acolhido por areal deserto e águas azulíssimas. Aportado à praia do Carvalhal lá ouvi um bar veraneante, típico: caro será ao que me dizem, que nem entrei pois tão estridente era a banda sonora. Escutar o mar?, coisa em desuso para aqueles tardo-adolescentes já quarentões que povoavam a esplanada.
 
Impulsionados pela minha companheira de andanças, a melhor companhia a que poderei almejar, avançámos areias afora, bordejando a maré enchente, até à do Pego, um bom trajecto para um sedentário quase sexagenário, e nele a encher-me de ânimo, este advindo do Sol, maresia e companhia. Depois retornámos via estrada, uns 5 kms, do "Pego ao Carvalhal" trauteei eu... Um belo passeio logo tornado visita de estudo, a descobrir o que não imaginava, o como está tudo aquilo - obras constantes, todos os talhões remanescentes a serem construídos, casas térreas (vá lá...) a germinarem, num afã do aglomerado, como se num culto do atravancado, dito "urbanização". Ainda vislumbrei alguns habitantes, os pobres, claro, ainda ali "resilientes" mas que decerto em breve partirão. De resto ninguém, ainda a "vilória fantasma" do turismo. "Daqui a uns anos passarás por aqui, se calhar até com os teus filhos...", "e lembrar-te-ás deste nosso passeio, e contarás, repetir-te-ás, como eu, com as minhas histórias sempre as mesmas": "um dia vim aqui com o meu pai e não havia nada disto, era completamente diferente", culminei eu, já diante do carro, anunciando-lhe a algarviada mansa que ali virão a chamar cidade.
 
Esfaimados parámos no Carvalhal, a aldeia mesmo. Abancámos num pequeno café-restaurante. Nas minhas costas o dono assomou à esplanada e falou com a outra parca clientela. Logo reconhecemos o sotaque. Não resisti e perguntei-lhe de onde vinha, "lisboeta" disse-se... Mas na hora de pagar insisti, num "você vem de onde mesmo?, não leve a mal mas é o seu sotaque...". E o mais-novo, simpático risonho, diz-me "da Ilha de Moçambique, vim em 1974". "Claro!!", clamei, rindo-me/nos, e cinco décadas passadas não lhe fizeram perder o sotaque ganho em criança, e tão suave, afável, ele é...
 
"Então é por isso mesmo", completei, "que as chamuças são tão boas"!, "receita de lá, com condimentos especiais" logo afiançou o patrão. E isso posso eu comprovar, chamucista encartado que sou: as chamuças do Pica peixe são mesmo muito boas. Por elas se justifica ir ao Carvalhal... antes da tal cidade que aí vem.
 
(Antes colocado no Nenhures)

Hoje é dia de

Maria Dulce Fernandes, 31.01.23

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Hoje é O Dia Mundial do Mágico

«A 31 de Janeiro assinala-se o Dia Mundial do Mágico, em homenagem a estes profissionais que encantam pessoas de todas as idades. Ao longo dos séculos, as técnicas de ilusionismo vêm sendo aperfeiçoadas um pouco por todo o mundo.

Essa data foi escolhida por mágicos espanhóis para homenagem São João Bosco em alusão ao dia da sua morte, 31 de Janeiro de 1888. João Melchior Bosco, nome de nascimento desse santo italiano, trabalhou como mágico durante a adolescência para ganhar algum dinheiro destinado a apoiar a família. A um tempo, exercia uma profissão e levava alegria a outros jovens. Viria a ser considerado, além de padroeiro dos mágicos, padroeiro dos jovens.»

 

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Hoje é O Dia da Fita Adesiva

«Surgiu um problema quando os carros estavam a ser pintados em dois tons e as secções precisavam de ser coladas para esse efeito. Foi assim que o inventor norte-americano Richard Drew (1899-1980) criou a fita adesiva. 

Há cem anos, Drew trabalhava numa empresa que fabricava lixas. Quando entregava amostras para oficinas mecânicas, observava o incómodo que os pintores de carros sentiam quando tinham de pintar carros bicolores. Naquela época, fitas adesivas cirúrgicas ou colas de biblioteca eram usadas para colar jornais a carros durante a pintura. No entanto, quando os jornais eram removidos, ficavam resíduos que rasgavam a tinta quando descascados. Isso inspirou Drew a criar uma solução eficiente e de longo prazo. Inventou assim a fita adesiva feita de papel crepe, cola de marceneiro e glicerina. Aderiu bem aos carros e saiu facilmente sem remover a tinta. Mais tarde, foi comercializado como Scotch Masking Tape.

A invenção da fita adesiva, que agora pode ser encontrada em quase todas as casas, resultou na inclusão de Drew, com todo o mérito, no Hall da Fama dos Grandes Inventores.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 31.01.23

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André Couto: «Sou politicamente insuspeito no elogio ao nosso Adolfo Mesquita Nunes, a quem hoje foi entregue a Secretaria de Estado do Turismo. Estou certo que todos neste espaço, autores e leitores, lhe damos a maior força, certos de que estará à altura de tão nobre desafio. A aposta no Turismo por parte do Governo tem sido curta e, diga-se, por parte da oposição as críticas têm sido estilo calças pelos tornozelos. Não é preciso, no entanto, ser visionário, para perceber que este pode ser um sector chave na recuperação económica do País, através da geração de emprego e captação de investimento.»

 

José António Abreu: «Na realidade, nem precisamos de ficar pelo 25 de Abril. Atendendo a que os governos imediatamente anteriores ao dito também não eram recomendáveis, para encontrar melhor (ou menos mau) teremos de recuar até... até... credo, é demasiado deprimente pensar nisso. Tal como constatar quão repletas de nada as alternativas permanecem, incluam ou não esse estandarte da boa gestão da coisa pública (é o que ouço dizer) chamado António Costa, devidamente acolitado pelos saudosistas do grande flâneur dos boulevards parisienses.»

 

José Maria Gui Pimentel: «A súbita queda do spread -- que se encontra já em quase metade dos valores de início de Setembro -- não resultou de nenhum factor específico de Portugal. Isto não invalida, ainda assim, que o Governo possa com alguma propriedade argumentar que as suas políticas -- nomeadamente a relativa acalmia conseguida, apesar de tudo, nos últimos meses e a aprovação do Orçamento -- permitiram que os factores externos que beneficiaram a dívida portuguesa pudessem actuar.»

Hoje é dia de

Maria Dulce Fernandes, 30.01.23

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Hoje é O Dia Escolar da Não-Violência e da Paz

«Esta data foi instituída em 1964, em Espanha, pelo poeta, pedagogo e pacifista maiorquino Llorenç Vidal Vidal. Foi escolhida como forma de assinalar o 15.º aniversário do falecimento do pacifista indiano Mahatma Gandhi. Tratou-se de uma iniciativa pioneira, não-governamental, independente, gratuita e voluntária para popularizar os ensinamentos da “educação não violenta e pacificadora”, absorvidos pelos quadros educacionais em todo o mundo.

Hoje, este dia é comemorado mundialmente, também conhecido pela sigla DENIP, derivada do nome espanhol. O DENIP trabalha para promover uma educação que valorize a não-violência e a paz. 

Neste dia, escolas em diversos países organizam eventos e conferências onde educadores, professores e alunos de todos os níveis são convidados a debater a melhor forma de criar sociedades não violentas, pacíficas e justas, fundadas no respeito universal pelos direitos humanos.»

 

O nascimento é um violento acto de amor, mas não é por isso que os seres humanos se tornam violentos. Como dignos descendentes dos símios, somos uns macaquinhos de imitação. A fala, por exemplo, adquire-se imitando os sons que se ouvem, numa tentativa de os reproduzir. Sendo as crianças esponjas de conhecimento, absorvem tudo o que é bom e também o que é mau. É função dos progenitores ensinarem-lhes a separar o trigo do joio, para que quando interajam com outras crianças haja reciprocidade na convivência. Não se pode nem deve exigir às famílias menos do que isto.

 

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Hoje é O Dia do Croissant

«O famoso pãozinho de massa folhada faz sucesso em muitos países. Feito com recheios doces ou salgados, o croissant tem uma história lendária. Ao contrário do que muitos pensam, não é de origem francesa mas austríaca. Nasceu em 1683, em Viena.

Inicialmente, chamaram-lhe viennoiserie, e só foi conhecido pelos franceses por volta de 1770. Foi a austríaca Maria Antonieta, que viria a ser rainha de França, quem encomendou a iguaria. Croissant, do francês, significa “crescente”, em formato de meia-lua. Durante o cerco de Viena pelos otomanos, um padeiro assou uma massa em forma de meia-lua para simbolizar a bandeira da Turquia e chamou-lhe Croissant [Crescente] para a Paz.

Nas suas primeiras receitas, era um pouco diferente do que conhecemos hoje. Com massa mais pesada e mais densa, semelhante a um pão comum. No início do século XX um padeiro francês decidiu alterar a receita, tornando a massa folhada mais leve e crocante. Daí vem a constante confusão que o croissant é uma invenção gaulesa, mas em França apenas refinaram a receita original dos austríacos.»

 

Parentes afastados dos originais e dos tradicionais, os croissants feitos de farinha integral e com sementes são a melhor maneira de começar o dia junto a uma chávena de café, quente e aromático. Com fiambre, queijo ou doce, são a fundação do meu dia de trabalho e são uma delícia.

(Imagens Google)

Em memória atrasada de Mikhail Gorbachov

João Pedro Pimenta, 30.01.23

O mês de Janeiro de 2023 já vai a caminho do fim, em que parece que andei nos momentos e regiões certas atrás das intempéries, como a de Ano Novo no Alto Minhoa do segundo fim de semana no Porto e a da terceira semana nas terras altas transmontanas. E apesar disso, ainda fiquei com assuntos pendentes de 2022.

Uma das coisas que se menciona sempre no ano que acaba é o da necrologia. E esta esteve em destaque em 2022. A quantidade de personalidades de relevo internacional que nos deixaram é enorme. Talvez a que mais sensação tenha causado tenha sido Isabel II, que parecia eterna, e já mesmo no caír do ano deixaram-nos Pélé, provavelmente a maior lenda do futebol de sempre, e o Papa Bento XVI, cujo estado de saúde já declinava há bastante tempo. Uma rainha, um rei e um Papa, portanto.

Há muitos anos, na década de noventa, o Expresso lançou um destacável com mil figuras de relevo do século XX para celebrar a sua milésima edição. O primeiro capítulo tinha cinquenta personagens consideradas as mais relevantes do século. Duas delas morreram em 2022. Pélé era uma delas. A outra era Mikhail Gorbachov.

Gorbachov deixou-nos nos últimos dias de Agosto, enaltecido pelas democracias liberais e ignorado ou desdenhado pela sua Rússia. Putin deixou umas palavras de circunstância, apenas porque tinha de ser. O homem que tentou dar um rosto humano à URSS (literalmente, bastava olhar para ele e comparar com as faces patibulares ou caninas dos outros apparatchiks) e um rumo àquele sistema bloqueado e sem saída acabou por derrubar o regime e a próprio União Soviética. Pelo meio, assinou com os EUA o tratado de não proliferação de armas nucleares, o que causou o degelo nas relações entre blocos, aliviando o "equilíbrio pelo terror" e acabando efectivamente com a Guerra Fria. Rasgou a "Doutrina Brejnev", substituindo-a pela "Doutrina Sinatra", escusando-se a intervir nos países do Pacto de Varsóvia, cujos povos aproveitaram a oportunidade para derrubar os muros e respectivos regimes, já sem a ameaça de intervenção soviética. E internamente, também os integrantes da URSS começaram a questionar-se e a declarar a autonomia, começando pelo Báltico. O fim da Guerra Fria permitiu igualmente que do outro lado os EUA deixassem de apoiar certos cães de fila, o que originou, entre outras coisas, o fim da regime do Apartheid na África do Sul e a libertação de Nelson Mandela, a saída de Pinochet dos comandos do Chile e o fim da guerra civil em Angola (por pouco tempo) e Moçambique.

 

 

Poucos homens estiveram na origem de mudanças tão drásticas e radicais, mesmo que a intenção inicial não fosse essa. O problema é que internamente elas resultaram na implosão de um sistema que era totalitário, desumano e falhado, mas que deu lugar a anarquia, pobreza e violência extremas. Não era isto que realmente Gorbachov e os russos desejariam, mas acabou por ser o resultado, de tal forma que no fim da década de noventa colocaram um tal Vladimir Putin à frente dos destinos do país.

A morte de um ser desta dimensão nunca é positiva, mas o desaparecimento de Gorbachov ocorreu na pior altura possível, precisamente quando o regime vigente na Rússia está mais tirânico do que nunca desde Tchernenko - ou seja. a URSS pré-Gorby - e representa exactamente o contrário do que o último líder soviético representava: autoritarismo, corrupção, opacidade, militarismo e ultranacionalismo. E a tentativa de reversão das independências obtidas à época, com a brutal invasão à Ucrânia, depois de se ter mutilado a Geórgia e a própria Ucrânia.

Porque a morte de Gorbachov em Agosto levou-me a outro Agosto, o de 1991, em que fora vítima de um golpe de estado dos últimos defensores do regime soviético puro e duro. Recordei-me das imagens dos russos manifestando-se em Moscovo, de Ieltsin em cima de um tanque, com a Duma (a mesma que ele mandaria atacar dois anos depois) em fundo, a conferência de imprensa da junta golpista num anfiteatro de dimensão estalinista (diz-nos José Milhazes, então presente, que o primeiro-ministro Valentin Pavlov estava ausente porque não tinha recuperado de uma bebedeira na véspera), e a cara de fuinha do auto-proclamado presidente, Yanayev, e depois o falhanço do golpe e o regresso de um Gorbachov pálido mas aliviado. Vi tudo isso num mês em que não podia fazer muito mais porque decidi partir uma perna logo no último dia de Julho, o que constituiu um rude golpe nesse meu começo de adolescência.

 

 

E também nesse Agosto, aproveitando o fiasco do golpe, o que restava de facto da URRS ruiu. Lembro-me das imagens do anúncio do fim do regime comunista e em simultâneo da restauração da bandeira russa. Pensei até há pouco tempo que tivesse ocorrido no dia dos meus anos, mas afinal é de dois dias antes, 22 de Agosto. Em contrapartida, fiquei a saber há pouco tempo, por causa da guerra em curso, que a Ucrânia tinha como dia da independência precisamente o 24 de Agosto (de 1991). Assim, eu e a Ucrânia fazemos anos no mesmo dia. Como não poderia apoiar a causa da sua independência?

Gorbachov deixou-nos no mesmo mês - mas em ano diferente - em que as suas reformas e a reação às mesmas precipitaram tudo aquilo que era impossível manter. Que a sua memória seja no futuro tão favorável como a dos povos que graças a ele ganharam a sua liberdade.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 30.01.23

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Ana Vidal: «Ainda vou na primeira volta e já estou em estado catafórico. Dou graças aos céus por já não ter filhos (e ainda não ter netos) em idade de precisarem de ajuda com os trabalhos de casa, porque me sentiria pouco mais do que atrasada mental. O drama é, afinal, muito mais extenso do que a imposição de um estúpido e inútil acordo ortográfico. O problema de fundo é que o funcionamento da língua não funciona.»

 

JPT: «A sociedade portuguesa indiscutiu o colonialismo. Ou seja, manteve a sua histórica inconsciência colonialista, muito baseada no velho mito do "modo especial de ser português", aliás, do "modo especial de ser colono". Isso implica a manutenção, fluída, de estruturas mentais sociais que condicionam categorizações e relacionamentos, as quais subsistem, como é óbvio, numa multiplicidade de conteúdos - entenda-se, "cada um como cada qual", ou seja, as perspectivas individuais não são determinadas mas são, isso  sim, influenciadas.»

 

Luís Menezes Leitão: «A ala socrática do PS deixou-se de tal forma contaminar pela irrealidade, que julgou que bastava um jantar com o seu querido líder para poder patrocinar uma espécie de Revolta na Bounty no PS. António Costa seria o imediato que destituiria o Capitão Bligh, que os socráticos odeiam por ser incapaz de cantar hossanas ao Governo anterior que atirou o país para a bancarrota. Para isso António Costa já andava à procura de figuras no PS que disputassem a Câmara de Lisboa, mas ninguém se mostrou disponível para defender a desastrada gestão de Costa/Salgado à frente da capital.»

Hoje é dia de

Maria Dulce Fernandes, 29.01.23

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Hoje assinala-se O Dia Internacional dos Livres-Pensadores

«Este é um dia em que todas as pessoas não apenas têm o direito de pensar fora da caixa, mas também são encorajadas a fazê-lo. Incentiva-nos a pensarmos e a exprimirmo-nos em liberdade, começando por quem vive oprimido em sistemas ditatoriais.

O Dia dos Pensadores Livres é comemorado no aniversário de Thomas Paine (1837-1809), célebre político e pensador britânico cujos livros expandiram a filosofia do iluminismo, influenciando o curso das revoluções americana e francesa. Foi um dos pioneiros a teorizar sobre direitos humanos universais e o fim da escravidão.

A revista norte-americana The Truth Seeker, existente desde 1873, lançou a ideia da celebração desta data há cerca de 30 anos para acentuar os benefícios da liberdade, sugerindo que fosse assinalada com uma rosa branca com espinhos. A cor branca simboliza pureza, fragilidade e beleza; os espinhos representam as dificuldades em as alcançar.»

 

Poder pensar pela própria cabeça é uma dádiva. Nos dias de hoje, o pensamento encontra-se muito condicionado às notícias, sejam elas verdadeiras, falsas ou inqualificáveis. Ainda assim a nossa apreciação do que nos rodeia e as nossas inferências reflectem-se na tão celebrada caixa, que mantemos hermeticamente fechada ou aberta às novidades.

 

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Hoje é O Dia Mundial do Puzzle

«Dia instituído em 1995 nos EUA por empresas de jogos para promover este passatempo cada vez mais popular. Puzzles de todos os tamanhos e feitios estão em destaque nesta data anual.

O primeiro quebra-cabeça foi criado por volta de 1760 por um cartógrafo britânico chamado John Spilsbury, que montou um mapa em madeira e serrou à volta de cada país ali desenhado. Esta construção começou como mera distracção, mas acabou por ser um instrumento muito útil para crianças e jovens aprenderem Geografia.

No início do século XX, revistas e jornais descobriram que poderiam atrair mais leitores publicando nas suas páginas diversos passatempos, incluindo quebra-cabeça.»

 

De todos os quebra-cabeças, os puzzles são os que gosto menos. Não tenho o nível de paciência necessário para passar horas a encaixar peças cujo sentido, seja ele uma foto, uma paisagem, etc. nos é dado a conhecer de antemão. Faz sentido apenas como passatempo, mas creio que existem melhores maneiras de passar o tempo.

(Imagens Google)

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 29.01.23

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Adolfo Mesquita Nunes: «A razão pela qual cheguei a France Gall é suficientemente ridícula para que a deixe para outra ocasião. Mas foi nesse momento, em que a vi e ouvi cantar, que começou esta minha - também ela ridícula - queda por cantoras de vozes limitadas, na vertigem da afinação e sempre à beira do abismo. Mas voltemos a France Gall, que é dela que quero falar. Quem a visse cantar as músicas de Serge Gainsbourg, ainda adolescente e com ar inconsciente, não podia deixar de perguntar: mas sabe ela o que está a cantar, percebe ela o significado das coisas que o Gainsbourg lhe escrevia para cantar?»

 

João André: «Ontem a Rainha Beatrix da Holanda (não gosto da "tradução" de nomes, mesmo de monarcas) comunicou ao país que no dia 30 de Abril, o dia da Rainha, abdicaria do trono em favor do filho mais velho, Willem-Alexander. A razão invocada foi o seu 75º aniversário e os 200 anos da Holanda como país. Nos seus 33 anos de reinado, Beatrix conseguiu construir uma influência determinante para a harmonia do país. Não tendo muitos poderes reais, Beatrix será hoje a mais influente figura política do país.»

 

Eu: «Já ouvi hoje, pela primeira vez, na televisão: alguém afirmou de dedo em riste que se "de têta" não sei o quê "no mapa". Era de esperar.»

Blogue da semana

Marta Spínola, 28.01.23

De vez em quando volto ao histórias em 77 palavras. Entendo a escrita também como um exercício e gosto dos desafios ali propostos, ajudam a sair da inércia, mostram-me outros caminhos por onde ir. Sem pensar muito, descubro como escrever sobre um bule de chá, um texto com limite de letras - não em número, limite das próprias vogais e consoantes - ou em anagramas. 

Também gosto de ler que soluções encontraram outros participantes, verificar a riqueza da escrita na variedade de textos que surgem de um mesmo exercício. 

Fica a proposta, mais que a visita ao blogue, para quem quiser experimentar vaguear pelos mais de 200 desafios já lançados.

Ler (17)

O prazer da descoberta de revistas antigas

Pedro Correia, 28.01.23

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De novo confesso a minha paixão por frequentar alfarrabistas. Não apenas para adquirir livros antigos (como os três volumes da Guerra e Paz, em estado impecável, na edição portuguesa de 1957 com tradução do filósofo José Marinho), mas também revistas. Volta e meia, num dos meus alfarrabistas preferidos, abasteço-me de exemplares antigos da Paris Match, que ainda se publica. 

Já tinha falado disso aqui, há mais de dois anos, estávamos ainda aprisionados pela pandemia. Regressei lá recentemente, trouxe mais umas quantas. E deixo-me absorver por estes restos de uma colecção particular, agora desfeita certamente por decisão dos herdeiros.

Como se mergulhasse noutros tempos, contemporâneos ou anteriores ao dia em que nasci, e testemunhasse quase em directo acontecimentos entretanto transportados para enciclopédias e manuais de História. 

 

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«Isabel e Filipe reunidos em Lisboa», proclama um dos títulos. É o da edição n.º 412, de 2 de Março de 1957. Sobre a Rainha britânica, há pouco falecida, e o seu marido, o Duque de Edimburgo, que morreu quase centenário em Maio de 2021. Então eram ainda jovens, tinham décadas de vida à sua frente. 

Com três enviados especiais, a Paris Match faz uma cobertura exaustiva em 12 páginas da visita da monarca a Portugal, onde reencontrou o marido, que andara em missão oficial à volta do globo. Após 125 dias de separação, «uma nova lua-de-mel» começou em Lisboa, assinalaram os repórteres. Com excelentes fotografias em destaque, nunca funcionando como tapa-buracos de textos. 

 

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Somos, assim, testemunhas da História.

O primeiro sorriso de Isabel, desembarcada no Tejo, para o marido. Ao lado, o Presidente Craveiro Lopes (Lopez, lia-se na legenda).

O desfile pela capital, no mesmo coche real que transportara o seu bisavô Eduardo VII em 1903, na anterior visita de um monarca britânico.

A passagem pelo Rossio, cheio de mirones «até nas árvores», como assinalava a revista, com um mar de gente a gritar «Isabel!». Num país onde as manifestações populares estavam proibidas.

As imagens do faustoso esplendor na tribuna presidencial do Teatro de São Carlos, com Salazar - rara aparição em eventos públicos - num discreto segundo plano.

Uma extraordinária fotografia do jovem casal numa apoteótica recepção no Porto, cidade que a Rainha quis expressamente conhecer, em visita à margem do protocolo de Estado. 

 

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Portugal surge em foco noutra revista. A n.º 618, de 11 de Fevereiro de 1961. Dedicada em grande parte ao assalto ao Santa Maria, então emblema máximo dos nossos navios dedicados ao turismo de luxo.

Paris Match foi o primeiro grande título da imprensa internacional a embarcar no paquete com centenas de passageiros à mercê de um grupo armado luso-espanhol de opositores de Salazar e Franco. Os repórteres chegaram da forma mais insólita: de pára-quedas. Um deles, falhando o salto devido ao vento, passou longos momentos de angústia no mar, rodeado de tubarões.

Era o fotojornalismo no apogeu, muito antes da tecnologia digital e dos actuais meios de transmissão de imagens e texto.

Mergulho com assombro neste trabalho que valeu à Match reputação mundial. Com fotos exclusivas dos passageiros (incluindo muitas crianças), dos tripulantes portugueses e dos assaltantes, com destaque para o comandante dos "corsários": Henrique Galvão (a quem a revista chama Enrique Galvao), ex-salazarista convicto convertido à causa da democracia e apostado no derrube violento de Salazar.

 

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Tantas outras histórias estas revistas continuam a narrar-nos, várias décadas após terem sido impressas.

A edição n.º 749, de 17 de Agosto de 1963, informava que a vivenda californiana de Marilyn Monroe, ali falecida um ano antes numa noite em que não conseguiu suportar a solidão, acabara de ser vendida. Um letreiro, colocado no exterior do portão, confirmava com linguagem expedita de negociante americano: «Vendida - mas temos outras». Ignorava-se a identidade do novo proprietário, mas a Match desvendava um segredo: Joe di Maggio, o segundo dos três maridos da malograda actriz, mandava depor rosas no seu túmulo três vezes por semana.

Na edição n.º 625, de 1 de Abril de 1961, com a deslumbrante actriz belga Catherine Spaak na capa, deparo com este título: «Gable júnior repõe na viúva um sorriso de mamã.» Nascia o filho póstumo de Clark Gable, quatro meses após o súbito desaparecimento do intérprete de E Tudo o Vento Levou. A vida imitando a ficção, em toada de melodrama: o eterno galã das matinés sempre alimentara o sonho de ser pai. Aconteceu, mas já cá não estava para conhecer o bebé.

 

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Regresso à edição n.º 749: o destaque vai para o Presidente norte-americano. De semblante sombrio, nada sorridente. O casal John e Jacqueline acabava de perder Patrick: o filho recém-nascido sucumbira ao fim de dois dias, naquele funesto Agosto, vítima de graves problemas respiratórios. 

Um instantâneo revelava-nos um Kennedy destroçado, ao fundo de um elevador que o conduzia ao quinto andar do hospital onde iria velar o filho que mal chegara a viver. «Como o Presidente foi apenas um pai dorido», proclama o título. 

A revista desfia pormenores. Jackie transportada de helicóptero para o hospital quando se encontrava na casa de praia e logo submetida a uma cesariana, o marido interrompendo uma audiência na Casa Branca com membros do Comité Contra os Ensaios Nuclares e voando para Boston. Depois, horas de angústia perante a incubadora: o recém-nascido nem tinha força para chorar. Foi o próprio John a dar a desoladora notícia à mulher, ainda a recuperar do parto prematuro.

Tragédia no sonho americano. Como se antecipasse um luto de muito maior impacto, prestes a chegar, três meses depois. Com Kennnedy ceifado por balas traiçoeiras em Dallas que lhe roubaram a vida e abalaram o mundo.

Fragmentos de História. Que nos elucidam, comovem e deslumbram em simultâneo. 

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