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Delito de Opinião

Uma desgraça

Pedro Correia, 31.07.20

 

- Durante três meses, é ou não verdade que houve pessoas em situação absolutamente desesperada, com uma quantidade de dinheiro por mês que é insuficiente, para dizer o mínimo?

- Houve muitas pessoas...

- Sente que falhou a essas pessoas?

- Ó... ó... vamos lá ver. O Estado, durante esse tempo, aprovou medidas muito importantes de apoio social...

- Claro. Como por exemplo o lay-off simplificado para as empresas...

- O lay-off simplificado...

- Sabe quanto tempo é que essa medida demorou a ser aprovada?

- Mas... oiça... vamos ver...

- Senhora ministra: sabe quanto tempo?

- Eu sei quanto tempo.

- Quanto?

- Eu sei quanto tempo.

- Quanto?

- Mas há uma coisa... há uma coisa que é preciso...

- Quanto tempo, senhora ministra?

- Há uma coisa que é preciso... há uma coisa que é preciso... 

- Vou replicar a pergunta: sabe quanto tempo é que o lay-off simplificado demorou a ser aprovado?

- Sei. E há uma coisa que é preciso aqui realçar. É preciso realçar o seguinte: todos os dados...

- Eu vou deixá-la realçar o que entender, mas gostaria de insistir nesta questão. Porque aqui a questão do tempo de reacção é muito importante...

- Claro que é.

- ... e se o lay-off simplificado demorou uma semana a ser aprovado, o que permitiu ajudar milhares de famílias, a minha pergunta para a senhora ministra da Cultura é porque é que o seu ministério demorou três meses.

- Mas o meu ministério... vamos lá a ver... há aqui um ponto que é muito importante realçar: é que Portugal é um estado social, tem um sistema de segurança social de natureza universal, não há nenhuma razão... não há nenhuma razão... não há nenhuma razão para que as pessoas... todas as pessoas, inclusive as que trabalham na agricultura, não estejam abrangidas pelo sistema de apoio social universal. 

 

Excerto de uma entrevista à ministra da Cultura, Graça Fonseca, conduzida pelo jornalista Bento Rodrigues, há pouco, no Primeiro Jornal da SIC

Um sábio

Pedro Correia, 31.07.20

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Foto: Bruno Gonçalves / Sol

 

Uma entrevista pode ser um grande momento de televisão. Aconteceu na semana passada, no primeiro canal da RTP, no programa Grande Entrevista. António Barreto - um dos genuínos senadores portugueses - pensou em voz alta, durante quase uma hora, sobre algumas das mais relevantes questões nacionais. Com a eloquência habitual e uma notável capacidade de articular ideias. Sem enrolar palavras, sem fazer vénias, sem receio de dizer aquilo que realmente pensa.

Enfim, um sábio. Em diálogo com o jornalista Vítor Gonçalves, hoje um dos melhores entrevistadores da televisão portuguesa. Alguém que está ali realmente para ouvir os entrevistados e não para se ouvir a si próprio - o que vai sendo cada vez mais raro.

Gostei tanto que partilho convosco alguns excertos desta Grande Entrevista. Recomendando, de qualquer modo, que escutem a versão integral. Vale mesmo a pena. Por ser verdadeiro serviço público.

 

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«A dimensão [deste pacote financeiro de emergência da UE para enfrentar a crise pandémica] é muito superior à do Plano Marshall americano, depois da guerra, para toda a Europa. Haver um plano de recuperação económica que ultrapassa largamente a dimensão financeira do Plano Marshall é impressionante.»

 

«Lamento imenso ouvir pessoas dizer que querem "aproveitar a crise" da doença. Para acabar com o capitalismo, para criar Deus sabe o quê, para resolver os problemas... As crises não se aproveitam: o melhor é tratar delas. Ultrapassar a crise para voltar a adquirir meios para encontrar as soluções.»

 

«Os países do Norte [da Europa] têm razão quando exigem fiscalização e supervisão [das verbas]. Primeiro, e sobretudo, porque é dinheiro deles. Depois porque é dinheiro europeu, de nós todos. E em terceiro lugar porque emprestar ou dar sem saber para que serve é quase criminoso. Dizer isto em Portugal passa quase por traição à pátria, o que não me incomoda.»

 

«Parece uma especialidade nossa: nós perdemos muito tempo com a guerra colonial, com a revolução, com a nacionalização da economia, com a reprivatização da economia. Há cerca de 20 anos que o crescimento português é praticamente nulo.»

 

«Quase todos os países da Europa Central e Oriental que entraram depois de nós [na UE] souberam fazer mais rapidamente as reformas, souberam [criar] economias mais competitivas, souberam encontrar soluções adequadas e não ficaram eufóricos com a adesão. Portugal perdeu muito tempo, muito tempo, muito tempo.»

 

«Precisamos de quantidades enormes de capital de investimento, sobretudo privado. E de investimento produtivo novo, não é chegar cá e comprar o que já existe. É preciso fazer novas empresas, novos produtos, novas indústrias, novos edifícios... Mas precisamos de quantidades colossais. Se só tivermos este balão de oxigénio [da UE], não chega. Daqui a dez anos vamos encontrar a mesma vulnerabilidade, o mesmo tempo perdido.»

 

«[O caso BES] é um dos maiores crimes cometidos na história de Portugal, se tudo aquilo for provado. Crime de roubo, crime de desvio, crime de esbulho do País, das classes sociais que trabalham, esbulho do Estado, utilização intensiva de todos os meios de corrupção, de compra, de venda... Não há na história portuguesa nada que se pareça com isto... Eles contribuíram para dar cabo de Portugal.»

 

«Não devemos esquecer o que se passou nesses dez anos: o ciclo Sócrates mais as crises financeiras, mais a bancarrota (nós ficámos a dias da bancarrota), mais a austeridade, mais toda a questão dos fogos florestais, que parece de somenos mas não é. O BES, por cima disto tudo. E agora a pandemia. Este conjunto de fenómenos em dez anos é destruidor de uma geração, é destruidor do País.»

 

«Era bom conseguirmos castigar quem deve ser castigado. E há muita gente para ser castigada. Se a nossa justiça estiver à altura - e eu não sei se está - era bom castigar para dissuadir e para resolver este problema da corrupção, do nepotismo, do favoritismo e do esbulho dos recursos nacionais.»

 

«O BES foi autor, ou ajudou, ou empurrou, ou acarinhou a destruição do que havia melhor em Portugal do sistema financeiro, do sistema industrial e do tecido empresarial. Nas grandes destruições - estou a pensar na PT, por exemplo - esteve sempre o [Grupo] Espírito Santo.»

 

«Daqui a uns anos será interessante ver quem foi na conversa do Espírito Santo. Quase toda a gente: políticos, partidos, governos, empresários (pequenos, médios, grandes), quase toda a gente...»

 

«O Governo está num momento de ausência de oposição quase total, o que é péssimo. (...) Isto não faz bem nem a Portugal nem ao Governo.»

 

«O primeiro-ministro tem conseguido algumas vitórias importantes. Durar, já é uma vitória política. Tem sabido tratar com as oposições todas, tem sabido tratar com o Presidente da República, tem sabido libertar-se do pior deste Governo, que é a terrível herança Sócrates. Agora não tem nenhuma oposição séria, o que é muito mau.»

 

«Nunca vi um parlamento onde se berrasse tanto como o parlamento português. (...) Dar nobreza ao debate parlamentar era uma obrigação dos nossos políticos.»

 

«Vivi 40 anos em Portugal de concorrência institucional entre o Presidente e o Governo, aquilo que se chama - aflitivamente - o semipresidencialismo. Lembro-me dos problemas gravíssimos que houve entre todos os presidente e quase todos os governos. Estes [Marcelo e Costa] decidiram colaborar e cooperar. Aplaudo, acho bem. O País ganha com isso. Onde começa o problema? Da cooperação e da colaboração, é fácil chegar à cumplicidade. E creio que já lá chegámos. Não gosto da cumplicidade. Quero que o Presidente da República tenha recuo, altura, espaço para poder avisar, advertir, controlar, alertar, fiscalizar.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 31.07.20

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João Carvalho: «Deve ser do calor. Imaginem que sonhei que a ministra da Educação quer acabar com os chumbos no ensino. O sol a mais fez-me tanto mal à cabeça que até fiquei taralhoco.»

 

Eu: «Escrevo estas linhas e sinto que estou a discorrer sobre tempos pré-históricos: Cécile Aubry é um nome oriundo de um mundo que deixou de ser o nosso. Um mundo muito mais simples, em que uma tarde de Verão podia ser preenchida a ler exemplares da revista Tintim, romances como O Príncipe e o Pobre, de Mark Twain, ou as narrativas desta mulher que abandonou o cinema para encantar a minha geração com histórias de miúdos e dos respectivos animais de companhia. Histórias de um mundo ainda sem computadores que deixaram um rasto de ternura imune à erosão do tempo e à voracidade de todas as modas.»

WTF???

Cristina Torrão, 30.07.20

O líder do PSD admitiu conversações com o Chega com vista a entendimentos eleitorais.

O Chega também só aceitará conversar com um PSD que aceite ser oposição à séria e não a dama de honor do governo socialista.

Além de admitir conversações, Rui Rio dá tamanho protagonismo a esse liderzeco de partidozeco, machista e racista de pacotilha? Dá-lhe espaço para impor condições?

Pedro Correia, fala, ali mais em baixo, na honra perdida do PSD. À honra, eu acrescento uma votante. Porque, no dia em que houver entendimentos destes, eu deixo de votar PSD! Podem dizer-me que o meu voto de nada vale. Mas, para mim, é uma questão de honra e declaro-o neste blogue, no qual não me faltam testemunhas: deixarei de votar no único partido em que, até agora, votei!

Deslocar-se de forma mais sustentável

Cristina Torrão, 30.07.20

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Completei os primeiros 1000 Km com a minha eBike, quinze meses depois de a ter adquirido.

Primeiro, uma pequena explicação sobre o modo de funcionamento da bicicleta. Não anda sozinha, isto é, sem pedalar, não saio do sítio (a não ser num declive). O motor eléctrico acciona por iniciativa própria e só em caso de necessidade, ou seja, numa descida, ele desliga sempre e, numa rua plana, raramente se acciona. Tudo depende do nível de ajuda que escolho. Tenho quatro níveis à disposição e ando 90% do tempo no nível mais baixo, o eco, conseguindo, por cada carregamento de bateria, cobrir distâncias de até 120 Km. Em qualquer dos níveis, o motor só me ajuda até aos 25 Km/h (já atingi velocidades de 30 Km/h, mas em descidas, quando o motor desliga).

A bateria é uma Bosch Power Pack 500. A energia necessária para um carregamento, e que me permite andar os tais 120 Km, é a equivalente à usada para ferver cinco litros de água. Não sei dizer quantas vezes pode ser recarregada, mas, segundo o fabricante, chega para dar volta e meia ao planeta. Além disso é susceptível de ser reciclada, tendo eu, para isso, de a entregar numa loja de bicicletas.

Trata-se de uma bateria de lítio, cuja extracção acontece, muitas vezes, em condições catastróficas. Além disso, implica emissões de CO2, tanto na fabricação, como nos carregamentos. Por outro lado, e incluindo coisas tão necessárias como a alimentação e o vestuário, não conseguimos viver sem poluir. E, neste nosso mundo globalizado, fugir a produtos conseguidos através de trabalho em condições de escravidão é praticamente impossível. Seria necessária muita vontade política e o ser humano teria de controlar a sua ganância, o que, pelos vistos, representa um sacrifício incomportável.

Enfim, importante, para mim, é tentar poluir o menos possível. Segundo dados do Ministério do Ambiente alemão, andar de automóvel implica ser responsável por emissões 40 vezes superiores às de uma eBike. Estes dados baseiam-se em cálculos de que metade das deslocações de automóvel, neste país, ficam aquém dos 5 Km. Os custos são igualmente muito inferiores. Para um automóvel ligeiro, incluindo combustível, seguro, impostos e parqueamento, eles comportam uma média de 12 € por 100 Km; com a eBike são 0,25 € - estes dados constam da brochura “Bosch eBike Systems / DE”. Nunca me debrucei sobre o assunto, mas alguém me poderá dizer se a indústria do petróleo não implica trabalho infantil e/ou escravo?

Uma bicicleta destas é, assim, uma óptima alternativa ao carro, em deslocações citadinas. Não se pode comparar o número de decibéis causados pelo meu motor eléctrico com o de um motor de combustão. Além disso, não empesto o ar nas minhas deslocações. Não sei se haverá alguém que goste do cheiro dos escapes e das fumarolas por eles libertados. Eu detesto e já constatei que o uso da máscara em parques de estacionamento cobertos, por exemplo, não é apenas útil para minimizar o contágio do Coronavírus. Claro que também ando de carro, mas, para fazer compras pequenas (que caibam no cesto da bicicleta), para ir ao café, ao médico, ou nos tempos livres, nem hesito em usar a bicicleta. Enfim, em pouco mais de um ano, já evitei 1000 Km de carro, dentro da minha cidade.

E porque tem de ser eléctrica? Tive sempre bicicletas normais, até comprar esta, em Abril do ano passado. Já sentia bastantes dificuldades em vencer subidas, o que me tirava a vontade de usar este meio de locomoção. Quem já não tem a força da juventude, usa, muitas vezes, este argumento para não andar de bicicleta. E que dizer de pessoas com certas doenças ou outras incapacidades? Ora, uma eBike permite a pessoas com limitações de vários tipos uma forma de deslocação saudável e mais sustentável. Para todos os outros aconselho as bicicletas normais.

A honra perdida do PSD

Pedro Correia, 30.07.20

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Foto: Filipe Farinha / Lusa

 

Rui Rio prepara-se para accionar disciplinarmente os sete deputados do PSD que ousaram votar contra o vergonhoso pacto com o PS para trocar a presença quinzenal obrigatória do primeiro-ministro na Assembleia da República por deslocações bimestrais de Sua Excelência ao hemiciclo.

Tão vergonhoso foi esse pacto que 28 deputados socialistas também votaram contra, incluindo vários ex-ministros e ex-secretários de Estado: Ana Paula Vitorino, Ascenso Simões, Bruno Aragão, Capoulas Santos, Carla Sousa, Cláudia Santos, Eduardo Barroco de Melo, Fernando Anastácio, Filipe Neto Brandão, Francisco Rocha, Hugo Oliveira, Isabel Moreira, Joana Sá Pereira, João Paulo Pedrosa, Jorge Lacão, José Magalhães, Marcos Perestrello, Maria Begonha, Marta Freitas, Miguel Matos, Nuno Fazenda, Olavo Câmara, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Sérgio Sousa Pinto, Sónia Fertuzinhos, Susana Correia, Tiago Barbosa Ribeiro, Tiago Martins. E cinco abstiveram-se: António Gameiro, Diogo Leão, Elza Pais, Rosário Gamboa e Pedro Delgado Alves. Além dos representantes de todas as restantes bancadas parlamentares - BE, PCP, CDS, PAN, PEV, IL e Chega.

 

A diferença entre as duas metades do bloco central é que os socialistas dispuseram da liberdade de voto que Rio cerceou na bancada laranja - apesar de só o PS ser partido de governo e a alteração agora introduzida ao regimento da Assembleia da República apenas beneficiar o primeiro-ministro enquanto lesa os direitos da oposição parlamentar da qual nominalmente o PSD ainda faz parte.

Assistimos, portanto, a este facto extraordinário: enquanto se comporta como serviçal do Governo, Rio dirige a sanha persecutória contra os sete rebeldes do seu próprio partido que agiram em consciência quando se insurgiram contra a honra perdida do PSD no momento da votação - entre eles o novo líder da JSD, Alexandre Poço, e a líder cessante, Margarida Balseiro Lopes.

Procura assim, com esta absurda ameaça de processos disciplinares, quebrar os últimos vestígios de dissidência no grupo parlamentar: 

 

Marcelo Rebelo de Sousa poderia dizer-lhe como se dirige um partido tolerando a autonomia de decisão dos deputados. Quando o actual Presidente da República liderava o PSD, as bancadas socialista e comunista tomaram a iniciativa de apresentar projectos de lei que ampliavam as circunstâncias legais da prática do aborto. Marcelo era contra, tal como a esmagadora maioria dos parlamentares do PSD. Mas não houve disciplina de voto nem monolitismo. Assim, no momento da votação, três deputados - José Pacheco Pereira, José Silva Marques e Rui Rio -  divergiram do líder sem recearem consequências disciplinares.

Foi em 1998. Rio não hesitou então em colidir com o presidente do partido enquanto deputado. Mas agora, na posição que Marcelo ocupava há 22 anos, procede precisamente ao contrário. Prestando assim mais um favor aos socialistas: o de os distinguir, por contraste, como campeões da liberdade individual. 

Um favor que António Costa nem sequer se dará ao incómodo de lhe agradecer.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 30.07.20

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Ana Cláudia Vicente: «Um mergulho sob as cascatas da Misarela. Um bocado de história em Marialva. Caminhadas por São Jacinto. Um gelado na Emanha. Bailarico no Pinhal. Arroz malandrinho na Comporta. Uma romaria na Idanha. Uma noite em Marvão. Um poejo ou um medronho, algures entre Almodôvar e Odemira. Lapas acabadinhas de apanhar em São Jorge.»

 

Leonor Barros: «Sofrer devia ser proibido.»

 

Margarida: «Os anos oitenta passaram (a sério, eu sei), os anos noventa também, chegamos a 2010 e o Morrissey faz concertos no Poceirão, o cubo mágico é electrónico, o top mais foi substituido pela MTV, Prince cantou numa praia, os Europe venderam o cabelo para extensões e foram trabalhar para o talho do sogro, Samantha Fox anda com afrontamentos, o nosso cabelo não é à tigela mas o espetado já não se usa, Bryan Adams? quem é esse tipo?»

Higiene visual e auditiva

Pedro Correia, 29.07.20

 

Durante anos recebemos no sossego do lar o entulho verbal de cartilheiros, muitas vezes ligados ao cordão umbilical de clubes desportivos e agindo como marionetas destes, poluindo as pantalhas com os seus gritos histéricos, o seu sectarismo patológico e a sua desonestidade intelectual. E a coisa, pelos vistos, até rende para além do reduto da bola: um desses pantomineiros, por sinal um dos mais sabujos, é hoje deputado da nação e lidera um putativo partido político.

Numa decisão que só peca por tardia, o director de informação da SIC acaba de pôr cobro a esta desbunda anunciando que deixará de dar tempo de antena aos chamados comentadores de cachecol, convocados para as diatribes em estúdio apenas por revelarem total falta de isenção. Esta medida de elementar higiene visual e auditiva não tardou a ser secundada pela direcção de informação da TVI, agora em início de funções.

 

Tudo bem. Questiono-me apenas se este gesto profiláctico não deveria ter sido assumido em primeiro lugar pela RTP, empresa estatal de televisão e rádio - e, portanto, com especiais responsabilidades, nomeadamente na não-discriminação de emblemas clubísticos nos seus painéis de comentário sobre futebol. Recordo-me que entre os bitaiteiros de cachecol com lugar cativo na RTP já figurou o actual presidente da Câmara do Porto, aliás protagonista de um contundente "abandono em directo" entre gritaria que terá congregado grande audiência.

Motivo acrescido para a minha interrogação: ao privilegiar os chamados "três grandes", ignorando todos os outros emblemas desportivos, a vetusta empresa de comunicação televisiva paga com o dinheiro dos nossos impostos entra em colisão com os princípios de serviço público. O mesmo se passa com a Antena 1 no plano radiofónico.

Mais vale tarde que nunca. Eis chegado o momento de perguntar se a Direcção de Informação da RTP tenciona seguir o bom exemplo agora posto em prática por dois canais privados ou se vai manter tudo na mesma, fingindo que nada tem a ver com este filme.

Uma decisão pouco cristã

Sérgio de Almeida Correia, 29.07.20

Sobre o que aconteceu com o académico Éric Sautedé deu-se oportunamente conta, há mais de seis anos, em O regresso da idade das trevas, O regresso da idade das trevas (2) e O regresso da idade das trevas (3).

Ontem, Peter Stilwell prestou declarações no âmbito do processo judicial ainda em curso na primeira instância (não é só em Portugal que a justiça é lenta e tardia).

Entre outras coisas revelou que "o despedimento do académico Éric Sautedé da Universidade de São José (USJ) foi sem justa causa", que "não houve nenhum processo disciplinar", "nem [há] qualquer dúvida sobre o bom comportamento de Éric Sautedé enquanto professor".

Não vou comentar as suas declarações, nalguns pontos bastante discutíveis, mas registo o seu acto de contrição e a honestidade do depoimento, que só confirmou o que todos sabiam e não houve na altura coragem de dizer. 

Qualquer que venha a ser a decisão final, uma coisa é certa: a vergonha e o sofrimento infligidos ao visado e à família, com filhos menores e obrigados a mudarem de vida e de local de residência, jamais terá reparação.

E tudo isso, o despedimento e o que se lhe seguiu ao longo destes anos, independentemente da ilegalidade e de outras considerações que se possam tecer sobre a liberdade académica e a liberdade de expressão, ou o injustificável, foi muito pouco cristão, o que não se pode deixar de lamentar, mais a mais vindo de quem veio.

O tempo apaga muita coisa, é verdade, mas não apaga a dor, nem o erro.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 29.07.20

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João Carvalho: «Não deve dizer-se que o bispo do Porto foi perseguido e exilado de facto e menos ainda que isso ocorreu em 1958/59. Na verdade, o plano foi mais bem urdido: esperaram que ele fosse ao estrangeiro e criaram uma teia artificial de dificuldades administrativas na fronteira para impedir a sua reentrada em Portugal. O afastamento do bispo durou uma década, mas foi em vão que o Estado Novo pressionou a Igreja para que o substituísse na diocese do Porto.»

 

José Gomes André: «"A verdade vem sempre ao de cima", diz-nos Sócrates. Certamente... Basta aliás estar atento às notícias da sucessiva incapacidade da justiça para punir criminosos reconhecidos como Valentim Loureiro, Pinto da Costa ou Isaltino Morais, entre outros. Significa isto que Sócrates é culpado de um acto ilícito? Não. Tal como não significa que é inocente de qualquer acto ilícito apenas porque o Ministério Público foi incapaz de apresentar prova ou porque o tribunal assim o determinou.»

 

Luís M. Jorge: «O Galambinha tem razão: aquele assunto do Freeport está completamente esclarecido.»

 

Eu: «Não sei a que textos em concreto alude João Galamba, por interposto militante socialista da Amadora, para sustentar em abstracto que este blogue devia pedir desculpa ao primeiro-ministro. Será este, em que sublinho a presunção de inocência de José Sócrates enquanto aproveito para lembrar aos mais esquecidos que o actual chefe do Governo ascendeu a secretário-geral do PS na sequência de acusações não comprovadas contra o antecessor, Eduardo Ferro Rodrigues, numa clara demonstração de que a política tem horror ao vácuo? Será este, em que refiro a necessidade de explicações do primeiro-ministro, reafirmando a sua presunção de inocência?»

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