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Delito de Opinião

Os tiagos amarelos

jpt, 03.12.18

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Ontem aconteceu uma enorme "marcha pelo clima" aqui em Bruxelas - não, não se andou a pedir reclicagem de papel ou reconversão dos sacos de plástico, as panaceias dos ecologistas folclóricos. E não, as pessoas não ficam aprisionadas aos ditos dos patetas da igreja do culto do mercado (esses que bolçam, tudo pejando de perdigotos fétidos, que o Mercado é virtuoso e o Estado demoníaco, pelo que qualquer intervenção sobre a iniciativa privada é pecaminosa pois nada desta decorrente ofenderá os desígnios perfeitos da Criação).

Na concentração final, no Parque do Cinquentenário (o desengraçado "arco do triunfo" local), lá apareceram alguns destes "tiagos amarelos", que agora se instalaram na moda. Não tinham nada a ver com aquilo - de facto são adversários de qualquer preocupação desenvolvimentista -, foram apenas atraídos pela multidão (talvez a ver se "pegava"), no vácuo mental em que vegetam. Na sexta-feira tinham-se concentrado nas cercanias do "bairro europeu" e arranjado alguma confusão, coisa de pouca monta (dois carros virados e incendiados) mas suficiente para soarem mais alto. A França é mesmo aqui ao lado e os francófonos, os valões, enfim, nunca querem deixar de aparecer ...

Mas lá por Paris de França têm arranjado maiores confusões. Diz que os impostos são altos, que andar de carro está mais difícil. O BE do sítio (um tipo insuportável de vácuo e cagança, Mélenchon) e Le Pen já apoiam - claro, tudo o que mexa é apoiável pelos radicais. Ao centro, o magnífico casal Hollande-Royal saiu do recato a que o ridículo o condenara, para sufragar a ralé. Os outros centristas, na ressaca do estertor do feixe partidário francês, também ulula os "û-lá-lá", a onomatopeia simbólica daquela republicana "sociedade de corte". O macronismo hesita e já negoceia com a turba burguesota.

Na minha pátria amada também as simpatias jorram. Não tem o "povo" sempre razão, contra o Estado demoníaco, contra o capitalismo, contra a globalização, a favor do Estado-Nação e iniciativa privada/revolução anarco-sindicalista e/ou neo-marxista? Apoie-se pois estas "jacqueries" do povo espoliado, sempre elas dotadas da razão histórica e da moral do sal da terra.

Quando estes tiagos, embrutecidos no seu desejo de manter o seu nível de vida burguesote, começarem, como sempre o fizeram na história, a queimar os "judeus" de hoje, alguns dos opinadores lá lamentarão os excessos. Mas realçando a justeza das reinvindicações (ainda que não se saiba bem quais são) e do mal-estar (ainda que não se perceba bem o porquê dele). Outros abordarão "sociologicamente" os trágicos acontecimentos, falarão da Santa Exclusão, assim invocando Nosso Senhor Contexto como causa. Pois a "explicação mágica", essa que tudo disseca e assim sossega, sempre é aclamada. Mesmo quando só serve para isso, para acalmar a ânsia de sossego.

A ver vamos se Macron se deixa de se esfregar em jovens rappers e resolve esta tiaguice como deve ser. Sem tibiezas. Deixando os patetas globais, e os nossos também, nos seus "û-lá-lás" patéticos.

A vandalização do Arco do Triunfo.

Luís Menezes Leitão, 03.12.18

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Eu até tenho alguma compreensão pelo protesto dos coletes amarelos contra a carga fiscal insustentável que o Estado cada vez mais faz recair sobre os cidadãos. Mas já acho absolutamente intoleráveis actos de destruição da propriedade pública e privada e especialmente actos de vandalização de monumentos nacionais, com o simbolismo do Arco do Triunfo. A isto a única resposta só pode ser a da força da lei. Como disse De Gaulle perante os protestos do Maio de 1968: "la République n'abdiquera pas".

Jornalismo "agit-prop"

Pedro Correia, 02.12.18

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Ontem, como de costume, em quase todos os canais "informativos" portugueses só havia bola. Com "notícias" como esta: «Benfica supera a crise goleando o Feirense.»

Deslizei para os raros recantos onde ainda não chegara o futebol - que entre nós é considerado sinónimo de desporto, vá lá entender-se por quê.

Num desses poisos alternativos, logo na frase de abertura, evocava-se o agora falecido presidente norte-americano George Herbert Walker Bush dizendo logo na frase de abertura que tinha "liderado durante oito anos" o poder em Washington: bastaria uma rápida consulta à Wikipédia para perceber que Bush pai esteve apenas quatro anos na Casa Branca, entre 1989 e 1993.

Mas este "jornalismo" que nos entra em casa não peca apenas pela falta de memória: peca também por excesso de activismo político. Noutro canal, a propósito dos distúrbios em Paris, provocados por extremistas de vários matizes, Fulano aludia à Revolução Francesa, Beltrano invocava o espírito da "revolução de 1848" e Sicrano dava por praticamente consumada a demissão de Emmanuel Macron, por pressão "do povo que se revolta nas ruas". Todos contactados por telefone, todos arengando contra a democracia representativa, todos fazendo tábua rasa da genuína vontade popular expressa no voto. Agit-prop em directo e ao vivo.

Voltei a zapar, de comando na mão. Despedindo-me dos cúmplices morais da anarquia parisiense, regressei ao reino da bola. Mal por mal, antes a crise do Benfica, "superada" pela vitória caseira contra o Feirense.

Leituras

Pedro Correia, 01.12.18

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«A suposta grande angústia do nosso século é a falta de tempo; a consciência que dela temos e não um desinteressado amor pela ciência, e certamente que não a sabedoria, é a razão por que dedicamos uma tão grande porção do nosso engenho e dos rendimentos das nossas sociedades à descoberta de maneiras mais rápidas de fazer coisas - como se o objectivo da espécie humana fosse aproximar-se não de uma perfeita humanidade mas de um perfeito relâmpago.»

John Fowles, A Amante do Tenente Francês (1969)p. 19

Ed. Presença, Lisboa, 1983. Tradução de Paula Vitória Silva. Colecção Novos Horizontes, n.º 1

O esgoto estatal

jpt, 01.12.18

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Um antigo presidente de um clube desportivo é sujeito a um interrogatório, no âmbito de uma investigação ampla, ainda em curso. Depois o Estado (uma sua secção, chamada "ministério público") entrega as gravações desse interrogatório à televisão estatal e autoriza-a a transmiti-las: aqui, um programa da RTP com excertos das declarações de Bruno de Carvalho, anunciando a sua reprodução como autorizada pelo tal "ministério público".

Decerto que há um qualquer quadro legal que permite isto, safando os funcionários públicos e fazendo medrar esta mentalidade. Mas isto é inqualificável. O estado do Estado é um descalabro. Uma cloaca a céu aberto, onde engorda esta gente.

Entre os mais comentados

Pedro Correia, 01.12.18

Em 22 destaques feitos pelo Sapo em Novembro, entre segunda e sexta-feira, para assinalar os dez blogues nesses dias mais comentados nesta plataforma, o DELITO DE OPINIÃO recebeu 17 menções ao longo do mês.

 

Os textos foram estes, por ordem cronológica:

In memoriam (14 comentários)

Estátuas dos nossos reis (68) (20 comentários)

Pensamento da semana (64 comentários, segundo mais comentado do dia)

Frases de 2018 (40) (34 comentários)

Post-it (35 comentários)

Alguém por aí sabe como se diz «banho de ética» em alemão? (44 comentários)

Pensamento da semana (28 comentários)

Post-it (19 comentários)

Post-it (35 comentários)

De luz e de sombra (35 comentários, o mais comentado do dia)

Estão à espera de quê? (70 comentários, o mais comentado do dia)

O fim do sonho em seis segundos (18 comentários)

O inclusivo (39 comentários)

Levar o desaforo para casa (56 comentários, terceiro mais comentado do dia)

Clube do Bolinha na cozinha (46 comentários, o mais comentado do dia)

Jornalismo e cidadania (17 comentários)

Sem ética de responsabilidade (51 comentários, terceiro mais comentado)

 

Com um total de  625 comentários  nestes postais. Da autoria do Fernando Sousa, do Luís Menezes Leitão, do JPT, do Rui Rocha, do João Pedro Pimenta, do Alexandre Guerra e de mim próprio.

Fica o nosso agradecimento aos leitores que nos dão a honra de visitar e comentar. E, naturalmente, também aos responsáveis do Sapo por esta iniciativa.

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