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Há tempos lembrei-me de coligir os textos que já escrevi desde 2011 – mais de mil. Um exercício de narcisismo oco: a maior parte estão datados e quase todos, se os republicasse, teria vontade de alterar – não que ganhassem necessariamente com o exercício, quem torto nasce etc.
Isto a benefício de um imaginário sobrinho-tetraneto, que decerto pensaria, se lesse, que bem estranhos eram os tempos do seu avoengo.
Dei-me conta de que jamais escrevi uma linha sobre música. Estranho: ouço-a há décadas, quase todos os dias, às vezes por horas, e tenho gostos perfeitamente delimitados.
Esta idiossincrasia é parte do problema: não partilho os gostos musicais de quase ninguém que conheça e, salvo um ou outro intérprete, por causa de uma ou outra canção, ou alguma qualidade distintiva, envolvo quase toda a música popular, nacional e estrangeira, contemporânea e pregressa, na mesma indiferença no melhor dos casos e, o mais das vezes, aversão.
Tanta que não vou a estabelecimentos com música ambiente; e, se os não puder evitar, acabo por pedir que ponham a música mais baixo, com a secreta esperança de que a desliguem. Coisa que costuma surpreender os proprietários ou empregados porque têm a ideia peregrina de que o barulho alegra o ambiente, e que o silêncio não se aguenta.
Sucede que a maioria das pessoas que gostam muito de música, se perguntadas sobre de que música gostam, dirão que a de qualidade; e inquiridas sobre o que é música de qualidade esclarecerão com exemplos da música que apreciam. Essa é a que tem qualidade – a outra não.
A conversa, havendo gostos diferentes, está portanto minada. E se, num momento de loucura, me passasse pela cabeça afirmar que Julio Iglesias é (ou era, parece que está a cair da tripeça) um cantor xaroposo e peganhento, um fã do charmoso que calhasse de ler (no caso de os fãs saberem ler, uma improbabilidade, e de me lerem a mim, outra maior) ficaria justamente indignado.
Indignação mais do que justa. Porque há gente que se comove, a ouvir o Julio, até às lágrimas. E que a uma pessoa honesta se venha dizer que o que a comove até às lágrimas, ou o que a faz vibrar, ou sonhar, é um produto inferior destinado a impressionar sensibilidades grosseiras, é o mesmo que dizer que a pessoa, ela mesma, é no melhor dos casos ignorante e básica. O que, mesmo que fosse verdade (e pode não ser – no exemplo que escolhi não é impossível que a senhora que delirou com os gorjeios do azeiteiro tenha um excelente tino literário, ou sólida formação científica, ou discernimento em artes plásticas, ou, ou, ou) cairia muito mal, sem nenhum benefício para os destinatários e algum risco para o insolente.
Depois, há a juventude e a idade madura. E aquela música de que se gostou muito na adolescência tende a ficar associada ao maravilhamento da idade, razão pela qual, para o resto da vida, os ídolos musicais daquele tempo dourado ficam embrulhados no véu da saudade.
De resto, se se entendesse elevar o nível do gosto musical, o caminho a seguir seria o de ensinar música na escola, isto é, a lê-la e tocar pelo menos um instrumento com razoável grau de domínio, e não dar aulas de gosto com base nas nossas preferências. Ensino que poderia defender sem ofender ninguém se o achasse – não é o caso – de capital importância.
Portanto eu, de música, nunca disse pevas e fiz muito bem: não aconselho, não sugiro e não preciso de companhia. No YouTube e no Spotify está o que quero, e agradeço que não me recomendem nada, salvo aquela última aplicação, que me aconselha coisas, acertando muitas vezes ꟷ algoritmo reguila.
Hoje porém vou abrir uma excepção para confessar uma particular incredulidade pelo sucesso de Sérgio Godinho, que fez 75 anos e, para comemorar, enche salas e pavilhões com gente que lhe vai ouvir os trinados.
Trinados é como quem diz. Que na realidade o homem até a cantar no quarto de banho só poderia legitimamente agradar a um cão paciente e meio surdo.
O que vai aquela gente lá fazer? Não pode ser para o ver, que é tão atraente como um pau de sabão; nem para o acompanhar nas melodias, que se calhar de ficarem no ouvido são ainda mais incomodativas do que o excesso de cera; nem por causa da poesia, tão inspirada como a bula de um medicamento. E da música tocada é melhor nem falar – aqueles músicos, se andaram no Conservatório, e este esteve à altura da sua missão, devem ter os nós dos dedos encaroçados de tanta reguada.
De modo que, se a lógica não for uma batata, a assistência vai ali como se vai ao cemitério no Dia de Todos os Santos: visitar os falecidos, no caso o PREC.
Respeito os mortos, e gosto de cemitérios. Mas sem barulho. Que agradeço não façam na caixa de comentários porque, prometo, nos próximos dez anos, se ainda por cá andar, direi sobre música o que disse nos dez anteriores.
Livro sete: Acordo Ortográfico - Um Beco com Saída, de Nuno Pacheco
Edição Gradiva, 2019
203 páginas
O chamado “Acordo Ortográfico” – concebido pelo Executivo de Cavaco Silva em 1990 e concretizado pelo Governo de José Sócrates em 2008 – instituiu um panorama caótico na expressão escrita. Mas apenas em Portugal: os brasileiros mantêm a ortografia que já cultivavam, Angola e Moçambique nunca reconheceram as alterações e os restantes países de língua oficial portuguesa permanecem indiferentes ao seu conteúdo – espécie de norma às avessas, cheia de “facultatividades” e duplas grafias, à revelia do nosso aparelho vocálico e do étimo das palavras, muitas das quais ficaram desfiguradas e outras irromperam do nada, geradas por aparente delírio.
O AO90, que pretendia «unificar e simplificar» o idioma, sempre encontrou convictos adversários. Incluindo o actual Presidente da República, um dos 900 signatários de um abaixo-assinado anti-acordo que em 1990 congregou os nomes mais prestigiados das nossas letras – entre eles, Sophia de Mello Breyner Andresen, José Cardoso Pires, Vergílio Ferreira, Eduardo Lourenço, Óscar Lopes, David Mourão-Ferreira, Hélia Correia, Manuel Alegre, Herberto Helder, Maria Gabriela Llansol, Vasco Graça Moura e Mário Cesariny.
O jornalista Nuno Pacheco – co-fundador do Público, de que foi durante largos anos director-adjunto – tem sido um dos mais determinados e esclarecidos opositores ao “desacordo” ortográfico em numerosos artigos de opinião publicados naquele jornal e aqui reunidos, numa sequência cronológica iniciada em 2007 e prolongada até 2019. Artigos que nos fornecem a dimensão exacta deste atentado ao nosso património cultural que muitos brasileiros também rejeitam. «Outra maluquice», comentou Caetano Veloso. «Achei uma bobagem esse negócio da nova ortografia, não faz o menor sentido», observou Nelson Motta. «Sou contra, acho uma burrice», desabafou João Ubaldo Ribeiro.
«O Acordo Ortográfico de 1990 nasceu de um perigoso casamento: o do medo com a mentira», assinala Nuno Pacheco. O pavor de ver surgir uma «língua brasileira» conjugado com a alegação de que o português é a única língua com duas ortografias oficiais. Nada mais errado: o francês tem 15 variantes ortográficas reconhecidas, o espanhol tem 21, o árabe tem 16 e o inglês tem 18.
O desacordo desfigurou ruptura, que os brasileiros continuam a escrever desta forma, instituindo uma rutura a partir do nada. O vulgar interruptor tornou-se interrutor. Ótico (relativo ao aparelho ocular) perdeu o p (usado pelos brasileiros) e ficou igual a ótico (relativo ao aparelho auditivo). Apesar de a optometria ainda ser actividade profissional, tal como arquitectura, que recusa perder o c mandado retirar pela falange acordista. Palavras como recepção e concepção – que mantêm esta grafia no Brasil – passaram a escrever-se aqui receção e conceção – homófonas de recessão e concessão. O que já levou o Supremo Tribunal de Justiça a aludir a um putativo «aviso de recessão» e a Escola Superior de Gestão a pronunciar-se sobre «conceção de créditos». Dois exemplos entre muitas outras aberrações: ninguém se entende nesta balbúrdia.
O caos é tão flagrante que até a Presidência da República, em comunicados oficiais, escreve contato em vez de contacto, porventura convencida de que aquele segundo c que todos pronunciamos devia ser eliminado porque dá jeito sabe-se lá a quem. O que diria Marcelo Rebelo de Sousa, outrora militante anti-AO90, destes disparates hoje cometidos em seu nome?
Sugestão 7 de 2016:
O Bosque, de João Miguel Fernandes Jorge (Relógio d'Água)
Sugestão 7 de 2017:
1933 Foi um Mau Ano, de John Fante (Alfaguara)
Sugestão 7 de 2018:
O Visitante da Noite & Outros Contos, de B. Traven (Antígona)
Sugestão 7 de 2019:
Um Futuro de Fé, do Papa Francisco e Dominique Wolton
Há uma polémica sobre a disciplina Educação para a Cidadania. Como a minha filha não estudou em Portugal não conheço o programa e a prática (ela teve, no currículo da Escola Europeia de Bruxelas, disciplinas congéneres excelentemente leccionadas que muito contribuiram para a fazer uma jovem muito informada e com uma consciência bem densa).
Assim, e por curiosidade, fui ver o programa disciplinar, esse que sustenta toda esta polémica. O portal da DGE está em baixo (oops, início de Setembro ainda por cima ...). Como tal restrinjo-me aos dados da televisão pública, RTP Ensina.
A primeira coisa que se percebe é que a disciplina veicula um conjunto de considerações que se esperam constitutivos dos valores estruturantes da prática individual. Ou seja, é mesmo uma espécie da velha "Religião e Moral" do Estado Novo, um seu sucedâneo. Não estou a dizer que é a mesma coisa. Mas que cumpre a mesma função pedagógica: explicitamente formar (formatar, como se diz agora) os valores dos indivíduos-cidadãos. Os que negam esta homologia apenas assentam os seus argumentos num "tem que ser", num dever-ser dos valores que são agora transmitidos. Concorda-se com os conteúdos transmitidos? Ok. Mas não podem chamar hereges, demoníacos, imorais ou mesmo até, e pior, ateus, aos que os recusam. E tal como eu, e outros, pude acabar o ensino secundário isento das aulas de Religião e Moral (dado o saudável e iluminado ateísmo do Senhor meu pai) sem que isso prejudicasse o meu desempenho em Ciências e Letras, também os de agora o poderão fazer - ficando um bocadinho mais morcões em alguns assuntos, presumo eu, mas paciência ...
A segunda coisa que eu retiro desta visão sobre o programa de Educação para a Cidadania é que o Estado, através do seu "aparelho ideológico" Escola, impregna os jovens com a mistificação das relações laborais exploratórias do sistema capitalista, introduzindo-os ao famigerado "Empreendedorismo", esse ícone do individualismo assente na falácia da meritocracia. Fico estupefacto e até indignado com a audácia ideológica da Escola portuguesa, com esta reprodução da mundivisão capitalista. E ainda mais surpreso fico com a ausência de crítica a esta insidiosa prática pedagógica. Onde estão agora as Raquel Varela deste país?
A terceira coisa que retiro (repito, apenas baseado nos recursos partilhados pela RTP Ensina) é uma grande ênfase na homossexualidade e seu casamento, e nas dimensões violentas (físicas e psicológicas) das relações amorosas, neste caso significadas como heterossexuais. Há apenas um filminho sobre a sexualidade juvenil, passível de não ser considerada exclusivamente homossexual, cujo texto inicia atribuindo-a a fenómenos naturais (as hormonas que saltam, etc.). Ou seja, no até vasto manancial de recursos sobre amor, sexualidade, conjugalidade, não há um filminho que seja sobre a beleza do casamento heterossexual (o antes dito "canónico"), nada o erege como "valor". Nem há - num país que tem uma baixissima taxa de natalidade, por vezes a menor da Europa - um capítulo nesta "Educação para a Cidadania", e com um filmezito qualquer, sobre puericultura, sobre a beleza da pater/maternidade. Não estou a falar da reprodução do mito do "Presépio" familiar. Mas sobre o veicular da dimensão de reprodução biológica enquanto espaço de cidadania. Nada mesmo ... Porventura porque os ideólogos do Estado pensarão que não cumpre ao Estado orientar valores sobre sexualidade ou vida familiar e afectiva? Decerto que não, pois muito do resto que ensinam incide sobre isso. De facto, o que o quadro geral da disciplina deixa perceber é uma visão enviesada das temáticas sociais prementes, segundo a ideologia identitarista em voga.
Um último ponto, já não advindo da consulta à RTP Ensina. Especulo, mas julgo provável que muitos dos professores desta disciplina, provenham de licenciaturas mais retóricas, humanidades ou ciências sociais. Convirá perceber que, ao que fui ouvindo e deduzindo ao longo dos anos, algum desse ensino superior é muito doutrinário. E será assim normal que matérias socialmente algo sensíveis sejam, por vezes, leccionadas por gente que foi doutrinada na sua formação e tenda à doutrinação. Mas aí o problema não radica na disciplina. Nem no ministério da Educação.
Enfim, pode-se dizer que é estúpido não querer que os filhos aprendam o que ali se ensina. Porventura sê-lo-á. Mas temos o direito de ser estúpidos. De não crer. E de não querer. Se eu tivesse miúdos a estudar em Portugal em vez de subscrever abaixos-assinados paroquiais preferiria gastar algum tempo, no lugar de ver o "Preço Certo" do simpático Mendes ou a "Quadratura do Círculo" da isenta comentadora Mendes, dedicando-me a matizar junto desses filhos alguns exageros "identitaristas" veiculados por qualquer furibundo setôr ...
Barack Obama
Fiz a minha escola primária no Colégio Moderno onde nunca vi que se procurasse ensinar às crianças nada mais do que os conteúdos escolares habituais. Quando, porém, entrei no ciclo preparatório na escola oficial em 1973 descobri que existia uma disciplina de Religião e Moral, que me pareceu imediatamente uma disciplina diferente das demais, quer pelos conteúdos, quer pelo estilo de leccionação.
Embora tivesse apenas dez anos e tivesse tido uma educação religiosa na família, estranhei por isso imenso as aulas nessa disciplina. Soube, porém, que a disciplina não era obrigatória, podendo os alunos ser dispensados da frequência das aulas se o encarregado de educação fizesse um requerimento nesse sentido. Convenci, por isso, o meu Pai a elaborar esse requerimento, argumentando que, se fosse dispensado de assistir a essas aulas, teria mais tempo para estudar as outras disciplinas que me pareciam efectivamente importantes.
Levei assim com entusiasmo o requerimento assinado à escola, solicitando a dispensa da frequência dessas aulas. Ao contrário do que eu esperava, o requerimento foi, no entanto, recebido com imensa perplexidade, uma vez que parece que ninguém se tinha até então atrevido a exercer esse direito. A Professora perguntou superiormente o que deveria fazer, e o Conselho Directivo da escola reuniu de urgência sobre o assunto. No fim da reunião, informaram-me que o requerimento do encarregado de educação não era suficiente e que eu teria que continuar a frequentar as aulas até haver uma decisão final do Ministério da Educação. E assim, com imenso sacrifício, lá frequentei essas aulas, o que só confirmou a minha opinião sobre a sua inutilidade absoluta. Os tempos foram passando e acabei por me convencer de que o direito que eu tinha exercido para não frequentar essas aulas não iria ser reconhecido.
Só que, passado um mês, a Professora informa-me que o Ministério da Educação tinha deferido o requerimento e que eu afinal estava dispensado de frequentar as aulas de Religião e Moral. Imediatamente me despedi com imensa alegria de todos os Colegas, os quais ficaram furiosos por continuarem sujeitos a essa provação, enquanto eu era dispensado. Foi aí que aprendi que os direitos existem para ser exercidos, independentemente de os outros não quererem que o façamos.
Não faço a mínima ideia se a actual disciplina de Educação para a Cidadania constitui ou não uma situação semelhante à Religião e Moral do meu tempo. Sei, porém, que o art. 43º, nº2, da Constituição proíbe o Estado de "programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas". E que, perante uma disposição constitucional que toda a gente parece querer esquecer, houve alguém que a decidiu invocar. Só isso me parece meritório.
Estou, mãe? Diz. A tua neta quer falar contigo. Tem uma aventura para te contar. Ah sim? Deve ser uma grande aventura, pois se saiu daqui faz pouco tempo, mas que venha de lá a aventura. Estou, avó? Então neta, conta lá as tuas façanhas. Não é azenhas, avó, é mesmo uma peripécia. Não consigo deixar de sorrir quando ela joga estes ases vocabulares. Estou à espera, podes começar. Então… conheces aquele parque ao pé da minha casa, aquele que tem muitos espaços com água? Conheço. Então, hoje fomos até lá para distrair o mano e sentámo-nos na beira da água. A água estava morninha e eu disse à minha mãe que me apetecia mesmo dar um mergulho. Então comecei a borrifar o meu pai e cheguei mais para dentro para alcançar mais água. Silêncio. E então? Então, não sei como, splash! Caí dentro de água! Com a minha roupa e os meus sapatos e tudo. Não acredito! É verdade, avó. Tive que voltar para casa embrulhada naquele cobertor branco com um ursinho que costuma estar por baixo, no carro do mano. Que maluquice, neta! Isso é que foi uma aventura, mas só prova que foste pouco cuidadosa e que tens que ter mais atenção durante as brincadeiras. Estás enganada, avó. Prova é que os nossos desejos se podem realizar!
Pois é… será que ver o copo meio vazio é sinal de maturidade ou apenas pessimismo?
Foto de Paulo Oliveira retirada do Google
Ponte de Lima
Os lugares e monumentos, testemunhas do passado e da História, moldaram o povo que somos hoje.
Falo, como já certamente repararam, daquele casarão amarelo torrado à esquerda. Ali começou Jorge Mendes a sua carreira de agente futebolístico, quando, ao explorar a discoteca Alfândega, conheceu o jovem guarda-redes Nuno Espírito Santo, que, entre investidas nos bares da Rua Direita e farto dos humores de Pimenta Machado, queria mudar de ares. Mendes tratou de tudo, levou-o num processo turbulento de Guimarães para o Deportivo da Corunha e mais tarde para o Porto, e ainda hoje Nuno, agora treinador do Wolverhampton, é representado por ele. Não fosse esse encontro e as carreiras de Cristiano Ronaldo, Mourinho, Di Maria, James Rodriguez e tantos outros seriam provavelmente diferentes.
Já agora, na casa em ruínas à esquerda, em baixo, nasceu o "Presidente-Rei" Sidónio Paes, uma das figuras mais marcantes da 1ª república. Deixou como legado à terra que o viu nascer um bolo de amêndoa e ovos que é altamente aconselhável.
Não interessa nada, mas a meio, entre a Rua Direita, a torre do relógio e a muralha em frente ao rio vemos a matriz de Caminha, do séc. XV, um dos mais belos edifícios religiosos em Portugal, com o seu exterior gótico e, dentro, um tecto de madeira em estilo mudéjar, com inúmeros motivos marinhos.
Fernando Penim Redondo: «Não me parece que tenhamos ganho muito com a proliferação de “doutores e engenheiros” na nossa sociedade. Só numa pequena percentagem eles encontram no mundo empresarial quem parta dessa formação de base para sobre ela construir verdadeiras competências que gerem riqueza. A própria crise que o Estado está a viver, no plano financeiro e não só, mostra que a saturação de “professores doutores” nos ministérios não foi panaceia adequada.»
João Campos: «Um leitor que vá à Fnac para comprar Dune, de Frank Herbert, pode hoje escolher uma de três opções. A primeira, é comprar a edição de bolso, em formato paperback e em língua inglesa, editada pela Ace e vendida por sete (7) euros. A segunda, é comprar a edição também em língua inglesa, mas em formato hardcover, numa edição da Gollancz integrada na colecção "SF Masterworks"; esta opção tem o preço de 14,5 euros. A terceira opção é comprar a edição em Português, recentemente traduzida e publicada pela Saída de Emergência. Custa 23 euros.»
Teresa Ribeiro: «É considerado por muitos o mais intimista e requintado dos cineastas que emergiram da União Soviética. Uma das suas obras, rodada à beira-mar, tornou-se um filme de culto. Falamos de que realizador e de que filme?»
Eu: «Confesso ter cada vez menos paciência para filmes cheios de pirotecnia visual, onde tem de “acontecer” qualquer coisa de 30 em 30 segundos e em que a “acção” é um objectivo que parece esgotar-se em si mesmo. Filmes como o tão elogiado A Origem, talvez a mais propagandeada longa-metragem do ano. É uma espécie de cruzamento de géneros, meio thriller meio ficção científica, com um Leonardo di Caprio cheio de energia a comandar o elenco. Poucos filmes me irritaram tanto, nos últimos meses, como este. Desde logo por ver desperdiçado o talento de Marion Cotillard, provavelmente a melhor actriz de cinema da sua geração, num papel secundário que não exige quase nenhum dos atributos que a têm distinguido.»
Em 21 destaques feitos pelo Sapo em Agosto, entre segunda e sexta-feira, para assinalar os dez blogues nesses dias mais comentados nesta plataforma, o DELITO DE OPINIÃO recebeu 20 menções ao longo do mês.
Incluindo quatro textos na primeira posição, sete na segunda e dois na terceira.
Os textos foram estes, por ordem cronológica:
Um sábio (68 comentários, segundo mais comentado do fim de semana)
Pensamento da semana (26 comentários)
A frase que ficou a meio (58 comentários, segundo mais comentado do dia)
O socratismo nunca existiu! (13 comentários)
Faria rir se não fosse obsceno (82 comentários, o mais comentado do dia)
Mudar ou não mudar: eis a questão (56 comentários, o mais comentado do fim de semana)
O editorial que vai faltando cá (56 comentários, segundo mais comentado do dia)
Dois pesos e duas medidas (102 comentários, segundo mais comentado do dia)
Penso rápido (97) (28 comentários, terceiro mais comentado do dia)
Férias sem testes nem máscaras (34 comentários)
Quem fala assim... (9) (28 comentários)
Psicodrama à mesa (32 comentários, segundo mais comentado do dia)
Não conseguiram melhor que isto? (78 comentários, o mais comentado do dia)
O esbulho fiscal dos salários (2) (46 comentários)
20 motivos para amar Portugal (XIV) (27 comentários, terceiro mais comentado do fim de semana)
20 motivos para amar Portugal (XVI) (60 comentários)
Costa: «Os gajos são cobardes» (130 comentários, segundo mais comentado do dia)
20 motivos para amar Portugal (XVIII) (30 comentários)
Dez livros para comprar na Feira (44 comentários, o mais comentado do dia)
De boca bem tapada (50 comentários, segundo mais comentado do fim de semana)
Com um total de 1048 comentários nestes postais. Da autoria do João Campos, do JPT, do Paulo Sousa e de mim próprio.
Fica o agradecimento aos leitores que nos dão a honra de visitar e comentar.
Sempre ouvi críticas à falta de civismo dos portugueses. E ao contrário de outras, estas são fáceis de fundamentar. Basta repararmos no lixo que se acumula nos areais das praias, nas bermas de estrada e nos centros urbanos para encontrar abundantes provas de que a acusação tem fundamento. Mas esse défice de cultura cívica observa-se também na condução, seja em estrada, seja no trânsito das cidades e no comportamento das pessoas sempre que surgem situações de stress no espaço público. Em tempo de pandemia, mais uma vez o desrespeito pelos outros tem-se manifestado das mais diversas formas, através de comportamentos que envolvem o risco de contágio.
Ainda a um outro nível, o do envolvimento dos cidadãos em causas comuns, observa-se a mesma deficiência: a participação da sociedade civil na vida democrática é escassa, o que se reflete na qualidade da própria democracia. Temos, pois, um problema. Por isso, se algo sempre faltou nas nossas escolas foi, precisamente, a Educação para a Cidadania, disciplina que tem, entre outros, o importante papel de ensinar a viver melhor em comunidade, a exercer direitos e a cumprir deveres que afinal não são mais que os fundamentos da sociedade democrática.
Quando essa matéria foi finalmente incluída nos programas de ensino pareceu-me uma decisão que só pecava por tardia. Algo que era tão óbvio que nem merecia discussão. Até que os encarregados de educação de uma escola de Famalicão criaram um caso que está a dar que falar e, pasme-se, já teve como consequência um abaixo-assinado: https://observador.pt/2020/09/01/cavaco-passos-e-d-manuel-clemente-defendem-objecao-de-consciencia-de-pais-que-nao-queiram-filhos-nas-aulas-de-educacao-para-a-cidadania/.
Os seus subscritores defendem o direito daqueles pais a censurar uma disciplina em nome da liberdade de escolha. Pergunto-me o que se seguirá. Poderemos amanhã ter pais a proibir os filhos de frequentar as aulas de ciências naturais onde se ensina a teoria evolucionista, por exemplo. Queremos, em nome da liberdade, criar o caos, permitindo que os programas de ensino passem a ser definidos conforme as sensibilidades dos encarregados de educação?
E o que dizer de subscritores deste abaixo-assinado como Passos Coelho e Cavaco Silva, ex-líderes da nossa democracia para quem a educação cívica, pelos vistos, é uma matéria descartável?
Livro seis: Fósforos e Metal Sobre Imitação de Ser Humano, de Filipa Leal
Edição Assírio & Alvim, 2019
70 páginas
Há quem a conheça enquanto excelente declamadora – ou recitadora – de poesia. Mas importa aqui realçar Filipa Leal como um dos mais talentosos nomes da poesia contemporânea em Portugal, de que este livro dá testemunho.
Fósforos e Metal Sobre Imitação de Ser Humano estabelece uma ponte entre formas clássicas, de onde a erudição não está ausente, e um coloquialismo que traz impressas marcas do quotidiano, sob este mote: «Não suja as mãos quem suja o poema.»
Estamos perante uma voz original, que transforma episódios pessoais e reminiscências familiares em matéria poética sem permanecer imune ao ruído da rua. São versos percorridos por uma suave ironia autodepreciativa onde se encontram ecos de um O’Neill. Versos que revelam sábia oficina sob a aparência de uma espontaneidade quase desconcertante.
«Alguns ficaram com as minhas partes / piores. Isto é como a divisão do frango / em família numerosa. Faltam coxas para todos. / Isto é como a aprendizagem da generosidade: / o peito ou o pescoço ou as asas. Lá em casa, / fazíamos de conta que preferíamos outra coisa / e dávamos as partes melhores aos irmãos.»
Este excerto do poema “A Divisão do Frango” constitui um bom exemplo, tal como os versos iniciais de “Separação Total de Bens”: «Devolveste-me: / as chaves de minha casa; / duas tragédias gregas / que eu tinha deixado na tua mesa de cabeceira.» Ou os versos finais de “Sobre as pessoas que não dão laranjas”: «Não sei distinguir as laranjeiras / quando estão sem laranjas. / O mesmo me acontece com alguns livros / e com algumas pessoas.»
Neste singular cruzamento de temas, há poesia-em-prosa quase política: «O Ceausescu é meu amigo no facebook». Ou quase satírica: «O importante é ter telemóvel, televisão por cabo e internet rápida para, se viveres longe da família, marcares o avião ou o comboio que te levará à casa onde te fazem arroz de polvo e bolo de iogurte.» Ou quase romântica: «Queria os teus olhos a fecharem-se comigo por dentro e tu por dentro de mim.»
Mas resistindo incólume às armadilhas do sentimentalismo e sem escorregar para artifícios retóricos. Em novo teste superado com distinção.
Sugestão 6 de 2016:
Axilas e Outras Histórias Indecorosas, de Rubem Fonseca (Sextante)
Sugestão 6 de 2017:
O Tesouro, de Selma Lagerlöf (Cavalo de Ferro)
Sugestão 6 de 2018:
Quem Disser o Contrário é Porque Tem Razão, de Mário de Carvalho (Porto Editora)
Sugestão 7 de 2019:
Como Ser um Conservador, de Roger Scruton (Guerra & Paz)
Diálogo entre duas mulheres em férias algarvias:
- A minha máscara cheira a merda.
- Credo! Porque é que não a deitas fora?
- Era o que faltava, andar a comprar máscaras. Tenho muito mais em que gastar o meu dinheiro.
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Diálogo entre dois homens em férias algarvias:
- Ontem, ali no urinol, mijei na máscara. Levava-a na mão, estava distraído e não reparei.
- E o que fizeste?
- Tive que a pôr na cara mesmo assim. Sabes que eles não nos deixam andar sem máscara aqui no hotel.
- Mas não a lavaste antes?
- Olha, nem me lembrei disso.
Chegam ao fim dois anos de trabalho nos dois lados da fronteira. Com base em documentação de arquivo - muita dela inédita - e algumas entrevistas, este livro traça a história política da organização terrorista ETA, extinta em 2018. É uma história de nacionalismo, nativismo e violência política. Pelo meio, faz-se a primeira análise sistematizada da presença e relações do terrorismo nacionalista basco em Portugal (1960-2010).
Estará disponível na Feira do Livro de Lisboa no próximo fim-de-semana. E chegará às livrarias de todo o país em meados de Setembro. Até lá, os interessados podem encontrá-lo na página web da editora E-Primatur / Bookbuilders com desconto de pré-lançamento. Darei notícias.
Vila Nova de Milfontes
Ana Vidal: «Alguém me explica em que número de barris de petróleo este homem passou de louco fanático a "líder carismático"? Dêem-lhe muita corda e depois queixem-se.»
João Carvalho: «Com as cem creches prometidas (isto de promessas do primeiro-ministro é o diabo) até Dezembro, não faltarão palcos para José Sócrates continuar a falar por muito tempo. É só ir agendando as creches que estiverem a funcionar. Mas nunca a funcionar há muitos meses, que pode parecer mal.»
José Gomes André: «Com vinte anos fiz um inter-rail. Munido da arrogância - e da ingenuidade - próprias da idade, fiz-me à estrada (ou melhor, aos carris) e visitei meia Europa. Que me lembre, passei por Paris, Frankfurt, Praga, Cracóvia, Budapeste, Bratislava, Viena, Salzburgo, Veneza, Florença e Siena. Gastei dois anos de poupança, comi sandes mistas até ficar mortalmente enjoado de queijo, dormi em hotéis de uma estrela, fui assaltado três vezes. E ganhei uma companhia para a vida.»
Miguel Marujo: «Agora que só se sai à rua de cravo na mão a horas certas, fica arrumada na memória a frase tantas vezes pintada nas paredes, os ricos que paguem a crise, mesmo que agora ela permaneça actual. É verdade que os ricos deste país, na altura em que frase era mote pichado, se tinham pisgado para o Brasil, regressando anos depois sem grandes mazelas na conta e na sobranceria. Hoje, os ricos confundem-se com um IRS de 40, 42 ou 45 por cento, coisa mal pensada, que belmiros e amorins são poucos nos 45 e zés e marias que chegam aos 40 não podem sonhar com a lista da Forbes – talvez com a foto de férias no Jornal da Noite da SIC.»
Sérgio de Almeida Correia: «O que está a acontecer com Carlos Queiroz não vai mudar em nada a imagem do futebol português e dos seus dirigentes. Tenho sérias dúvidas que venha a servir para alguma coisa, para lá do linchamento do agora execrável seleccionador nacional. É que no estado de putrefacção em que vivemos, ainda que as moscas sejam enxotadas, amanhã outras virão.»
Eu: «Parece que andam aí umas almas muito alvoroçadas por haver quem registe presenças e ausências numa manifestação. Gostaria de tranquilizá-las: isso é comum fazer-se em qualquer manifestação - e acreditem que percebo alguma coisa desta matéria. Recordo-me, por exemplo, de o DN ter publicado na capa a fotografia da mulher de um destacado dirigente socialista numa manifestação de professores contra o Governo. É um facto tão relevante como a ausência, numa manifestação pelos direitos humanos, de pessoas conotadas com partidos que fazem profissão de fé "humanista".»