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Delito de Opinião

Já vai sendo tempo

Pedro Correia, 30.04.19

O Pedro Boucherie Mendes chama aqui a atenção para um facto que tem passado totalmente à margem dos titulares encartados do comentário jornalístico: vai agora fazer um ano, foram detidos cerca de 40 indivíduos ligados a claques do Sporting por terem invadido as instalações da academia leonina e agredido jogadores, funcionários e elementos da equipa técnica do clube. Repito: há quase um ano. Continuam em regime de prisão preventiva, ignorando ainda se serão deduzidas acusações contra eles, bem como a data em que poderão enfim submeter-se a julgamento.

Como adepto e sócio do Sporting, critiquei sem a menor reserva este inadmissível acto criminoso, que projectou pelos piores motivos o nome do meu clube além-fronteiras, com as imagens da invasão de Alcochete dando a volta ao mundo. Mas é inaceitável este abuso da prisão preventiva: sem acusação formal, todos estes indivíduos já cumprem pena. E cito o Pedro, justamente perplexo contra o tempo e o modo de funcionamento da justiça portuguesa: «Presos há quase um ano sem culpa formada, ninguém liga, ninguém quer saber. Podia ser uma série da Netflix, mas é aqui, em Portugal, com gente verdadeira. Fizeram mal em invadir Alcochete? Claro, mas digam-lhes quanto devem à sociedade. Um mês, um ano, 5 anos, 500 anos? O que for, mas digam-lhes. Já vai sendo tempo de a Amnistia, os partidos políticos e as mil e umas ONGs que vivem penduradas na indústria dos subsídios abrirem o bico.»

Sim, caramba, vai sendo tempo.

A integridade não se negoceia

Sérgio de Almeida Correia, 30.04.19

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Volvidos oito meses sobre a data em que de forma totalmente inusitada lhe foi comunicada, bem como ao seu ilustre colega Paulo Cabral Taipa, a não renovação do seu contrato de trabalho na Assembleia Legislativa de Macau, Paulo Cardinal veio finalmente quebrar o silêncio a que a si próprio se tinha imposto para deixar assentar a poeira, arrumar as ideias e começar a preparar o seu futuro e o dos seus.

Passado o imprescindível período de nojo, no mesmo dia em que o Presidente da República desembarcará em Macau, para um curta visita de cerca de 12 horas, é publicada a entrevista dada pelo insigne jurista e constitucionalista aos Jornais HojeMacau, Macau Daily Times e à TDM – Televisão de Macau (aqui um extracto apresentado no Telejornal de 28/04/2019).

Trata-se de um verdadeiro documento que deverá ser analisado com a devida atenção pelos titulares do poder político que têm a obrigação, indelegável, de fiscalizarem o cumprimento da Declaração Conjunta Luso-Chinesa sobre a Questão de Macau, tratado internacional que vincula Portugal e a República Popular da China, bem como lido à luz da Lei Básica da RAEM, a mini-constituição outorgada por Pequim.

Se dúvidas houvesse sobre a forma vergonhosa como os dois mais antigos e experientes assessores da Assembleia Legislativa de Macau foram afastados, elas ficam agora totalmente dissipadas e na primeira pessoa.

Paulo Cardinal volta a prestar um indiscutível serviço ao Direito de Macau, à RAEM e aos seus residentes, a Portugal e a todos os seus cidadãos, juristas, magistrados, advogados e assessores que aqui laboram, de modo digno, sério e frontal, tal como à R.P.C. e aos que neste país se preocupam com a vigência do "segundo sistema" e a sua imagem internacional.

E fá-lo com a elevação, a dignidade, a transparência e o carácter a que a todos habituou, durante cerca de três décadas, dando-nos mais uma prova de toda a sua grandeza e humildade.

Um exemplo que tem de ficar aqui registado. Porque a integridade dos homens decentes não é negociável.

 

Regresso à cristofobia, com o politicamente correcto a reboque

João Pedro Pimenta, 30.04.19

Nos dias que se seguiram ao horrível massacre do Sri Lanka, ou Ceilão - acho sempre que certas palavras ficam melhor em português - voltou à baila o assunto das perseguições de que os cristãos têm sido alvo. O Público, por exemplo, debruçou-se sobre o assunto, através de artigos próprios ou dos seus colunistas. Outros órgãos de informação também o fizeram. E de alguma forma está ligada à profanação ou vandalização de inúmeras igrejas na Europa (a que alguns abusivamente quiseram colar o incêndio em Notre Dame, sem quaisquer provas, ou ligá-lo de imediato a muçulmanos quando se sabe que boa parte destes actos tem mão em supremacistas brancos neopagãos). É uma discussão importante e até urgente, mas temo que com o correr dos dia e a sucessão de novos factos comece a ficar novamente para trás. 

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Uma das coisas que me impressionam quando se fala em vítimas e fobias é a quase completa ausência de termos que o definam quando se trata de cristãos. Sobre isso escrevi num dos meus primeiros artigos aqui no Delito, e constato que a palavra "cristofobia" - ou cristianofobia, como quiserem - continua a não ser usada (também não havia de ser por causa do post). Em compensação, usa-se e abusa-se dos termos "islamofobia" e "anti-semitismo", apenas dirigido a actos anti-judeus. Afinal de contas porque é que se fala tão pouco em cristofobia? Continuará a ser por aquela tonta e estafada complexo de culpa ocidental, ao qual o cristianismo é colado? Mas então porque são na sua grande maioria comunidades cristãs antiquíssimas do Próximo Oriente e África a apanhar com as bombas e os estilhaços? E aqueles pobres cristãos do Níger, mortos em retaliação às caricaturas do Charlie Hebdo, que ligação tinha uma coisa com a outra? Poderá a auto-censura que é o politicamente correcto estar a silenciar uma terrível tendência da actualidade?

 

Nem de propósito, voltei aqui também por causa de mais uma imbecilidade do politicamente correcto, por uma vez a proteger Donald Trump. O New York Times tinha publicado um cartoon do bem conhecido (entre nós) caricaturista António, do Expresso, onde retratava Trump, cego e de kipá na cabeça, guiado por um Bibi Netanyahu em corpo de cão e com a estrela de David na coleira, como identificação da personagem, sem pedir autorização nem informar o desenhador. A imagem é pouco subtil e tem o seu quê de patético e de insultuoso, como tantas outras deste autor, mas não é das piores que se tem visto. Pois perante uma coro indignado com o "antisemitismo" da caricatura o conhecido jornal novaiorquino decidiu suprimi-la, pedir desculpas e "lamentar a sua publicação". Ou seja, autocensurou-se com a "indignação" (outra das modas contemporâneas) não assumindo os seus actos. Não sei se o New York Times se juntou áquela encenação do "Je Suis Charlie"; se sim, bem podia voltar a pedir desculpas e "lamentar o acto", já que o sabe fazer tão bem. Mas pergunto-me, caso se tratasse de outro conhecido "trabalho" de António, os estapafúrdios desenhos dos Papas com preservativos,  o New York Times cederia tão rapidamente como aqui? Ou defenderia aqui a liberdade do autor? Tenho as maiores dúvidas que fosse a segunda hipótese, como deveria ser, mesmo achando os desenhos em questão uma mistura de mau-gosto com hipocrisia.

O "direito" a prejudicar outros

Pedro Correia, 29.04.19

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Cenas destas ocorrem todos os dias, em milhares de passeios deste nosso país, onde basta um veículo assim estacionado para criar sérios problema de locomoção a qualquer pessoa que se desloque a pé. Basta pensar em cegos, velhos com bengala, jovens de muletas, gente que transporte malas, alguém que se mova em cadeira de rodas ou empurre um carrinho de bebé.

Vivemos numa época em que a todo o instante há quem reivindique direitos sem jamais mencionar a incómoda palavra dever - que todo o direito implica, pois são duas faces da mesma moeda. Alguns dos que mais clamam por direitos são os primeiros a mandarem às urtigas o mais elementar civismo. Ignorando que nenhum direito é absoluto, desde logo quando corre o risco de colidir com o exercício de direitos alheios.

O indivíduo que estacionou assim o carro em zona proibida é daqueles que têm uma concepção absoluta dos seus direitos. Talvez repita até à exaustão nas redes sociais palavras pomposas, como solidariedade e justiça. Aposto que será dos primeiros a exigir aos outros - incluindo entidades públicas - aquilo que ostensivamente não pratica. É o que mais há por aí. Alguns até se atrevem a dar lições de rigor moral e ética comportamental a quem vão encontrando pelo caminho.

Blogue da semana

Sérgio de Almeida Correia, 28.04.19

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(foto daqui)

Apresenta-se como um olhar sobre "a China além da China, além das fronteiras físicas, mentais, pessoais, das muralhas do nosso conhecimento. Este é um laboratório escrito e visual que dá voz a quem, como nós, quer contornar obstáculos, sejam eles a língua, a cultura ou a dimensão de um espaço aparentemente inalcançável."

Na altura em que o Presidente da República percorre o novo Império do Meio, conversa com Augusto Santos Silva ao longo da Grande Muralha, se prepara para as selfies de Macau e para celebrar o Primeiro de Maio numa região especial de um país socialista que vinte anos depois de se tornar "patriota" continua sem ter uma lei sindical e de regular o exercício do direito de greve,  previstos na sua mini-Constituição, e que, vergonhosamente, continuam a aguardar regulamentação, nada como dar uma vista de olhos por estes dias ao Extramuros.

A Construção da Catedral

jpt, 28.04.19

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É o dia seguinte ao incêndio da Notre-Dame, e agora sê-lo-á para sempre. Na manhã sigo ao mercado da praça Dailly, às bancas turcas e belgas, vivas de legumes e frutas, frescos e saborosos. Na Brabançonne, rua ainda com laivos de "património", o alfarrabista aproveitou o tempo soalheiro e, como sempre o faz nos raros dias assim, apôs uma pequena mesa de livros porta fora, como se que a ornamentar o passeio.

Hoje, claro, está centrada em Paris, na sua catedral, como teria que o estar depois da desgraça de ontem. Vejo este livro, "Cathedral: the Story of its Construction", de David Macaulay, que desconheço, a 5 euros. Hesito, folheio, decido comprar, menos legumes, menos fruta levarei, ainda bem que a filha foi de férias, não haverá problemas se mais parca for a ementa.

 

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E como não o levar? O exemplar está em belíssimo estado, como se novo, e numa edição de 1973. E o livro é uma verdadeira pérola. Macaulay ficciona a construção de uma catedral gótica francesa: inventa uma Chutreaux e narra, ilustrando-o, com detalhe todo o processo de construção da catedral.

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O autor deixa então todo esse processo de edificação da imaginária catedral, desde a tomada da decisão em construí-la, em 1252, até à sua conclusão em 1338. E nesse processo demonstra a omnipresença do divino na sociedade, a confluência de toda a cidade na projecto de erigir a maior catedral do país, a congregação de saberes e energias. 

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O texto é elucidativo, breve, explicitando os passos seguidos, numa sobriedade formal que não agride o leitor leigo com excessiva técnica. Bem pelo contrário, torna acessível a compreensão de todos os processos. Mas o cerne do livro são as ilustrações, magníficas, que cobrem as 80 páginas do livro. Descrevendo os ofícios envolvidos, os materiais colectados e produzidos, os passos desde a abertura das fundações até à instalação da sua cumeeira, as técnicas utilizadas, as figuras construídas para ornamentar. E a festa final, o encanto da população - "netos dos que iniciaram o trabalho" como refere (ficciona) Macaulay.

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E nisso mostra não só a tal omnipresença do divino mas também a grandiloquência do construído, explanando o como era assim a dimensão eclesiástica a argamassa unificadora. 

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David Macaulay, tem outros livros, de produção posterior e na mesma linha. A perseguir, decerto, tamanha a qualidade deste.

(Postal também colocado aqui)

ADENDA: As obras de Macaulay estão publicadas em Portugal (e já desde 1979), como o nosso confrade bloguista J.J. Amarante me informou aqui nos comentários. E ele já as utilizara, no seu Imagens com Texto, num bonito e interessante postal: Construindo e destruindo catedrais. Bem como a esta obra aludira num cuidado postal que fez após o incêndio da Notre-Dame. Recomendo mesmo a leitura de ambos.

O comentário da semana

Pedro Correia, 28.04.19

«Aquilo deu brado, os ânimos engrossaram, passou à rua e daí à praça.
Sempre em cima do acontecimento o BE plantou-se lá e disse que era sempre a mesma vergonha, que era por situações destas a inferiorizar a mulher que nunca íamos passar de um país do terceiro mundo. Empunhavam grandes cartazes, "Ao sexo obrigada mulher traumatizada"; "Sexo sem compromisso a mulher é um sorriso"; "Se tua mulher queres amar troca o sexo por massajar".
Aquilo despertou dolorosas recordações numa alminha que queria falar e a quem ninguém ligava, que subiu para um palanque e disse que não, que massajar era capaz de ser nefasto para a mulher. "A mim o meu marido uma vez fez-me uma massagem às mamas que fiquei com elas uma desgraça, que durante mais de quinze dias ninguém podia tocar nelas."
Bruno de Carvalho disse saber muito bem de onde aquilo vinha, que era mais uma maquinação bem-estruturada do Benfica para desestabilizar o Sporting, mas agora não tinha tempo para grandes explicações e ia já para o Face elucidar o povo.
Instado a pronunciar-se, Jorge Jesus disse: "Tem boas cartristicas defensivas e deiamo a mim que faço dele um grande médio ofensivo.
- Mister, não é futebol. É educação sexual.
- Voceses fazem mas parguntas a mim e depois querem qeu vos rasponda o quê?
Depois não sei a que consenso chegaram porque a polícia de choque chegou e carregou sobre a malta, e eu vim-me embora.»

 

Do nosso leitor Corvo. A propósito deste meu postal.

Bom jornalismo

Pedro Correia, 27.04.19

A propósito de um vulgar carioca de limão (agora, pelos vistos, nada vulgar), pode nascer um boa crónica jornalística. Esta, de Marta Reis no jornal i, intitulada precisamente "Era um carioca de limão". Que nos conta uma história e nos apresenta ao mesmo tempo um quadro impressivo da realidade lisboeta. De um quotidiano onde uns hábitos se ganham e outros se perdem, onde umas tradições vão morrendo e um consumismo de importação vai ganhando raízes.

Isto numa linguagem acessível e escorreita, em que todas as palavras estão no seu lugar e em que nada fica por entender. Algo cada vez mais raro nos dias que correm. Pode parecer simples? Pode. Mas não é.

Delito à mesa (15)

Pedro Correia, 27.04.19

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Empadas de galinha, arroz de perdiz, tarte de requeijão: a refeição ideal no lisboeta Salsa & Coentros, onde se presta tributo à cozinha do Alentejo e Trás-os-Montes. Mick Jagger gostou do que aqui comeu.

 

É o melhor restaurante do meu bairro. O bairro de Alvalade, em Lisboa, onde não faltam espaços capazes de satisfazer os palatos mais exigentes. Mas tenho uma especial predilecção por este, a cuja inauguração praticamente assisti. Aqui presta-se tributo à cozinha tradicional portuguesa – sobretudo de inspiração transmontana e alentejana – aliada à arte de bem-receber, cultivada pelo seu proprietário, José Duarte, diplomado pela Escola de Hotelaria de Lisboa e com uma longa experiência anterior na Adega da Tia Matilde, também na capital.

No Salsa & Coentros sinto-me sempre em casa, sobretudo à hora do jantar, quando o ambiente ganha tons familiares e as conversas são ainda mais amenas: percebe-se que tem clientes incapazes de trocá-lo por outro restaurante da zona. No final do Verão, o espaço foi remodelado e adquiriu um toque suplementar de sofisticação.

 

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Empadas de gallinha

 

Mal nos sentamos, somos brindados com acepipes que contribuíram para a boa fama da casa. Favinhas de coentrada, pimentos com coentros, cogumelos de coentrada – e sobretudo as empadas de galinha: ainda não encontrei melhores em Lisboa. Elas contribuem para esta minha longa fidelidade ao restaurante, fundado em 2006, a curta distância do Mercado de Alvalade, na rua em frente aos bombeiros.

 

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Arroz de perdiz

 

Mas aquilo de que mais gosto são os arrozes de caça. Sobretudo o arroz de perdiz, com um toque adequado de vinagre. Nesta época, quando aqui venho, nem preciso de espreitar a ementa: é o prato que peço sempre. 

Feito no momento, demora a chegar à mesa. Mas asseguro que vale a pena esperar. E o apetite pode ser entretido com um apreciável naipe de entradas: recomendo os espargos com ovos ou as migas de batata e ovo.

 

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Empada de perdiz com arroz de grelos

 

Todas as semanas há opções novas em vinhos – em garrafa ou servidos a copo. Na minha mais recente incursão, apreciei um tinto do Douro, Raposeira, colheita de 2015. Acompanha bem outros pratos fixos: empada de bacalhau, pato borracho com arroz malandro ou os suculentos lombinhos de porco preto fritos com pimentão. Sem esquecer a empada de perdiz com arroz de grelos.

 

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Tarte de requeijão

 

Em 2014, Mick Jagger jantou aqui – por sugestão da fadista Ana Moura, sua amiga e cicerone no roteiro gastronómico alfacinha. Consta que saiu satisfeito, desde logo com as favinhas, o que constitui prova inegável de bom gosto. Se não provou a tarte de requeijão, fez mal: é imperdível.

Aviso ao leitor: os dois pisos do restaurante estão sempre cheios. É indispensável fazer marcação prévia, de segunda a sábado, para evitar ir a outro lado. Seria uma pena. 

 

Restaurante Salsa & Coentros

Rua Coronel Marques Leitão, 12, Lisboa.

Telefone 21 841 09 90

Horário: 12.30-15.00, 19.30-23.00. Encerra aos domingos.

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