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Delito de Opinião

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 27.09.21

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José Maria Gui Pimentel: «As corridas de toiros são uma instituição defensável, com argumentos lógicos. Porém, fingir que não se percebe a questão, valendo-se de comparações despropositadas, não tem outro nome senão desonestidade intelectual. É profundamente irritante o modo como alguns dos poucos comentadores que têm o privilégio de apenas ter como adversário um jornalista mais concentrado na condução da emissão do que no debate do tema em questão desbaratam esse capital utilizando constantemente argumentos falaciosos.»

 

Luís M. Jorge: «Assim estragou-se a propriedade privada de um cidadão cumpridor que manifestava, como se nota, imenso carinho pelo seu prédio. Acode-nos, Virgem Maria.»

 

Luís Menezes Leitão: «Há muito que sabemos que a Câmara de Lisboa é amiga dos grafiteiros. Não é amiga é do povo de Lisboa. É por isso que é isto que vemos em toda a Lisboa. Alguns graffitis podem ter alguns laivos artísticos, mas isso não justifica a utilização da propriedade alheia sem consentimento dos seus donos. A esmagadora maioria dos graffitis é pura e simplesmente horrível, gerando um ambiente degradado. Por mim, é Rui Rio que pode descer a Lisboa que faz cá muita falta.»

 

Rui Rocha: «A extinção da Fundação para as Comunicações Móveis e o fim da distribuição dos computadores Magalhães simboliza o ponto final na ilusão de que seria possível tornar Portugal um país mesmo muito evoluído. Com Sócrates, tinha a secreta esperança de que, embalado pelo sucesso dos programas E-escolas E-escolinhas, este viesse a lançar os programas Rodas e Rodinhas. Através dos quais seria possível aos pacatos e ordeiros cidadãos lusitanos adquirirem viaturas topo de gama ou compactos familiares por, respectivamente, 2000€ e 1000€ a unidade, ficando a seu cargo, apenas, as revisões periódicas junto dos concessionários oficiais das marcas aderentes. E a substituição dos pneus. Com estes miserabilistas que lá estão agora, já vi que nada feito.»

 

Teresa Ribeiro: «A revista Gingko vai estar no Green Festival com um programa à sua medida, ou seja, perfeito. Sou insuspeita (cof, cof, cof), por isso posso afirmar sem constrangimentos que fazem muito mal se não passarem pelo Estoril para participar numa das actividades da sala Gingko.»

O Leal fascista

José Meireles Graça, 26.09.21

Chamar alguém de fascista é um insulto que infelizmente os comunistas degradaram pelo excesso de uso.

Tudo pela Nação, nada contra a Nação, era o mote da seita, que oferecia um modelo completo de governação. Tão completo que, tecnicamente, ninguém é fascista salvo os apaniguados de Mussolini, todos os outros defensores de regimes estatistas subscrevendo diferenças em relação ao modelo original, com características próprias que, nuns casos mais e noutros menos, dele se afastavam.

É o que dizem os entendidos de respeito, que se recusam a classificar o regime salazarista, por exemplo, de fascista. E não dizem os comunistas porque, como o fascismo histórico foi derrotado, e o seu principal estadista pendurado de cabeça para baixo numa praça em Milão, tachar alguém de fascista já implica que defende ideias derrotadas, para além de odiosas.

As palavras, porém, ganham vida própria, e que se danem os rigores históricos e os tecnicismos. E na verdade, se reduzíssemos o fascismo a uma doutrina que faz prevalecer os conceitos de nação e raça sobre os valores individuais e que é representado por um governo autocrático, centralizado na figura de um ditador, quase nenhum regime seria hoje fascista, salvo talvez o chinês; mas se substituirmos nação por humanidade, raça por género, e governo por centrão rotativista, então fascistas há por aí avonde.

Fascista, para um comunista, é todo aquele que defende a liberdade económica e portanto aceita a desigualdade material que daí resulta; e para mim, que não sou menos do que um comunista e tenho igual direito de me borrifar para o rigor dos conceitos, fascista é todo aquele que vê com bons olhos o atropelo de direitos individuais em nome de um bem maior que arbitrariamente define. Dantes era a nação e agora é o que se queira: podem ser os direitos das mulheres e por isso se pretendem estabelecer regras processuais penais diferentes para os crimes contra elas; podem ser os “direitos” dos animais sencientes (senciência que exclui desde logo, abençoadamente, as lombrigas, mas não, incompreensivelmente, os ratos), e por isso se pretende acabar com as touradas; e pode ser o SNS e por isso há quem entenda que todo o vício (exagero: não é todo, é apenas aquele que possa originar doenças ou achaques e que o portador de tais opiniões não tenha) deve ser activamente combatido pelo Estado a golpes de proibições e sanções, em nome da sustentabilidade do SNS, que deve começar “a ser encarada como obrigação de cada um de nós”.

O truque consiste em defender um valor qualquer que seja consensual, neste caso a “sustentabilidade” do SNS, e absolutizá-lo. Isso faz com que a voz ou o comportamento dissonante sejam antissociais, e fica aberta a porta para a repressão. Que se danem os direitos individuais, sem cuja compressão valores colectivos imaginariamente superiores podem ser ofendidos, desde logo pela livre expressão da opinião.

É daqui que vem o combate às notícias falsas e o labéu do negacionismo: para que as notícias sejam falsas alguém assim as define, muito mais do que alguém assim as demonstra, e o negacionismo considerado perigoso é o que belisca a verdade oficial, não o que, no mercado das ideias, se cobre de ridículo. Que haja uns cómicos a acreditar que a terra é plana, ou que a humanidade nasceu exactamente há oito mil anos, duzentos e trinta e um dias, não são notícias que valha a pena censurar; mas que no imenso catálogo das medidas da “luta” anticovid, se considerem inúteis muitas, abusivas outras, contraproducentes bastantes, indutoras de males maiores do que os pressupostamentes evitados a maior parte – isso é que não pode ser. E não pode porque que o País estude, represente, reclame, discuta, mas que obedeça quando se chegar à altura de mandar, é o que o Poder deseja, a bem da grei. E como, dada a urgência, por causa do progresso das infecções e da intranquilidade pública que a comunicação social alimenta, a opinião exige medidas: do que se precisa é de obediência porque a altura de mandar já era ontem.

Temos então que há uns depositários de uma acendrada noção do que é o bem público que sabem, o que sabem calha coincidir com o que julga saber a maior parte do eleitorado e neste quadro os que discordam podem até às vezes, em nome da liberdade, dizer o que lhes vai na alma, desde que obedeçam. E, se não obedecerem, são completamente livres de o fazerem desde que não tenham os mesmos direitos que os bons cidadãos: podem perfeitamente achar que não se devem vacinar, mas não podem entrar num restaurante aos fins de semana sem exibir um certificado, nem viajar de avião, nem, nem. Hoje. E amanhã ou vivem da forma que os savonarolas da saúde acham indicada ou terão o direito de ir ao privado, porque ao público não, que está reservado a quem exiba certificados vários de bom comportamento.

Fernando Leal da Costa é um destes iluminados. Às tolices arrogantes que defende no Observador Henrique Pereira dos Santos responde cordata e certeiramente: recomendo a leitura para se entender a maneira insidiosa como o fascismo higiénico faz o seu caminho e quais são os argumentos ao dispor das pessoas de senso.

Este conflito é novo: de um lado estão os amantes da liberdade e do outro os fascistas, enquanto dantes de um lado estavam fascistas de esquerda e do outro fascistas de direita.

Fernando Leal da Costa, que foi governante no tempo da troica, é um fascista. E antes que venha por aí uma horda de comunistas abrir-me os braços e declarar, os olhos húmidos de emoção camaradesca, que vi finalmente a luz, declaro:

Fernando é tão fascista como os comunistas, mas mais perigoso do que estes, que estão acantonados na sua aldeia de cro-magnons, porque parece muito civilizado.

As autárquicas na minha terra - VII

Paulo Sousa, 26.09.21

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Quando a democracia era por cá uma absoluta novidade, terá sido diferente. Nesse tempo a política nacional entrava pelo quotidiano adentro de cada português, dominando os temas de conversas nos balcões dos cafés, nos locais de trabalho e nas refeições em família.

Com o passar dos anos, instalou-se a sensação de rotina que, sendo positiva por traduzir um costume enraizado, tem levado a uma indiferença que se manifesta também pela abstenção crescente. Podemos apontar como principal causa os equilíbrios estabelecidos pelos partidos que, como quem tranca as portas da casa, afastam os cidadãos daquela peça de teatro, de deixas previsíveis e enfadonhas, esvaziando e enfraquecendo assim as conquistas democráticas.

Apesar de isto se repetir em todos os actos eleitorais, as eleições autárquicas tem uma capacidade especial em desencadear um envolvimento popular intenso.

Qualquer partido que concorra aos diversos órgãos autárquicos e em todas as freguesias do concelho de Porto de Mós, necessita de angariar pelo menos 200 pessoas. Só para a Junta de Freguesia onde resido foram apresentadas cinco candidaturas e isso permite-nos aferir como é que, num meio mais ou menos rural como este, se torna quase impossível não ter pelo menos um familiar, um vizinho, um colega de escola, um amigo ou um ex-amigo, nos elencos das várias candidaturas, arrastando assim para dentro de cada campanha eleitoral velhas afinidades e conflitos.

Se a discussão do englobamentos dos rendimentos prediais no IRS, o apoio aos fornecedores da TAP ou o estatuto político administrativo dos Açores, podem ser assuntos estéreis de interesse para o cidadão comum, o mesmo não acontece quando estamos a falar num buraco à frente da porta, de uma mágoa antiga para com um fulano que está “a sujar” uma das listas, ou o modo como a mulher do Presidente a Junta respondeu a alguém na semana passada. Estes últimos, ao contrário dos primeiros, têm todo o potencial de definir o sentido de voto.

A tradicional forma de passar a mensagem do que se fez, ficou por fazer ou que se promete resolver, envolve um porta-à-porta a distribuir panfletos, acompanhado de carros decorados com as caras dos candidatos, bandeiras a esvoaçar e com alto-falantes a debitar o hino de campanha em contínuo, deixando atrás da sua passagem todos os cães a ladrar num alvoroço.

Mais recentemente, a troca de argumentos para angariar apoiantes chegou às redes sociais, e, como não podia deixar de ser, isso aumentou o nível do confronto entre as diferentes candidaturas e levou a que a agressividade subisse em flecha. Bem sabemos como se torna fácil teclar afirmações que nunca seriam ditas cara-a-cara e que, no momento seguinte, parecem legitimar uma reacção igualmente exagerada a estas, iniciando assim uma espiral quase imparável.

Demasiados dos envolvidos sentem-se tão estimulados pelas afirmações eventualmente falsas, incorrectas ou incompletas e pelos seus desmentidos, que entram a pés juntos contra tudo o que mexe, esquecendo-se que no dia após as eleições terão de continuar a cruzar-se uns com os outros. Esquecem-se também que uma parte muito significativa do eleitorado está alheada desta batalha em linha e que o consecutivo baixar de nível levará apenas a que alguns indecisos se sintam repugnados e mudem para o lado oposto.

Nestas últimas semanas vi um pouco de tudo isto, vi quem, mesmo debaixo de agressões rudes e sob pressão dos mais próximos, se tenha revelado pela elevação, assim como candidatos a cargos de responsabilidade a chafurdar nas poças mais malcheirosas das redes sociais e também a destruir material de campanha dos opositores, algo que dificilmente aconteceria numa eleição nacional.

Por mais que os media queiram noticiar este acto eleitoral, e a forma como se vivem as autárquicas em Portugal, tal é a diversidade de casos e são tantas as particularidades vividas em cada um dos 300 concelhos e mais de 3000 freguesias do país, que não têm forma de o fazer.

À excepção de bruscas viragens que possam acontecer nos grandes centros, não acho que faça muito sentido interpretar a soma dos resultados de cada uma destas pequenas bolhas, estanques e autónomas, e extrapolá-los para o todo nacional, como se de um aplauso ou uma vaia ao governo se tratasse. Mas enquanto as assembleias de voto não fecham e se espera pelo início da contagem, o tempo é de suspense. Esperemos, portanto.

As eleições nos Olivais, Lisboa

jpt, 26.09.21

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As eleições nos Olivais, Lisboa, lá vão decorrendo. À porta da escola, que é a minha assembleia de voto, dois voluntários (são remunerados mas voluntarizaram-se para esta tarefa cívica) indicam aos eleitores onde são as mesas de voto respectivas. Vestem t-shirts que lhes foram dadas pela Junta de Freguesia. As quais ostentam "Viver MAIS Olivais Junta de Freguesia" - uma evidentíssima alusão à coligação PS/LIVRE, a "Mais Lisboa". A uma funcionária escolar, simpaticíssima, pergunto-lhe se não haverá por ali o número da CNE para que possa eu protestar o assunto, esta descarada propaganda política feita pelos intervenientes do processo eleitoral no interior dos sítios de voto. Mas ela não tem (nem lhe cumpre ter, diga-se) essa informação. Telefono à polícia para perguntar o que fazer. Mas simpaticamente reenviam-me para uma central telefónica e a chamada depois cai. Desisto, venho para casa.
 
Uma vizinha, tão canhota como eu sou destro, avisa-me. Noutra escola da freguesia, com apenas duas mesas de voto, durante a manhã estava um dos candidatos cimeiros do PS/LIVRE, a tal "MAIS Lisboa" local, em afáveis cumprimentos aos eleitores e a indicar-lhes as mesas de voto.
 
Isto é o centro de Lisboa, 32 mil eleitores, 2021. Querem algo mais denotativo do abjecto caciquismo que aqui prevalece? Repito: centro de Lisboa, 2021.

Leituras

Pedro Correia, 26.09.21

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«O bom gosto não é uma qualidade inata, nem uma coisa que se possa aprender em qualquer idade, devendo por isso ser-nos imposto desde a infância.»

Gabriel García Márquez, Doze Contos Peregrinos (1992), p. 181

Ed. Publicações Dom Quixote, 1997. Tradução de Miguel Serras Pereira. Colecção Ficção Universal, n.º 118

Como dar xeque-mate ao lugar-comum

Pedro Correia, 26.09.21

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O lugar-comum é um dos maiores inimigos do jornalismo. Infelizmente, as campanhas eleitorais costumam ser férteis nisto: por estes dias, multiplicam-se os chavões semânticos, com valor jornalístico nulo. E que apenas revelam preguiça mental e um olhar desatento à realidade.

Uma dessas bengalas verbais de que se usa e abusa é “campanha morna”. Eufemismo para evitar dizer-se que quase ninguém acorreu ao encontro do candidato. Ou candidata, como a líder do PAN, que optou por visitar esquilos e cegonhas no Parque Biológico de Gaia. Mesmo sabendo que ali não recolhia votos.

As eleições são autárquicas, mas a cobertura televisiva é feita por jornalistas que andam atrás dos líderes nacionais dos partidos. Que aqui parecem protagonistas do filme errado.

 

A verdade é que muitas acções de campanha não teriam ninguém nas ruas sem a presença tentacular dos repórteres de imagem. De eleição para eleição, os planos vão ficando cada vez mais apertados, evidenciando que arruadas ou comícios pertencem ao passado. Em tempos, um ilustre pensador confessou ter o sonho de ver Portugal transformado na Suíça, onde o desinteresse pela política chega ao ponto de poucos ali saberem quem exerce a função presidencial – sinal inequívoco de que as coisas funcionam, sejam quem forem os protagonistas. Aos poucos, vamo-nos aproximando do cenário suíço. Infelizmente, apenas nisto.

Nenhum repórter que cubra uma campanha eleitoral precisa de dizer que anda morna. Basta exibir as imagens. Foi o que fez a RTP, limitando-se a alargar o plano numa acção promovida pelo PSD no Alto Minho: Rui Rio prometia comparecer mas nem isso parece ter atraído os militantes. Era possível contá-los pelos dedos.

Jornalismo? Claro. Com poucas ou nenhumas palavras. Em televisão, sobretudo, menos é mais.

 

Por vezes não basta mostrar: é preciso interpretar. A SIC soube fazê-lo seguindo António Costa em campanha eleitoral. O secretário-geral socialista deslocou-se a Celorico de Basto, terra adoptiva de Marcelo Rebelo de Sousa. «Temos, mesmo aqui, de entrar num novo ciclo de mudança», disse Costa. Parecia uma declaração banal, mas fazia toda a diferença por estar em território marcelista, onde o PS nunca ganhou. E de não haver memória de por ali ter passado um secretário-geral do partido da rosa.

Despique Belém-São Bento transferido para terras de Basto: eis um confronto nada morno em perspectiva.

 

A história interessante está sempre lá: basta ter olho para vislumbrá-la e arte para narrá-la. Além da indispensável vontade de pôr em prática tais virtudes. Por vezes detecto-a mais nos repórteres veteranos do que em alguns recém-chegados à profissão, que já exibem um ar muito enfastiado.

Um dos veteranos que fazem a diferença para melhor é José Manuel Mestre, da SIC. Acompanhando a caravana socialista, teve este apontamento de reportagem: «António Costa é uma espécie de primo rico que vem de Lisboa com os bolsos cheios.»

Tudo dito numa frase. Sem rodriguinhos nem eufemismos. Dando xeque-mate ao lugar-comum.

 

Texto publicado no semanário Novo

Pensamento da semana

João Pedro Pimenta, 26.09.21

Para supostamente defender as melhores causas já se cometeram as piores atrocidades. Em nome de Deus, da Justiça, da Igualdade, da Fraternidade e do Paraíso Terrestre muitas vidas humanas foram sacrificadas. Também a Liberdade já implicou muitas vítimas, recordando aquela frase, ao que parece datada dos tempos da 1ª República: quando ouço gritar "viva a liberdade" vou logo ver quem está a ser preso. A última boa causa é a não descriminação em função da raça, género, sexo, credo, etc. Para já não tem implicado muitas vidas humanas, mas já levou à queima de livros, que, como o passado indica, leva muitas vezes a que as fogueiras sejam destinadas a pessoas. Esperemos que se fiquem por aqui e que não contribuam para a pesada história dos crimes em defesa das boas causa e da sua pureza.

 

Este pensamento acompanhou o DELITO durante toda a semana.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 26.09.21

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Ana Lima: «Elas não podem mostrar o rosto em público.  Elas não podem conduzir sozinhas. Elas não podem falar directamente com o seu professor. Elas não podem viajar sozinhas para o estrangeiro. Elas não podem ir ao médico por sua livre vontade.  Elas não podem entrar e sair pelas mesmas portas que os homens nos locais públicos. Elas não são contratadas pela maior parte das empresas. Elas não podem falar em direitos sem que sejam castigadas.»

 

João Carvalho: «Passei pela televisão e fiquei a saber que hoje se celebra (?) o Dia Mundial da Saúde Ambiental. O que será isto? Um apelo para irmos respirar em bom ambiente? Um desafio para nos afastarmos e deixarmos o ambiente respirar sozinho? Uma data para estudarmos o impacto da nossa saúde no ambiente ou do nosso ambiente na saúde do vizinho? Só hoje ou todos os dias?»

 

José António Abreu: «Ingenuidade excessiva é estupidez e eu tenho dificuldade em sentir empatia por esta pessoa. Especialmente quando sei que tratou do assunto com um entusiasmo raiando a insensibilidade. Acreditando genuinamente estar a fazer o melhor para a empresa. Talvez estivesse. Tal como quem a despediu.»

 

José Gomes André: «A independência da Madeira constituiria um golpe histórico na unidade nacional, que, para o bem e para o mal, conheceu justamente com a descoberta das Ilhas um momento capital para a sua existência e definição.»

 

Luís Menezes Leitão: «Custa-me assistir ao descalabro da União Europeia a benefício do seu maior Estado-Membro, a Alemanha. Há quem se resigne a isto, e diga que a nova Alemanha tem que mandar na Europa. Mas a Europa deve lembrar-se que não é à Alemanha que deve o seu nome. É à Grécia.»

 

Patrícia Reis: «Há quem tenha orgasmos intelectuais por ir à televisão. Não é o meu caso. Mas vou: para promover o livro, para aceder a um pedido simpático, sempre com a ideia de que as pessoas gostam de colocar um rosto num nome e, afinal, ao fim de tanto livro talvez tenha de deixar de ser menos recatada.»

 

Rui Rocha: «Por estes dias, chama-se Madeira e, não sendo na Bahia, fica ali no Oceano Atlântico. O protagonista principal da nossa novela é Alberto João Jardim. Para continuar com a torneira do orçamento aberta, ameaça-nos com a independência. Mas, não é sangue independentista que lhe mancha o fato de carnaval. É apenas ketchup. Comprado com os nossos impostos.»

 

Teresa Ribeiro: «O maior evento sobre sustentabilidade do país - não é propaganda, é mesmo verdade - começa já na quarta-feira, dia 28, no Centro de Congressos do Estoril. Questões do ambiente, justiça social e desenvolvimento económico sustentável são os tópicos para um grande programa, composto por conferências, workshops, actividades lúdicas e desportivas.»

Blogue da semana

Marta Spínola, 25.09.21

Este blogue da semana devia cá ter chegado mais cedo, mas só agora me pude sentar para cá o deixar. Avancemos então.

Descobri o "Casada, fútil, quotidiana e tributável" há umas semanas, e gostei logo do tom de voz. Sempre apreciei a observação do quotidiano e a crítica dos costumes ainda faz as minhas delícias. A Amélia C. escreve bem, observa e retrata o quotidiano. A imprescindível dose de sarcasmo anda por lá, de mãos dadas com a franqueza que faz tantos dos nossos dias. 

É este o blogue que sugiro esta semana.

Os apoios eleitorais fortuitos

jpt, 25.09.21

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Todos, e mesmo se militantes de um partido, somos livres de apoiar as candidaturas políticas que entendemos. E se essa liberdade deve ser defendida em geral, mais ainda é pertinente - no caso dos militantes - aquando das eleições autárquicas, onde mais abrangentes e até sistémicas concepções da sociedade não estão (tanto) em jogo. Ainda assim espera-se (não se obriga, espera-se...) alguma contenção nessas deambulações naqueles que optaram por ter uma carreira política activa e que usufruem desse estatuto. 

É disso muito elucidativa esta imagem do encontro de anteontem entre José Pacheco Pereira e Fernando Medina, numa acção de campanha deste último. Alguém dirá que foi "fortuito" mas é óbvio que não se trata de um acaso que tenha surpreendido o comentador político. O homem está no seu direito de ter estas demonstrações públicas. E o seu apreço por esta "esquerda" é consabido - alguns esquecem o encontro na Aula Magna em 2013, uma espécie de réplica dos "Estados Gerais" de Guterres, no qual se congregaram o centro-esquerda, a esquerda e as esquerdas comunistas. Durante o qual Pacheco Pereira surgiu saudando "amigos, companheiros e camaradas", aventando o que veio a ser conhecido como "geringonça", da qual assim se poderá reclamar se não ideólogo pelo menos profeta. Algo que se lhe impunha - como ficou patente ao invocar, em registo de analogia, o Manuel Alegre da Rádio "Voz da Liberdade" na Argélia - como uma luta contra um verdadeiro fascismo que assombra(ria) o país, mesmo se dito mera "direita radical". 

 

 

Leituras

Pedro Correia, 25.09.21

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«Um homem que representa um papel, não para outros, mas sozinho, expõe-se a perigos psicológicos evidentes.»

John Le Carré, O Espião Que Saiu do Frio (1963), p. 134

Ed. Minerva, 1973. Tradução de Adelino dos Santos Rodrigues. Colecção Minerva de Bolso, n.º 14

O meu voto amanhã

jpt, 25.09.21

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Esta cena do Estado nos tratar como criancinhas estúpidas, proibindo que falemos publicamente de política na véspera das eleições, tem que acabar. Mesmo.
 
Para quem se possa interessar: amanhã, domingo, para a CML votarei na lista encabeçada por Carlos Moedas. Faço-o resmungando. Pois votar num tipo que trata Medina pelo primeiro nome dá-me uma enorme azia - pois a proximidade a Medina só descredibiliza, polui. E, também, porque não tenho paciência para estes gajos que me tratam por "tu". Nem andámos juntos na escola nem fizemos a tropa ao mesmo tempo. Para falar comigo que usem a terceira pessoa, porra. No singular, com apelido. No plural, respeitando quem os elege. Alguém que diga isso a Moedas, se voltar a ir a votos. E aos outros patetas que montaram a campanha (que assim começou, dizem-me, por mero e preguiçoso decalque de similar expressão numa velha campanha espanhola).
 
Para a minha Junta de Freguesia dos Olivais - onde manda uma inenarrável presidente socialista, que será secundada por Vanda Stuart e Ágata? Que se lixe, votarei no PCP.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 25.09.21

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Ana Cláudia Vicente«Em chegando o fresco, divisa-se ampla oportunidade para preenchimento (ou deflexão da atenção) do que os mais ortodoxos designam por lacuna gravatal: há espaço para toda a sorte de lenços, cachecóis, coletes, casacos, camisolas, etc. Esta é, seguramente, em termos de estilo, das estações em que os homens têm mais margem de expressão. Mais uma razão para o Outono ser das minhas alturas favoritas do ano.»

 

Ana Vidal: «Quase a chegar às livrarias o meu livro "A poesia é para comer" (hei-de falar dele aqui um dia destes, com mais calma), ando especialmente sensível a um tema que desde sempre me apaixonou: a gastronomia. Por isso escolhi para destaque da semana o novo blogue da jornalista Alexandra Prado Coelho, para vosso - e meu - deleite. Há de tudo um pouco, desde dicas preciosas sobre eventos culinários a bons artigos, algumas (poucas) receitas e muitas notícias interessantes para quem se interessa pela boa mesa.»

 

José António Abreu: «Começa a ser difícil encontrar livros publicados recentemente em que não tenha sido usada a grafia do novo (enfim, novo...) acordo ortográficoCusta-me particularmente que algumas das minhas editoras favoritas o tenham por fim adoptado. Apesar de saber que o fizeram, verifico os livros que publicam como se fosse crível terem entretanto mudado de ideias. Por vezes folheio o mesmo livro em diferentes livrarias, na esperança irracional de me ter enganado antes ou de alguns exemplares – e bastar-me-ia um – terem conseguido escapar às novas regras (mas os livros são afinal muito conformistas). Ou talvez o faça não por ter esperança mas exactamente pelo contrário – para vencer a descrença e confirmar a separação, esta nova e surpreendente incompatibilidade que se estabeleceu entre mim e os livros.»

 

Teresa Ribeiro: «Faz-se campanha na televisão do grupo, põe-se o público a salivar - de facto, aquela colecção de filmes do Clint Eastwood a preço de saldo é uma tentação - e depois nas bancas nem vê-los. Shame on you, Mr. Balsas. Sei que está a precisar desesperadamente de incrementar os seus negócios, mas isto não se faz.»

Semana de reflexão

João Sousa, 24.09.21

Há coisa de duas semanas, uma empresa de "investigação e estudos de mercado" (a Pitagórica) veio aqui ao bairro fazer uma sondagem sobre as autárquicas: se eu ia votar, se não ia votar, em votando se iria manter o sentido de voto, se eu pensava que o partido vencedor seria o mesmo ou um diferente, coisas do género. Isto pode não significar nada, mas a verdade é esta: nunca, desde que eu moro aqui, alguma empresa de sondagens alguma vez mostrou interesse em qualquer um dos meus votos. Sondagens sobre os meus hábitos de leitura, o meu consumo televisivo, a minha vida sexual, isso é mato: raro é o trimestre durante o qual não recebo o telefonema da praxe. Mas questões relacionadas com política - nunca.

Durante esta semana, o bairro foi regularmente sujeito aos raides de uma viatura de propaganda do PS. Na quarta-feira, a traquitana chegou mesmo a estacionar durante meia-hora aqui no cruzamento central, infernizando-nos o almoço com o altifalante. Além disso, no dia anterior, alguém encheu-me a caixa de correio com um jornal de campanha do PS: 24 páginas (que seguiram imediatamente para o Ecoponto) de conversa fiada que superavam, na quantidade, o próprio Boletim Municipal.

Este bairro não passa de quatro ruas, nenhuma delas com mais de trezentos metros, que se cruzam duas a duas numa espécie de jogo do galo. Raro é o prédio que tenha mais de três andares. É estranho tal investimento propagandístico do PS aqui. Aliás, a campanha do PS em todo o concelho tem sido bastante sobredimensionada, exibindo em largos cartazes o apoio de figuras mais ou menos públicas como um cozinheiro assíduo das televisões.

E o PS, por acaso ou talvez não, é cliente da Pitagórica.

O PS pode até admitir, como dizem nos jornais, perder 10 a 15 autarquias nestas eleições - mas estou convencido de que o PS tem genuínas esperanças de ganhar a Câmara do Seixal à CDU.

Não é incomum, quando digo a alguém que moro no Seixal, esse alguém fazer uma piada como "Eh pá, tu moras na terra vermelha". É uma certa ideia feita, esta, a de que o Seixal é um antro de comunistas. Acontece que não é, de todo, verdade. A autarquia, sim, tem sido comunista desde (talvez) sempre. Mas é-o em largo contraste com as eleições nacionais onde, desde pelo menos 2009 (não recuei mais, por falta de tempo, nas minhas investigações), o concelho é uma espécie de socialistão:

2009
PS: 34,82%
CDU: 19,17%

2011
PS: 28,72%
PSD: 24,87%
CDU: 18,86%

2015
PS: 34,09%
PSD: 23,14%
CDU: 17,85%

2019
PS: 38,80%
CDU: 15,13%

Nas autárquicas, apesar da manutenção do PCP no poder, é notório um contínuo encurtar da distância do PS:

2005
CDU: 44,74% (24.293 votos)
PS: 23,85% (12.950 votos)

2009
CDU: 47,85% (27.949 votos)
PS: 22,41% (13.090 votos)

2013
CDU: 43.42% (22.658 votos)
PS: 23,78% (12.409 votos)

2017
CDU: 36,87% (21.901 votos)
PS: 29,60% (17.582 votos)

O PS deve estar a sentir o cheiro de sangue na água. Acredito haver o sério risco de uma "vitória surpresa" do PS no Seixal que até serviria para atenuar o impacto mediático de algumas derrotas noutros locais. As mudanças demográficas aqui do concelho não estão, de todo, a ajudar a CDU - mas isto será (talvez) assunto para uma outra ocasião.