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Delito de Opinião

Já li o livro e vi o filme (285)

Pedro Correia, 30.06.21

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     VESTIDA PARA MATAR (1980)

Autores: Brian de Palma e Campbell Black

Realizador: Brian de Palma (1980)

Aqui o que interessa é a película - que à época escandalizou muitas almas conservadoras e hoje é rotulada de misógina e transfóbica. Na estreia não faltou quem, com manifesto exagero, a enaltecesse como «o primeiro grande filme americano dos anos 80». A novela decorre do guião, aproveitando o êxito de bilheteira. É para ver, não para ler.

O mistério da morte na auto-estrada

Pedro Correia, 30.06.21

Já decorreram doze dias. A 18 de Junho, a viatura oficial que transportava o ministro da Administração Interna, ao quilómetro 77 do trajecto Estremoz-Lisboa, atropelou mortalmente um trabalhador que efectuava obras de limpeza em bermas e valetas da A6 - uma das auto-estradas menos acidentadas, com maior visibilidade e menos movimentadas do País.

Até hoje, não se ouviu uma palavra do ministro. Um comunicado do Ministério deu a entender que a culpa do ocorrido foi do infeliz trabalhador, chamado Nuno Santos, que terá atravessado imprevistamente a faixa de rodagem - acusado, portanto, de pouco menos que negligência no desastre que lhe causou a morte. Foi igualmente referido que não existia qualquer sinalização de alerta aos condutores para a existência de trabalhos no local.

Acontece que o homem - com 43 anos e pai de duas filhas - tinha larga experiência nestes trabalhos para uma empresa subcontratada da Brisa, concessionária da auto-estrada. Acontece que a Brisa já desmentiu o Ministério, assegurando que a obra estava devidamente sinalizada. Acontece que o Governo não teve a decência de enviar um representante ao funeral de Nuno Santos. Acontece que a viúva alega não ter meios de subsistência e a imputação com chancela oficial de que o marido terá sido negligente poderá reduzir ou até anular o montante do seguro

Acontece, enfim, que continuamos sem saber a que velocidade seguia a viatura ministerial. Doze dias depois.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 30.06.21

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João Carvalho: «Quando se passa meia vida no PSD e um dia se quer bater o pé, o melhor é pedir primeiro explicações ao Pacheco Pereira, que tem grande estaleca a trabalhar com os pés. Sim, que andar a oferecer bombons ao adversário é uma ideia de que o Pacheco Pereira nunca se lembraria. Bate-se o pé, rompe-se uma sola, mas mais nada além disso. Menos ainda ensaiar aproximações ao adversário, que é atitude própria de um valentíssimo saloio. Qualquer mimo oferecido ao adversário há-de sair caro e acabar mal. Tão caro e tão mal que depois é melhor nem ver o resultado

 

José António Abreu: «O Mónaco é patético a diversos níveis. É desde logo, com duas ou três excepções (o «Rochedo» e a praça do Casino e do Hotel de Paris, por exemplo), feio. É, depois, um sítio de ostentação muito para lá da fronteira do ridículo. E, lamento, não são as pessoas que têm muito dinheiro as mais ridículas.»

 

José Maria Gui Pimentel: «O BE é, desde o início, um partido de protesto, mais do que o PCP e, contrariamente a este, com um eleitorado muito volátil. Os seus eleitores foram mal habituados desde o início – numa estratégia numa primeira fase muito proveitosa – a ouvir apenas críticas ao sistema, as quais, como se sabe, juntam. Das propostas e tomadas de posições, que, como se sabe, cindem, pouco se ouviu ao longo da primeira longa frase da vida do BE.»

 

Leonor Barros: «Soubesse eu de tão preciosos conselhos e teria prescindido do Moët & Chandon no dia do meu aniversário há cerca de duas semanas, já para não falar da água Vittel, Vichy ou Voss com que costumo mandar a empregada dar banho às quatro gatas cá de casa. O meu problema está mesmo na depilação, já que a proposta é que em cada cinco visitas à esteticista ou lá como lhe chamam nesses sítios da moda se reduza uma.»

 

Rui Rocha: «Com o imposto extraordinário de 50% hoje anunciado por Passos Coelho, poderíamos ser levados a dizer que o copo do subsídio de natal fica meio-cheio ou meio-vazio. O problema é que já não temos copo.»

 

Sérgio de Almeida Correia: «Gonçalo M. Tavares venceu mais um prémio. Os prémios, um prémio, têm o valor que lhes queiramos atribuir. Significam a projecção sem a qual muitos não chegarão à obra. Mas é a entrevista, em especial aquela em que o autor partilha com o leitor a voz, o tom, os tiques, as pausas, as inflexões do discurso, por vezes o ritmo da respiração, que torna a obra mais próxima.»

 

Eu: «Quem disse que não devemos voltar a locais onde já fomos felizes? Uma década depois, regresso a Cabanas e sinto-me como se nunca tivesse trocado este magnífico cenário de férias por nenhum outro.»

Atrás de mim virá*

José Meireles Graça, 29.06.21

O Amigo é moderno, tem fortes sentimentos pró-internéticos, lê jornais online, opina nas redes, surfa nas ondas da informação consultando artigos, seguindo links? Ora bem, então já milhares de vezes disse “sim”, ou mais provavelmente “yes”, ao aviso de que aquele sítio que quer visitar utiliza cookies e se preocupa com a sua segurança. Cookies não sabe bem o que sejam, nem quer saber, e faz muito bem; e ao extenso palavreado em que o dono do sítio avisa para isto e aquilo sempre se poupou – senão, em vez de ter acesso ao que quer ler, perdia tempo com vacuidades. E, para proteger a sua reserva de não sei quê, não lia nada, o que aliás nove vezes em cada dez é efectivamente o recomendável, mas a gente não sabe adiantadamente.

A burocracia é assim: ao serviço de grandes princípios, impondo obrigações a quem produz seja o que for, estabelecendo procedimentos crescentemente minuciosos, e esgotando-se no cultivo da sua própria existência, cujo fim já ninguém lembra, a começar pelos burocratas.

De longe em longe, descobre-se com espanto que a estrutura pública criada para proteger ou alcançar um bem ou não serve para nada ou é deletéria; e reclama-se o rolar de cabeças, procurando com ardor um peito onde pendurar a medalha da execração pública.

Este o caso Navalny. Não houve magistrado da opinião que não viesse crucificar Medina (vejamos, por todos, o senador António Barreto), por se ter descoberto esta coisa extraordinária: o exercício do direito de manifestação, que a Constituição consagra, está assegurado, mas a Câmara Municipal de Lisboa certifica-se de que a vida de quem tiver interesse, e poder, em castigar os promotores das manifestações, fique facilitada. Incluindo autoridades estrangeiras, sem discriminação de regimes (facto ao qual, sem razão, a comunicação social atribui grande importância, como se o problema fosse a destrinça entre regimes “bons” e “maus” e não a subserviência a poderes alienígenas).

Ou seja, os opinantes (com a excepção, felizmente anódina, deste Vosso criado) consagram o princípio da responsabilidade objectiva: Medina, se não sabia, devia saber; e a respeitabilidade do órgão, no caso a Câmara, fica restaurada se o seu representante máximo cair abaixo do cavalo. O que, incidentalmente, dá jeito a quem lhe cobice o lugar e fornece uma excelente arma de arremesso político: estão a ver, estão a ver o que sucede quando são estas nódoas a liderar?

O saudoso Jorge Coelho (saudoso para mim, que lhe apreciava a manha, a variante idiossincrática do português em que se exprimia, e a evidência viva e transparente da condição de socialista exemplar, responsável pela inevitabilidade do nosso atraso relativo) é erigido como exemplo a seguir, por se ter demitido porque uma ponte caiu. Exemplo aliás não inédito, já muito antes dele se havia demitido o igualmente ministro Walter Rosa, por um motivo em que a culpa própria era ainda mais ténue. Mas acaso a demissão contribuiu, mesmo que remotamente, para mudanças de procedimentos que, com eles, não teriam sido possíveis?

Que fique claro: Fernando Medina não é presidente da Câmara no mesmo sentido em que o são os de Santo Tirso ou Freixo de Espada à Cinta. Não o é ele, como não eram António Costa ou Jorge Sampaio, duas fortíssimas personalidades de exaltante destino que deixaram na Câmara a memória da sua perfeita inutilidade.

O lugar é encarado como um estágio para voos mais altos, o que lisonjeia a vaidade do eleitor local, que imagina viver numa região que o resto do país deve gratificar com impostos, desvelo e respeito; o quadro pletórico de funcionários, ao qual há que somar os da floresta de empresas municipais, não tem nenhuma relação com as necessidades do município, e toda a ver com clientelas partidárias e tráficos de influências sortidos; e é provável que Medina tenha algumas ideias sobre urbanismo, espaços verdes, habitação, estacionamento, circulação automóvel, licenciamento da construção, segurança, esgotos e o mais de que se deve ocupar uma Câmara, mas seguro que invariavelmente naquela cabeça ovoide convivem apenas as banalidades da moda da gestão autárquica moderninha com os interesses do partido, do seu futuro político, e da sua imagem pública como comentador residente nas tevês, onde se alivia da vulgata socialista e europeísta para a gestão da coisa pública e os problemas da contemporaneidade.

Mas a patente mediocridade da personagem (cuja demonstração não cabe aqui, e seria aliás inútil – quem sobre a matéria tem dúvidas não a aceitaria, por ter a cabeça cheia dos mesmos disparates que afligem a figura) não é o que explica a inacreditável comunicação às embaixadas do nome dos inimigos dos regimes respectivos: nenhum presidente de Câmara pode estar ao corrente do que se passa em serviços elefantíacos, a menos que tenha a preocupação deliberada de fiscalizar desempenhos, fazer análises de custo/benefício, contemplar reduções, promover eficiências, cercear competências, rever atribuições, encerrar “serviços”. Em suma, arranjar inimigos: todas as carreiras políticas bem-sucedidas o são, há mais de quarenta anos, para quem expande o Estado, promove clientelas ou ao menos as mantém, e acrescenta o seu tijolo ao edifício do intervencionismo. Nas falências (vamos em três) há um contrariado inverter ou estancar do processo; e, passada a tormenta, volta-se ao mesmo, isto é, o PS volta ao mesmo, que lhe está na natureza e no instinto de sobrevivência. Os responsáveis sabem bem que o eleitor médio acha que o Estado são os outros, de modo que exigir mais e mais está na ordem natural das coisas, como está prometer mais e mais e, claro, cumprir uma parte do prometido.

Um pormenor que passou despercebido foi que a situação ficou ainda pior a partir da entrada em vigor de uma lei qualquer sobre protecção de dados, que foi interpretada ou aplicada assim e deveria ter sido assado. E como existe uma Comissão Nacional de Protecção de Dados fui ver para que serve e vim rendido. Quão útil e necessária, meu Deus; e um pouco cara também – à volta de um milhão e oitocentos mil euros por ano. Tem sete elementos, cinco Unidades de qualquer coisa e um número de funcionários que não pude apurar. É de prever que daqui a uns anos, de unidades, exista pelo menos uma dúzia, o orçamento se dê ao respeito tendo sido multiplicado por três, e haja uma adequada quantidade de vice-presidentes, dado que aparentemente a actual se encontra numa situação de solidão pouco compatível com a dignidade do lugar. Até porque a própria Câmara, ao que diz um jornal, tem adstritos a estas importantes funções 213 funcionários, e mal se entende que o organismo de cúpula não tenha pelo menos dez vezes mais.

Pergunta-se:

Medina merece ser torrado pela Oposição, a na câmara e a no país?

Medina deve demitir-se?

A demissão do funcionário que superintendia na trapalhada justifica-se?

Este atentado ao Estado de Direito terá consequências?

E responde-se, pela mesma ordem:

Merece: a comunicação dos nomes e endereços de manifestantes aos titulares dos interesses que as manifestações ofendem é um claro escarro na Constituição; e o papel das oposições não é, ao contrário do que acredita o indescritível Rio, fazer espargatas de raciocínio para diluir responsabilidades, é combater de faca nos dentes as falhas de quem está, tenha ou não culpa. Moedas, quando acusa Medina de ser “cúmplice” de Putin pode, retoricamente, exagerar, mas tem razão no sentido de que, objectivamente, é essa a consequência das informações. As restantes oposições só pecam por se concentrarem no pobre Medina (que, coitado, não tem arcaboiço para que mereça se lhe discutam as ideias) como se, removido o espécime, alguma coisa de substancial mudasse. Mas não: o incidente poderia perfeitamente ter tido lugar com Costa ou Sampaio, ainda que estes dois beneficiassem do entusiástico apoio da comunicação social, que sempre os passeou num andor.

Do ponto de vista do interesse público, a demissão não tem utilidade: virá outra nulidade das coudelarias do PS para o substituir; introduz-se um elemento de imprevisibilidade nas carreiras políticas, que ficam a depender de acasos desafortunados; talvez Medina perdesse pontos na guerra surda dentro do PS por lugares, sem que porém os seus concorrentes sejam presuntivamente melhores, e ainda com o benefício da vitimização para o próprio, que já tem de seu natural assinaláveis competências como choramingão; e reforça-se a inimputabilidade das burocracias.

O funcionário demitido não pode razoavelmente dizer que ignorava o processo. E como, que se saiba, não alertou os seus superiores para a prática de uma clamorosa ilegalidade (pelo contrário: Medina alega ignorância e eu acredito), resta que a porta da rua é a serventia que lhe convém. Até para sinalizar a todos os funcionários que, para a prática de ilegalidades, são necessárias ordens expressas e, se elas existirem, denúncias.

O Estado de Direito interessa muito a quem tenha ideias consistentes sobre a vida em comunidade, o progresso, o país, e a importância das liberdades que importa proteger e que são sobretudo as que defendem o indivíduo desalinhado ou vítima de abusos, em particular por parte do Estado. Ou seja, interessa a uma minoria: a maioria quer saber do ordenado, da pensão de reforma, da progressão na carreira e da igualdade, entendida como o combate aos ricos, que, se desaparecessem de vez, permitiriam que se acabasse com os pobres, os quais não há maneira de desaparecerem, e nos transformariam em remediados, que nos dias de boa disposição alguns de nós já acham que somos.

Este caso só ganhou relevo porque o exercício do direito de manifestação (que absolutamente respeito) é sobretudo coisa de moços com acne (isto é, bloquistas), empresários de causas, comunistas e soldados de bandeiras. E, do lado direito do espectro, porque o cadeirão de Medina dava jeito, nem que fosse só pelo valor simbólico de expulsar um dos corifeus patéticos da Situação.  O resto da opinião pública está muito mais interessada na Selecção, como Marcelo bem sabe. Donde, não senhor, de consequências zero.

 

* Publicado aqui

 

Já abriu a época da caça ao voto

Pedro Correia, 29.06.21

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É oficial: abriu a época da caça ao voto. O que não admira: faltam apenas três meses para as eleições autárquicas. A partir de agora vai valer tudo.

Espelho do mundo, espelho da vida, espelho do melhor e do pior da política, a televisão antecipa desde já o que nos espera nestas 12 cruciais semanas que antecedem o escrutínio. Ainda mais cruciais por ocorrerem num momento em que, segundo uma sondagem há dias revelada, o partido do Governo sofre o mais sério abalo nas pesquisas de opinião desde Março de 2020.

Há que contrariar esta tendência, terá pensado o estado-maior socialista. E se assim pensou melhor o fez. Cada pretexto pode gerar notícia. E cada notícia funciona como chamariz ao exercício do voto nos mais diversos concelhos. Não esqueçamos que estas são umas eleições muito especiais: estão em jogo 308 presidências de câmaras municipais e 3091 presidências de juntas de freguesia no continente e nas regiões autónomas. Ninguém tenha ilusões: a soma de todas estas parcelas condicionará o próximo ciclo político a nível nacional.

Neste contexto, está especialmente em foco o ministro da Educação. É pelo menos a segunda vez, em poucos dias, que surge acompanhado de autarcas socialistas para lhes dar alento.

A 7 de Junho, deslocou-se a Vila Nova de Gaia – fazendo-se filmar ao lado do presidente da Câmara local, o socialista Eduardo Vítor Rodrigues, recandidato a um terceiro e último mandato. Visitou ali três escolas que “fazem parte dos 500 estabelecimentos de ensino que estão a remover o amianto” a nível nacional. “Vamos fazer uma reabilitação de eficiência energética”, declarou o autarca, aproveitando aquele tempo de antena nos telediários à boleia de Tiago Brandão Rodrigues. O ministro esteve à altura das circunstâncias: Gaia, sublinhou, é um município “que mostra que é possível fazer a diferença”.

A 19 de Junho, Brandão Rodrigues voltou ao Norte, desta vez para promover o concelho de Paredes de Coura. Elogiando a Escola Profissional do Alto Minho Interior, ali inaugurada em 1993. “O ensino profissional tem sido uma aposta muito forte do nosso país e esta escola tem sido um exemplo”, elogiou o membro do Governo – ao lado do presidente da Câmara local, o socialista Vitor Paulo Pereira, recandidato a um terceiro e último mandato.

Não havia pressa. Portanto, sobrou tempo para o autarca sublinhar que esta escola “está ligada ao mundo do trabalho”, enquanto o ministro mostrava satisfação por Paredes de Coura acolher em breve a fábrica de vacinas da Zendal. É investimento privado, de um grupo farmacêutico espanhol, mas o espectador menos sagaz pode supor que é obra do Governo. Com as televisões a registar. “Vai criar mais de 30 postos de trabalho”, garantia uma delas. Focando o ministro e o presidente da câmara, ambos com ar de orgulho. Dava para perceber, mesmo com máscaras.

Quem não fizesse a menor ideia de que vivemos já em período pré-eleitoral, ficava esclarecido. Em Portugal há coisas que nunca mudam.

 

Texto publicado no semanário Novo

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 29.06.21

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Ana Lima: «Numa altura em que o actual presidente e um ex-presidente comentaram a situação da Grécia recorda-se, sem qualquer intenção de concordância ou discordância, o que dizia Eça de Queiroz em 1872.»

 

João Campos: «Convencionou-se de tal maneira a "ponte" que liga os feriados mais convenientes ao fim-de-semana que, pelos vistos, ideias destas não fazem confusão a ninguém. Enfim, é uma medida para inglês ver - ou melhor, para alemão ver (alguém actualize o ditado, se faz favor). De uma penada, faz-se de conta que quando os feriados calham à terça ou à quinta o Governo é "obrigado" a dar a ponte de segunda ou de sexta, e coloca-se de lado a lógica subjacente ao próprio conceito de feriado. O que não deixa de ser interessante: por um lado, e com esta medida em prática, o Natal passa de facto a ser quando o Homem quiser (desde que queira entre 23 e 27 de Dezembro); por outro, vai ser divertido ver o velho slogan "25 de Abril, sempre!" quando o feriado for encostado a 24 ou a 26.»

 

José António Abreu: «Ou então, Adolfo, os livros podiam referir logo no início as condições ideais para serem lidos. Como Parece Mesmo o Paraíso, de John Cheever, que folheei numa livraria mas devolvi à estante após ler a primeira frase: «Esta é uma história para se ler na cama, numa casa velha, numa noite de chuva.»

 

José Maria Gui Pimentel: «Nada na programação da RTP 1 justifica que o canal continue a ser financiado pelos contribuintes (ao contrário do que sucede com a RTP 2).»

 

Rui Rocha: «José Blanco é o ministro Espanhol do Fomento. Para simplificar, pode dizer-se que é o irresponsável local pelas obras públicas faraónicas e pelas parcerias impúdico-privadas de nuestros hermanos. Mal comparado, um maluquinho dos comboios como o nosso Mendonça. Ao que parece, ficou muito incomodado com a suspensão do TGV. Pelo visto, o ministro Blanco também estava entusiasmado com a possibilidade de utilizar o TGV para ir a banhos na Caparica. É claro que talvez não fosse pior que o ministro Blanco se entretivesse com questões como o número de passageiros de alguns troços do TGV em Espanha.»

 

Eu: «Faz-nos falta mais gente sábia a escrever em jornais, gente que consiga ultrapassar a espuma dos dias. Gente como Victor Cunha Rego, que partiu demasiado cedo e deixou um lugar insubstituível.

Portugal/Bélgica

José Meireles Graça, 28.06.21

O meu amigo de andanças feicebuquianas Pedro Brinca é professor de economia em Lisboa, ao que sei respeitado pelos pares e estimado pelos alunos, não sendo portanto provável que entenda grande coisa do assunto. Mas de futebol, reconheço contrariado, sabe. Isto é um problema porque a analisar os jogos não é menos sofisticado do que seria se estivesse a falar dos de xadrez, e outro tanto fazem os melhores comentadores, ainda que em geral sejam mais proficientes em geometria e matemática do que em gramática. Ora eu sou do tempo em que, para falar do jogo, os analistas, que nele viam o que toda a gente via, adoptavam um palavreado intensamente lírico, às vezes pitoresco e ainda mais frequentemente asneirento: as equipas distinguiam-se pelo pundonor e o jogador xis pelo arreganho, enquanto tal ponta-de-lança chutava com o pé que tinha mais à mão.

O melhor futebol era o brasileiro, e quem viu Tostão, Gérson, Rivellino, Pelé e inúmeros outros sabe do que estou a falar.

Depois vieram os engenheiros da bola, que descobriram que fintar um defesa é um risco e uma perda de tempo, até porque onde dantes havia um agora há dois, e se a coisa demorar três, de modo que o melhor é passar ao camarada que está mais bem colocado, porque toda a gente que está no campo corre que se mata, a ganhar posições quem ataca e a anulá-las quem defende.

De modo que há pelo menos dois jogos, um com bola e outro sem, e as capacidades atléticas, mais a precisão do passe, é que passaram a fazer a diferença, com o ocasional tipo de génio lá à frente, que porém não consegue marcar se a bola não lhe chegar ou, chegando, tiver uma chusma em cima dele.

Isto seria o menos. Mas como pela mesma maré também ficou assente que não sofrer golos é mais importante do que marcá-los, o jogo transformou-se num cansativo exercício de paciência em que duas equipas, em particular se tiverem níveis semelhantes de competência, ficam o tempo todo a “rodar a bola” (expressão consagrada pelos cognoscenti, catálogos ambulantes e infelizmente falantes de lugares-comuns), tolhidos de medo e à espera de um deslize.

O jogo Portugal/Bélgica foi assim: chato. Um belga foi feliz e, de meia-distância e porque nenhum defesa o atrapalhou, marcou; e um médio português, no caso Rafael Guerreiro, rematou, com grande galo, ao poste (para não falar de dois balões que não foram à baliza, de outros, o esférico moderno sobe muito), uma bola que seria indefensável.

Ou seja: perdemos e as análises são umas; e seriam outras se tivéssemos empatado e, talvez, ganho no prolongamento, onde o cansaço facilita as distracções – a enconar ganhamos improvavelmente o último campeonato, e este, pelo mesmo processo, também estava ao nosso alcance.

Eu, que sou intelectual de grandes cogitações e tendo a detestar todos os clubes com excepção do FC do Porto, portanto pessoa de elevação e distanciamento, há muito entendo que quem está enfarinhado nestas coisas não está a ver bem a questão.

A questão é esta: os jogadores são mais altos, mais atléticos, mais calculistas; os treinadores estudam os adversários cuidadosamente, de modo a anular-lhes as vantagens; e toda a gente, antes de jogar para ganhar, joga para não perder.

O calculismo vai a ponto de as faltas poderem ser “cirúrgicas”, porque a penalidade é menos gravosa do que o risco de uma jogada prosseguir, e, nos casos relativamente mais sérios, que dão origem a cartões amarelos, pode ela beneficiar não a equipa ofendida mas uma terceira que nem ali está, escândalo com o qual os adeptos convivem alegremente.

Lembremo-nos apenas de um exemplo: as medidas da baliza são as mesmas de sempre. Porém, os guarda-redes dos primórdios eram muito mais baixos (o assunto está particularmente bem documentado por causa das incorporações militares, onde sempre a altura dos mancebos foi medida), pelo que os contemporâneos levam vantagem.

Alterar regras? Nem pensar, dizem os amantes de futebol. O que de certo modo é reconfortante: comunas, bloquistas, socialistas, progressistas sortidos, rezam nesta matéria todos pela mesma cartilha, que é a conservadora.

Pena seja só no futebol.

Acabaram-se as contas

Sérgio de Almeida Correia, 28.06.21

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(foto daqui)

 

A fase de qualificação não fora brilhante.  Uns dias melhor, outros pior. Os altos e baixos foram sendo transportados de uns jogos para os outros, mas esperava-se que depois, nos jogos da fase final, se superassem e mostrassem o melhor.

As escolhas foram obviamente do seleccionador nacional, e tirando este ou aquele jogador com contratempos de última hora, havia gente com qualidade e em quantidade para fazer alguma coisa vistosa. Ninguém lhes pedia o título, que nestas coisas não costuma funcionar por encomenda.

No final, o balanço não deixa de ser sofrível. Houve quem já tivesse escrito que foi a pior classificação de Portugal em Europeus. Nos tempos recentes, claro.

Tirando um outro momento individual, uma ou outra jogada com cabeça, tronco e membros, viu-se muito pontapé para a frente, muita bola a sair pelas linhas laterais nas reposições a partir da baliza, muito passe perdido e transviado, pouco acerto nas combinações ofensivas, algumas boas defesas, também umas quantas faltas e "fitas" desnecessárias. Em matéria de remates à baliza nem valerá a pena fazer a contabilidade do que de bom, mau e muito mau se viu.

Terminou tudo em desalento e com uma imagem do capitão atirando a braçadeira ao chão. Era evitável.

Entraram juntos, saíram juntos. Por aí nada a dizer. 

No resumo final, porém, as pessoas apenas recordarão para a história quatro jogos, uma vitória, um empate, duas derrotas, sete golos marcados e sete sofridos, dos quais quatro num único jogo.

E que chegámos aos oitavos de final com mais quinze equipas. Das vinte e quatro à partida só há oito que mostraram ser piores do que os actuais campeões da Europa.

Alguém se pode orgulhar disto? Estão feitas as contas.

A falta de sorte

Paulo Sousa, 28.06.21
 
“Hoje é dia de futebol, e aqui estamos todos unidos em torno do futebol e, portanto, eu não vou agora estar a falar de outros temas, porque é desconcentrar o fundamental.”
Marcelo Rebelo de Sousa, no ínicio do jogo com a Hungria em 15 de Junho de 2021

Deixamos que a falta de sorte se tornasse na última camada de pele do nosso ADN cultural. Foi por ela que ficámos repetidas vezes no lado errado da história. Os nossos governantes alimentam essa ideia e sempre que se lhes exige responsabilidades e consequências apontam sonsamente para a falta de sorte.
Assim, e mais uma vez devido à causa habitual, fomos ontem afastados do “fundamental” e relegados para a nossa vidinha cheia de coisas “secundárias”, tais como a pandemia e os seus efeitos, a estagnação económica e social, a pobreza, o marasmo e a endogamia política, o nepotismo, a dívida, a iminente subida das taxas de juro, a subserviência dos média e mais uma mão cheia de idênticas banalidades.
Os nossos políticos adoram que mergulhemos nesta anestesia colorida em que os torneios internacionais de futebol se tornaram e, quando terminam, ficam a pensar se no próximo campeonato ainda estarão no poder.
Será no Qatar e já no próximo ano. Até lá regressemos às tricas secundárias.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 28.06.21

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José António Abreu: «Estou de volta (estejam à vontade para festejar porque, por muito que goste de vocês – especialmente de ti; sim, tu, com o Toshiba cor-de-rosa –, não serei eu a fazê-lo). Tendo rabiscado umas quantas notas que não cheguei a publicar, vou desfazer-me delas durante os próximos dias. Depois talvez comece a prestar atenção ao novo governo. Ou não: estados de graça não combinam comigo.»

 

Luís M. Jorge: «Durante muitos anos tentei gostar de requeijão. Provava-o quando podia, misturava-o com coisas, comprava embalagens que apodreciam no frigorífico intocadas ou debicadas, logo abandonadas. Não tenho má vontade contra o requeijão. Nem aquela matéria branca, esponjosa, insonsa, popular tem culpa de que eu não a aprecie. Há alturas em que o mundo deve seguir o seu caminho, e nós o nosso, sem ressentimentos.»

 

Eu: «Debaixo do Vulcão (Malcolm Lowry) - o livro da minha vida. O Fim da Aventura (Graham Greene). O Zero e o Infinito (Arthur Koestler). Memórias de Adriano (Marguerite Yourcenar). Adeus às Armas (Ernest Hemingway). A Condição Humana (André Malraux). Moby Dick (Herman Melville). O Retrato de Dorian Gray (Oscar Wilde). O Pavilhão dos Cancerosos (Alexandre Soljenitsine), 1984 (George Orwell). Os Nus e os Mortos (Norman Mailer). Até à Eternidade (James Jones). O Céu que nos Protege (Paul Bowles). Não Matem a Cotovia (Harper Lee). As Vinhas da Ira (John Steinbeck - para quando uma boa tradução em português desta obra-prima da literatura universal?).»

Fim de semana (1)

Pedro Correia, 27.06.21

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Sintra, mais deslumbrante que nunca. E, por estes dias, com um número quase residual de turistas - algo impensável há ano e meio, inimaginável em pleno Verão.

Vale a pena visitá-la com vagar, aproveitando o espaço disponível: quando lá vamos, ficamos sempre a ganhar. Em conhecimento histórico, em fruição da beleza natural e arquitectónica, em pausa na rotina quotidiana.

Se algo de bom nos trouxe o coronavírus foi isto: podermos desfrutar recantos do País que antes pareciam reservados a hordas forasteiras. Valha-nos isto. Aproveitemos enquanto dura.

O comentário da semana

Pedro Correia, 27.06.21

«O desgoverno é uma forma de governo. Não há nada de mal na declaração de Ferro Rodrigues, a não ser que a consideremos no contexto do desnorte sobre o tema cansativo da covid.

Em boa verdade as duas mais altas figuras do estado já nos vieram dizer por actos e por declarações públicas que estão cansadas de manter esta canga sobre os cidadãos e que a acham injustificada. Demoraram para evidenciarem aquilo que é um sentimento generalizado, mas que ainda não conseguiu romper a subjugação pelo medo a que o povo tem sido sujeito de maneira laboriosa e planeada fará dois anos não tarda.

A covid tornou-se um óptimo negócio. Os bons negócios que dão dinheiro e poder sobre as pessoas são obviamente para manter. Quanto maior for a destruição, mais generosa pode ser a bazuca. E 80% dela vai direitinha para o estado.

Trabalhar para quê? O problema já não é o vírus, é a virose.»

 

Do nosso leitor João Gil. A propósito deste meu texto.

Pensamento da semana

João Pedro Pimenta, 27.06.21

Já ouvi um ou outro comentário, e também nas caixas do Delito, a dizer que mesmo depois da pandemia se deviam usar máscaras no Inverno para impedir constipações. Se puder optar, venham todas as constipações. Pretender continuar com mascaras pós-pandemia equivale a alguém estar preso, receber a ordem de soltura e preferir ficar na prisão porque lá fora há muitos drogados.

 

Este pensamento acompanhou o DELITO durante toda a semana.

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