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Delito de Opinião

Novas fogueiras na escuridão

Pedro Correia, 03.08.19

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Fotograma (censurado) de Noites Escaldantes: toda a nudez é hoje castigada

 

No momento em que escrevo estas linhas, Woody Allen filma em San Sebastián, no País Basco espanhol, após um ano de inactividade total: 2018 foi uma folha em branco no seu extenso percurso artístico.

Regressa timidamente ao exercício da profissão que o apaixona, muito longe do seu país natal. Mesmo assim, entre críticas duríssimas, vindas da chamada vox populi, à «indecência» do seu comportamento, não faltando quem lhe chame «pervertido» ao vê-lo passar e quem grite contra a «publicidade negativa» que isto trará à cidade, afugentando turistas.

Um quarto de século depois, continua acusado não na justiça verdadeira, mas nos pelourinhos de rua. Motivo: um alegado crime de natureza sexual que jurou sempre não ter cometido e baseado em supostos factos jamais comprovados não apenas na investigação judicial mas também na exaustiva e minuciosa investigação jornalística que a acompanhou.

À falta de verdade, bastou o boato: um dos mais prestigiados cineastas de todos os tempos foi condenado ainda em vida à morte civil, apedrejado nos mais diversos recantos do planeta, impedido de exercer direitos básicos - começando pelo direito ao trabalho. Mesmo assim, com admirável tenacidade, o criador de Annie Hall, Manhattan e Hannah e as Suas Irmãs tenta agora regressar à tona de água, aos 83 anos, combatendo um novo maccartismo - desta vez já não de explícita natureza política, mas sexual.

 

Allen deixou de poder estrear um filme todos os anos: o último que rodou, A Rainy Day in New York, foi adquirido e confiscado pela Amazon, que o manteve em armazém, tornando-o invisível: é um crime de lesa-arte, mas muitos sectores aplaudem o crime, como se fosse um acto heróico. Concluído em 2017, nunca entrou no circuito comercial. O realizador teve de lutar em tribunal para adquirir em nome próprio o direito de exibição em território norte-americano, mas até ao momento não conseguiu encontrar sala de projecção: todos os exibidores receiam sofrer irreversíveis danos reputacionais. Por darem a mão a alguém que, como Woody Allen, ensinou milhões de pessoas a ver, a ouvir (muitos espectadores escutaram pela primeira vez Louis Armstrong e Ella Fitzgerald nos seus filmes) e a pensar.

Actores que interpretaram A Rainy Day in New York - incluindo o protagonista, Timothée Chalamet - apressaram-se a anunciar, alto e bom som, que entregariam o salário a organizações feministas. Como se Allen tivesse peste, um coro orquestrado de actrizes e actores ergueu-se em orgástica condenação daquela alma demoníaca que havia desencaminhado uma enteada no remanso do lar - tomando o rumor como facto, negando o contraditório ao cineasta e apontando-lhe a espada justiceira. De pouco ou nada valeu lembrar que ao longo de meio século de actividade nunca o realizador foi alvo de qualquer queixa por conduta imprópria da parte de qualquer actriz, principal ou secundária.

Não tardou um olhar "revisionista" da obra integral do cineasta, passada a pente fino pelos novos censores morais que nela descobriram inúmeros indícios de pedofilia, agravados pelo impenitente machismo que lhe marca o conteúdo e a forma, antes tão incensadas pela "vanguarda" intelectual novaiorquina.

 

Woody_Allen_at_San_Sebastian_Filmfestival_2008[1].Woody Allen em San Sebastián: insultos e solidão 50 filmes depois

 

Um cineasta que não consegue estrear os filmes. E também um escritor que não consegue editar os livros: até ao momento, nenhuma chancela editorial mostrou interesse em publicar-lhe a autobiografia entretanto concluída: a estridente pressão dos movimentos neopuritanos grita mais alto, condicionando não apenas o acto criador mas toda a expressão pública de simpatia por quem ouse remar contra os novos dogmas.

Imagino um Vladimir Nabokov - que lançou a sua imortal Lolita em 1955, na Europa, após cinco temerosas editoras norte-americanas lhe terem devolvido o manuscrito e só viu o livro impresso nos EUA três anos mais tarde - nos nossos dias: seria alvo de um implacável linchamento moral, sem apelo nem agravo, condenado a expiação eterna.

Imagino um Nelson Rodrigues na actualidade: banido da escrita jornalística, impedido de divulgar os seus folhetins, proibido de encenar as suas peças teatrais em nome do histriónico combate ao «heteropatriarcado», à perpetuação dos «estereótipos de género» e à «coisificação» da mulher. Imagino actrizes que interpretaram filmes inspirados na dramaturgia do autor de Toda Nudez Será Castigada - como Darlene Glória, Vera Fischer, Sonia Braga, Lídia Brondi e Christiane Torloni - a repudiarem aqueles temas e aqueles textos com gestos de indizível horror.

 

Nesta atmosfera de convento proibicionista, povoado de façanhudas madres superioras, as cenas de sexo são abreviadas ou mesmo suprimidas. Filmes que geraram furor nos anos 80, como Atracção Fatal, Noites Escaldantes e O Carteiro Toca Sempre Duas Vezes, seriam hoje rejeitados como infâmia. A nudez tornou-se residual - e quase interdita aos corpos femininos, evitando assim despertar a concupiscência de machos trogloditas, passe a redundância. Tornou-se moda corrente "pixelizar" seios nus para antecipar as tesouras censórias em patrulha permanente às redes sociais.

A "indústria do entretenimento" norte-americana passou a incorporar novas brigadas fiscalizadoras, inspiradas no defunto Código Hays e agora designadas «coordenadoras da intimidade», zelando para que nenhuma actriz sinta o mais leve incómodo sob as ordens de um realizador no cinema ou na televisão. Um Fellini ou um Bergman dos nossos dias veriam as respectivas carreiras abortadas à nascença. Já para não falar num Hitchcock.

 

Enquanto escrevo estas linhas, um cineasta de 83 anos - outrora prestigiado - filma no País Basco, longe da cidade natal que ajudou a projectar como ícone planetário. Demorou quase dois anos reunir financiamento mínimo para retomar a arte que sempre o apaixonou. A Rainy Day in New York - o seu 50.º filme - continua aferrolhado pela Amazon: a milionária multinacional considera que o lançamento da película poderia causar «danos de imagem» à sua marca.

São tempos duros: os novos empestados, como ele, ardem na fogueira sem lhes ser reconhecido o exercício do contraditório. Ou, se o fazem, ninguém os escuta. Porque estão condenados à partida. E não há recurso da sentença.

O mais penoso e lamentável é que tudo isto se passa na liberalíssima América, não num obscuro Estado totalitário.

 

Leitura complementar:

Este filme acaba sempre mal (19 de Janeiro de 2018)

O apedrejamento de Woody Allen (20 de Janeiro de 2018)

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 03.08.19

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Ana Margarida Craveiro: «Em Portugal não existe corrupção, isso é teoria de mentes mal-intencionadas que gostam de jogar lama sobre o bom-nome dos outros. Aqui, ninguém salva contas, ou recheia contas; todos salvam o seu país, todos os dias, conquanto não lhes falte o fôlego. E nós, salvos pela bondade alheia, agradecemos, votando depois feitos carneirinhos, porque afinal aquela permuta de terrenos, aquele parque de estacionamento, aquele dinheirinho para os balneários até nos dá algum jeito.» 

 

J. M. Coutinho Ribeiro: «A questão que deixo (a algum especialista em direito administrativo em serviço) é esta: a perda de mandato [de Isaltino Morais] refere-se a que mandato? Àquele durante o qual os factos imputados foram praticados (e que já lá vai)? Ao presente? Ao que eventualmente correr quando a decisão transitar em julgado? E quais são os efeitos dessa perda de mandato na elegibilidade do homem em mandatos seguintes?»

 

Eu: «O PS bem podia ter pedido ao Presidente da Bolívia, aliado indissolúvel de Hugo Chávez, uma ajudinha para a elaboração do seu programa eleitoral. Em vez do cheque mixuruco de 200 euros para "incentivar a natalidade", é bem preferível a medida já anunciada por Evo Morales: "A todo o casal que se casa o Estado tem que dar uma casa." Isto sim, é o verdadeiro socialismo. Mal soam os primeiros acordes da marcha nupcial, ganha-se o acesso à chave da residência. É fácil (para quem promete), é barato (para quem recebe) e dá milhões (aos fabricantes de tijolos e às empresas de construção civil). Desde que no fim não apareça um daqueles chatos neoliberais a perguntar quem é que paga a factura.»

60 anos de Pedro Ayres de Magalhães

jpt, 02.08.19

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Anteontem, quarta-feira 31 de Julho, Pedro Ayres de Magalhães fez sessenta anos. Um mero aniversário, uma alheia idade redonda, poder-se-ia dizer. Mas este tem um significado especial, anuncia que a minha geração passou assim, oficialmente, a sexagenária. Pois se Pedro Ayres nunca foi um "homem da frente" - o "front man" da mística rockeira - foi, de facto, o "homem do leme" da geração subsequente ao 25 de Abril. Não me vou por aqui a botar sobre ele: nem o conheço pessoalmente nem sou especialista em música. Mais vale escutá-lo (entrevista radiofónica) ou lê-lo (entrevista à revista Sábado; entrevista ao jornal i). Dizem-me que Edgar Pêra sobre ele fez um filme, mas ainda não vi.

Fico-me pelo registo: um tipo que andou na linha da frente do punk em Portugal (aqui deixo ligação para "Bastardos", um documentário sobre o punk português), desde os seus Faíscas, e seguindo para o grupo iconoclasta Corpo Diplomático. Eram tempos bem diversos - e aconselho mesmo as suas entrevistas, para se entender em particular o universo rural com que estes urbanos se deparavam, o tão diferente país de então, ainda espartilhado e sofrendo as mágoas das guerras coloniais recém-findas. Depois foi a alma-mãe dos Heróis do Mar, que tantos disseram - e continuariam a dizer, se se lembrassem de efemérides ou similares - como fascistas: quando de facto os Heróis anteciparam os anos 90s, esses que só terminaram em 2004, o reencontro do país Portugal consigo próprio e a sua celebração, passada que fora a era do país pária. Uma nação, história e identidade que comemoravam - mesmo que hoje o seu som surja imensamente datado, como "pop" que era -, enquanto também cantavam "este país é uma prisão", no afã de pontapear o provincianismo então hiper-dominante, sufocante mesmo. É certo que os hinos que ficaram dessa era foram os dos Xutos mas a atitude que frutificou nesses anos 1980s foi, em parte - e tão bom seria que mais tivesse sido -, a dos Heróis. Entenda-se, a de Pedro Ayres. 

Muito se celebra agora António Variações, feito ícone. Convirá então lembrar que foi Ayres de Magalhães (e o seu quase constante parceiro Carlos Maria Trindade) que lhe produziu o disco final. Como ainda foi ele que, através do Resistência, congregou repertórios e músicos - não só de diferentes estilos mas, algo tão difícil naquele tempo de cesuras constantes, também de diferentes aparências políticas. Assim concertando Portugal. Depois foi ele o verdadeiro Pigmalião do Madredeus, esculpindo não só a cantora mas também repertório e trajecto. E com este internacionalizando a música popular portuguesa, reabrindo caminhos (que décadas antes Amália havia percorrido sem deixar sucessores), os quais vieram depois a ser seguidos, ainda que sem o seu brilho, por artistas como Mariza ou Dulce Pontes. 

É um trajecto musical fantástico, feito sem cedências ao meios dominantes, muito radicado num individualismo - meritocrático, parece-me. É diante disto que continuo a repetir, Ayres de Magalhães é o homem da nossa geração que maior impacto cultural teve no país. Tem tido. A alumiar. Obrigado. Parabéns. Que venham mais anos, com saúde e sucessos.

 

 

 

 

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 02.08.19

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Jorge Assunção: «Se há ponto importante a garantir nas próximas eleições é que o governo eleito não dará seguimento a qualquer política de grandes obras públicas. Entre um PS pró-obras públicas e um PS anti-obras públicas (e por obras públicas, refiro-me às grandes obras públicas que endividam o país por anos), a vitória do segundo sobre o primeiro é um imperativo nacional. O que já não estou tão certo é que exista um PS anti-obras públicas em Portugal.»

 

Eu: «Na Quadratura do Círculo nunca teve assento qualquer representante do PCP e do BE, forças políticas que nas últimas europeias somaram 21% dos votos. É reconfortante saber que os "residentes" no programa convivem bem com isto.»

Greves

José Meireles Graça, 01.08.19

Para as férias, a começar a 14 de Agosto, as autoridades do lar haviam planeado um périplo pelo Alentejo durante uns quantos dias e término na Meia Praia, em Lagos, um local abençoado onde se pode andar a pé umas horas enquanto se miram os concidadãos e os bifes estendidos ao sol sem resguardo, com o incompreensível propósito de adquirirem uma tez de lagosta cozida e, com azar, cancro na pele.

Quanto ao périplo, kaput. Que pode acontecer que as gasolineiras estejam fechadas, por causa da greve dos motoristas, e portanto é mais avisado ir por Zamora, Tordesilhas, Toledo, Mérida e o mais que se verá. Não é impossível que o problema se resolva até lá, mas nunca fiando.

Parece que quase metade dos portugueses não pode pagar uma semana de férias fora de casa, o que significa que mais de metade pode. E a metade privilegiada quer, e conseguirá se o Governo arranjar maneira de comprar a aquiescência dos sindicatos e o beneplácito dos patrões, que não lhe falte o gasóleo para o carrinho, um perigo que tem comovido o país.

Metade é muito. Muito mais do que os doentes e cidadãos que as greves dos médicos e enfermeiros, ou dos juízes, afectam. E isso explica o empenho e o nervoso das autoridades.

Um nervoso hipócrita e eleiçoeiro. Porque os veraneantes não merecem mais respeito do que os doentes ou os carentes de justiça. Assim não entende o ministro da Economia, que vem defender a revisão da Lei da Greve agora, coisa que nunca antes fez e só é possível comprando uma briga com comunistas e esquerdistas sortidos, os mesmos sem cujo apoio Siza não seria ministro (o que, aliás, seria um benefício quase tão grande como o de o ministério nem sequer existir com as atribuições que tem, mas não cabe aqui explicar).

Quanto à greve em si, não sei para que lado caio porque os senhores jornalistas estão do lado dos camionistas quando detestam o governo, poucos, ou do lado dos patrões porque o amam, muitos, mas não fornecem resposta a duas perguntas: i) As empresas de camionagem podem todas, ou sequer a maior parte, pagar o que lhes é exigido sem risco de falência? ii) Os patrões podem repercutir o aumento dos custos nos preços sem que isso beneficie seriamente a concorrência estrangeira, se existir, e as grandes empresas em detrimento das pequenas?

Depois, é uma tentação simpatizar com estes grevistas porque são de um modelo novo: não dependem do bolor da CGTP ou da UGT; fazem-se representar por um advogado com um discurso articulado, sem os bordões enjoativos da classe trabalhadora, do patronato e da exploração – quando usam as mesmas palavras é no sentido corrente e não marxista e fóssil; e são genuinamente teimosos, sem que se suspeite que sejam meros peões para o velho jogo do PCP de conseguir mais poderes, e vantagens, do que as que os votos lhe dão.

Já com as greves dos enfermeiros o sentimento era igual: são genuinamente combativos e, com razão ou sem ela, a exigência das funções casa mal com a pobreza dos vencimentos. E a perseguição à bastonária é simplesmente um asco: a acusação de “envolvimento em atividade sindical” poderia com igual propriedade aplicar-se à Ordem dos Médicos, cujos bastonários nunca hesitaram em defender sindicalmente os associados, ou à Associação Sindical dos Juízes Portugueses, cuja hipocrisia começa no nome capcioso para cobrir pudicamente um sindicato. (Que, pessoalmente, ache que a actividade sindical deveria estar vedada aos juízes, como está aos militares, e que as Ordens de criação recente nem sequer deveriam existir, não tira nem põe nada ao raciocínio – pertence a outra categoria de assuntos).

Os interesses dos grevistas opõem-se aos dos patrões, mas não devem opor-se com carácter universal aos da comunidade. E num conflito seria portanto desejável que apenas aqueles resultassem prejudicados, ainda que, por ser inevitável, também sejam causados danos a terceiros. Mas isto não é a mesma coisa que aceitar a ofensa de bens que só o Estado pode garantir, como é o caso da Saúde, da Segurança, da Justiça ou da livre circulação de pessoas e bens.

Isto quer dizer que a Lei da Greve precisa de ser revista, sim. Não no sentido de anular o direito à greve, de resto constitucionalmente protegido para trabalhadores por conta de outrem, nem no de o constranger de tal modo que o seu exercício resulte na prática impossível. Mas no de o casar melhor com interesses com pelo menos igual força.  Se isso significar a criação de desigualdades em direitos para trabalhadores que calhe estarem em sectores que afectem o conjunto da população, paciência. Não consta que os funcionários públicos, que jamais são despedidos por falência do empregador, sejam postos na rua por o desemprego aumentar no sector privado, o que significa que há esta, e inúmeras outras, diferenças de estatuto consoante o sector em que o acaso, ou a escolha, colocaram cada qual.

É que não é a mesma coisa um, ou dois, ou três, hospitais entrarem em greve ao mesmo tempo, e fazerem-no quase todos; uma, ou duas, ou três empresas de transporte de combustíveis e todas ou quase. E como quem decide do interesse público, em termos executivos, é o Governo, que é aliás também julgado por isso, precisa de ter meios legais ao seu alcance.

O ministro Siza (que, entretanto e previsivelmente, já se desdisse, metendo os pés pelas mãos como o homúnculo político que efectivamente é) esteve originalmente bem. E é decerto irónico que seja um responsável, ainda que menor, do PS a querer mexer nesta vaca sagrada do direito à greve. Não parece que vá suceder, claro, que no Rato têm um medo que se pelam ao berreiro dos comunistas e primos, para não falar dos esquerdistas sortidos que enxundiam o espaço da opinião, como Pacheco Pereira, Daniel Oliveira e outros vultos do asneirol.

Mas lá que pareceu, por um momento, que Deus estava a escrever direito por linhas tortas – pareceu.

Muito bem, Alemanha!

Cristina Torrão, 01.08.19

A Alemanha recusou tomar parte na “Operation Sentinel” de Trump, no Estreito de Ormuz. Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros alemão declarou estar fora de questão seguir a estratégia de confrontação dos EUA, que pode levar a uma escalação perigosa do conflito (link em alemão). O governo alemão continua a considerar a via diplomática como a melhor forma de lidar com o problema.

Apoio a posição da Alemanha que visa, acima de tudo, preservar a união europeia e distanciar-se da linha conflituosa de Trump. Com Boris Johnson, a Grã-Bretanha mudou de estratégia, deixando de apelar a uma acção conjunta europeia, para se pôr sob a protecção dos EUA. Este país, no entanto, solicitou a colaboração alemã, numa óbvia tentativa de forçar a Europa a dançar sob a sua batuta (e a dividi-la). Esteve bem o governo alemão, ao declarar que, não chegando a diplomacia, a Alemanha só admitirá o envio de forças militares para o Estreito de Ormuz numa acção conjunta europeia, dispensando o comando norte-americano.

Contra o código genético do PSD

Pedro Correia, 01.08.19

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Outros tempos: Santana, Ferreira Leite, Durão e Rio (Dezembro de 2001)

 

Durão Barroso venceu o congresso de Viseu em 2000, contra Pedro Santana Lopes e Luís Marques Mendes - um congresso muito dividido e disputado. O passo seguinte era unir o PSD, estendendo pontes para os dois derrotados. Foi o que Durão fez, com um balanço largamente positivo: Santana avançou como candidato do partido à Câmara de Lisboa, que venceu em Dezembro de 2001, e Mendes encabeçou a lista eleitoral laranja pelo distrito de Aveiro às legislativas de Março de 2002, ganhas pelos sociais-democratas. A mensagem de unidade interna dada por Durão Barroso favoreceu assim o PSD em dois combates eleitorais.

 

Pedro Passos Coelho venceu a eleição interna no partido em Março de 2010, derrotando por larga margem as candidaturas adversárias protagonizadas por Paulo Rangel e José Pedro Aguiar-Branco. O seu primeiro gesto, mal ascendeu à presidência dos sociais-democratas, foi apaziguar as hostes adversárias, convidando os antagonistas da véspera para os órgãos nacionais. Assim, a convite dele, Rangel encabeçou a lista ao Conselho Nacional do PSD e Aguiar-Branco presidiu à comissão formada para rever o programa do partido. No ano seguinte, com Passos na liderança não só do partido mas já também do Governo, o segundo assumiu o cargo de ministro da Defesa enquanto o primeiro se manteve como deputado europeu, recandidatando-se em 2014 com o apoio expresso de quem o derrotara quatro anos antes.

 

Nesses tempos de progressão eleitoral e política do partido laranja tudo decorreu desta forma. Agora, com outra liderança e outras cabeças a definir a estratégia para as legislativas de 6 de Outubro, todos os sinais vão no sentido oposto: fragmentar em vez de unir, congregar fiéis em vez de estimular o pluralismo interno que faz parte do código genético do partido fundado por Francisco Sá Carneiro. Como se este PSD de Rui Rio mimetizasse os velhos movimentos da extrema-esquerda, que iam purgando dirigentes e militantes em nome da pureza ideológica e da estrita obediência à voz de comando.

Estamos em plena contagem decrescente: faltam 66 dias para conhecermos o resultado de tão brilhante estratégia.

A seriedade não se legisla

Tiago Mota Saraiva, 01.08.19

Imagine o leitor que o pai de quem vos escreve era empresário e que fazia a sua vida a fornecer e instalar cadeiras de auditório. Muito provavelmente mais de 70% do seu negócio seria com o Estado o que, de acordo com o Código de Conduta que o governo aprovou, me tornaria inelegível para as funções de Secretário de Estado das Pescas. Imagine agora que eu estou desavindo com a minha filha, que não conversamos há anos, para aceitar qualquer cargo num governo com este Código de Conduta, teria de refazer relações para perceber o que faz ela e a sua família mais próxima de modo a cumprir com tranquilidade as minhas funções públicas.
Entenda-se uma coisa, o problema das relações familiares promíscuas não se resolve com legislação ou códigos de conduta mas com a escolha de pessoas sérias para os lugares. Não tem problema nenhum que o meu pai continue a vender cadeiras de auditório se eu não tiver qualquer influência na sua escolha. Legislar sobre a ética republicana ou sobre a seriedade das pessoas é terreno fértil para a trafulhice pois dá a matriz para quem quer fintar o sistema e tem tendência a misturar na lama quem desempenha as suas funções com seriedade e verticalidade.

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 01.08.19

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André Couto: «Joana Amaral Dias foi sondada, felizmente. Orgulho-me que o Partido Socialista esteja activo na busca de mais-valias independentes na sociedade civil. JAD apoiou Mário Soares contra o candidato do seu partido, foi excluída da Mesa Nacional e raramente tem sido vista como rosto do Bloco de Esquerda. Há mal que seja sondada para integrar as listas do Partido Socialista?»

 

João Carvalho«A ideia peregrina de pagar 200 euros por cada rebento não incentiva a natalidade, mas antes premeia a banca, que passaria a receber um bónus anual que só ela pode utilizar durante 18 anos. Passado esse tempo, a importância libertada talvez desse para suportar um almoço em família.»

 

Leonor Barros: «José Sócrates não partilha a opinião de Valter Lemos, já que admite que "existem 'discrepâncias' entre o decreto regulamentar e as disposições contidas no Estatuto da Carreira Docente". Resta saber o que pretendem fazer relativamente às “discrepâncias", já que o modelo transitório foi prolongado por mais dois anos e que quando o foi já havia "discrepâncias". Não constituem pois qualquer novidade. Foi o Governo de Sócrates que as criou e teima em manter. Entendam-se. Há um país cá fora à espera que se decidam. Em Setembro decidiremos nós.

 

Paulo Gorjão: «José Eduardo Moniz poderá rumar para a SIC. Essa, pelo menos, é a vontade de Francisco Pinto Balsemão que, aparentemente, tudo tem feito para o contratar. Se a transferência se concretiza ou não pouco me interessa, mas confesso a minha curiosidade em saber como evoluirá o namoro.»

 

Eu: «Pacheco Pereira, parceiro do candidato socialista à Câmara de Lisboa num programa semanal de comentário político, sente uma irreprimível nostalgia dos tempos em que a blogosfera política praticamente se resumia a ele próprio com exclusão de todos os outros.»

Entre os mais comentados

Pedro Correia, 01.08.19

Em 23 destaques feitos pelo Sapo em Julho, entre segunda e sexta-feira, para assinalar os dez blogues nesses dias mais comentados nesta plataforma, o DELITO DE OPINIÃO recebeu 18 menções ao longo do mês.

Incluindo três textos na primeira posição, três na segunda e um na terceira.

 

Os textos foram estes, por ordem cronológica:

O comentário da semana (36 comentários)

Xenofobia, misoginia, animalismo (78 comentários, segundo mais comentado do dia) 

Burrice apenas (60 comentários, segundo mais comentado) 

Instantes em sépia com capa de muitas dores (21) (48 comentários, terceiro mais comentado do dia)  

Mas as crianças, Senhor (78 comentários, o mais comentado do dia) 

Um postal cansado: El Salvador, Passos Coelho e o resto (30 comentários)   

A história da carochinha (52 comentários, segundo mais comentado)

Ler em férias (40 comentários)   

Arrefecimento global (40 comentários)  

Grandes romances (26) (40 comentários)

As ovelhas (30 comentários)

O País do trabalho sem direitos (156 comentários, o mais comentado do dia)  

Intolerantes face à intolerância (46 comentários) 

Que livros ainda nos falta ler? (132 comentários, o mais comentado do dia)

It's a steady job (32 comentários) 

Enganos académicos (15 comentários)  

A geringonça e a caranguejola (42 comentários) 

Centeno pode contar com Rio (40 comentários)   

 

Com um total de 995 comentários nestes postais. Da autoria da Maria Dulce Fernandes, do João Campos, do JPT e de mim próprio - além do nosso leitor Corvo, em estreia absoluta.

Fica o agradecimento aos leitores que nos dão a honra de visitar e comentar. E, naturalmente, também aos responsáveis do Sapo por esta iniciativa.

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