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Delito de Opinião

Blogue da semana

Teresa Ribeiro, 30.04.17

São veteranos da bloga. Donos de uma opinião que nos chega consistente, acompanham tudo o que de relevante se passa na pólis. Nem sempre estou de acordo com os pontos de vista dos seus autores, mas mesmo quando é esse o caso nunca dou por perdido o meu tempo, até porque não gosto de monolitismo. Recomendo a leitura de Ladrões de Bicicletas, o blogue desta semana. 

Ler

Pedro Correia, 30.04.17

Júdice, mestre do insulogio. De Sérgio Barreto Costa, no Blasfémias.

Não havia necessidade. De Vital Moreira, na Causa Nossa.

No Camboja. Da Joana Lopes, no Entre as Brumas da Memória.

Diário de um psicólogo (34). Do Filipe Nunes Vicente, na Depressão Colectiva.

Poetas e gente dessa. Da Eugénia de Vasconcellos, na Cabeça de Cão.

Maria Helena da Rocha Pereira. Do Francisco José Viegas, n' A Origem das Espécies.

A educação do cidadão no século XXI. De Helena Damião, no De Rerum Natura.

Estou farta. Da Ana Matos Pires, na Jugular.

Efeméride. Do José Meireles Graça, no Gremlin Literário.

Os militares no 25 de Abril. Do José Pimentel Teixeira, n' O Flávio.

Leituras

Pedro Correia, 29.04.17

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«Não há ser vivo que não tenha medo quando enfrenta o perigo. A verdadeira coragem está em enfrentar o perigo quando temos medo

Frank BaumO Feiticeiro de Oz (1900), p. 116

Ed. Público, 2004. Tradução de Lúcia Cabrita Harris. Colecção Geração Público, n.º 7

Dicionário prático de neologismos, 1: Assédio

Inês Pedrosa, 29.04.17

Comecei a trabalhar na redacção do semanário O Jornal, a tempo inteiro e com salário zero - estágio, chamavam-lhe eles - a 2 de Janeiro de 1983. Ainda não havia o capitalismo neo-liberal e não sei que mais, nem a crise dos mercados financeiros, nem o modo de vida do Sócrates, enfim, nada dessas coisas tenebrosas que vieram perverter o mundo e, segundo os entendidos, atrair as pessoas para a extrema-direita, a loucura e a morte. Certo é que, sem nenhum desses horrores no horizonte, já se praticavam os estágios gratuitos, mesmo em jornais de esquerda como, segundo as boas línguas, era o caso daquele.

Tive sorte: o jornal, então maioritariamente masculino, queria jovens do sexo feminino para mandar para a Assembleia da República. Explicaram-me os chefes que, sendo a maioria dos deputados do sexo masculino, convinha que fossem entrevistados por jornalistas do sexo oposto, com decotes generosos, para os levar a responder com maior sinceridade. O Rogério Rodrigues foi incumbido de me levar ao Parlamento para me apresentar as pessoas.

Não correu muito bem: assim que me viu, Almeida Santos fez-me uma festa na cabeça e pespegou-me dois beijos nas bochechas, antes que o Rogério tivesse tido tempo de explicar quem eu era. "Homem, vocês agora vão buscar jornalistas ao infantário?" - perguntou, embaraçado, Almeida Santos. Ofendida, retorqui que já tinha 20 anos. O então Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares declarou: "Pois olhe, eu não lhe dava mais de 15". Assim terminou a minha promissora carreira de repórter parlamentar. Aproveito para prestar as minhas homenagens a Anabela Neves, minha colega de turma na universidade, e a Maria Flor Pedroso, que honraram e honram a difícil e delicada especialização do jornalismo parlamentar, em décadas de trabalho isento e exemplarmente rigoroso. Entraram para a profissão nessa época em que as redacções machas queriam meninas para impressionar os deputados, e sobreviveram magistralmente a essa sinuosa forma de assédio profissional.

 

A palavra assédio, pura e simplesmente, não existia. Quando o orientador de estágio que me fora designado no jornal começou a sussurrar-me que tinha de ir jantar com ele para garantirmos que eu conseguiria o emprego, valeu-me o apoio da Clara Pinto Correia, que entrara um ou dois anos antes para o jornal e tinha uma inteligentíssima capacidade de contra-ataque. Aconselhou-me a Clara a que marcasse o jantar na agenda de serviço do jornal, que estava colada na parede, no meio da redacção. De facto, essa boa acção teve o condão de anular de imediato o apetite do meu orientador. Pouco depois, consegui que me transferissem para a secção de cultura e passei a ser orientada pelo Fernando Dacosta, a quem devo lições essenciais sobre jornalismo, teatro, literatura e, sobretudo, dignidade humana.  

Ao fim de um ano e meio de estágio gratuito, o José Carlos Vasconcelos e o António Mega Ferreira, respectivamente director e chefe de redacção do JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias, contrataram-me para a redacção deste jornal cultural, que passava então de quinzenal a semanal. Um belo dia, fui encarregada de entrevistar um escritor já em processo de consagração que, enquanto ia respondendo à entrevista, tentava meter-me as mãos em todas as partes do corpo (excepto, salvo erro, os tornozelos e os pés). Lembro-me de ter pensado de mim para comigo: "Respira fundo e faz de conta que estás numa daquelas comédias italianas desesperadamente ansiosas por parecerem picantes". O literato Don Juan extraira da minha cândida pessoa a confissão de que eu queria um dia escrever romances e, enquanto me dedilhava, dissertava sobre a superior facilidade de escrita que eu experimentaria se me deitasse com ele. Respondi-lhe que, mesmo que o talento se contagiasse sexualmente, preferiria escrever à minha maneira, e não à dele, o que o fez concluir, escandalizado: " Além de pespineta, você é uma arrogante".

Infelizmente, esses dois grandes defeitos não o fizeram desistir do assédio, antes pelo contrário, e o ordálio continuou por uns tempos, sem que eu me tivesse queixado a ninguém. Nem me ocorria. Nesses tempos considerávamos tais ataques como "normais". Preço a pagar pela ousadia de querermos afirmar-nos num mundo de homens. 

 

Hoje, sabemos identificar o assédio. Continuamos todavia a deixar que nos desmereçam. A aceitar que nos diminuam. A pactuar com o desmerecimento e a diminuição de outras mulheres. Sem sequer darmos por isso. 

- Ele a mim tratou-me sempre muito bem.

A frequência com que ouço esta frase, entre mulheres e contra mulheres, em situações de relações pessoais ou laborais, e o que ela representa de falta de solidariedade, cobardia, indiferença, obediência e auto-depreciação, leva-me a pensar que o pior assédio é o do medo. Invisível, inatacável, persistente, mantendo cada ovelhinha no seu lugar.

 

Convidado: LUÍS MILHEIRO

Pedro Correia, 28.04.17

 

Viver na estrada ou morrer no estádio...

 

Às vezes pensa que mais valia ter morrido no estádio.

Nunca mais seria esquecido, nem duvidavam dele quando afirmava que era fulano tal, esse mesmo que jogara no meio campo do “Belém”. E que só por não ter tido muito juízo, é que andava agora com uma camioneta a distribuir pão, aqui e ali.

Raramente é reconhecido. E quando isso acontece chega a ser deprimente, pois só alguns “doentes da bola”, dos que fazem todas as colecções de cromos, o enchem de palmadas nas costas. É por isso que lhes mente quase sempre, diz que é engano, que não é esse cromo do Belenenses, que lhe faltou numa colecção qualquer.

Pode parecer contraditório, mas as coisas da fama são mesmo assim, é como o amor, só gostas de quem te vira as costas, de quem não fica à tua espera na esquina.

Um dia, num completo desespero, dias depois de se divorciar da segunda mulher, queimou tudo o que tinha em casa dessa outra vida, fotografias, camisolas, calções, etc.

Os troféus teve o cuidado de os levar para a casa dos pais, dias antes. Foi por isso que escaparam a mais aquela crise de identidade, assim como os álbuns de fotografia dos tempos de solteiro e os recortes que o pai foi coleccionando ao longo da carreira.

Mas a “destruição” não mudou nada, parece que os álbuns de retratos continuam lá todos por casa, com as louras platinadas bem entrancadas e o inesquecível Lamborguini azul marinho, que lhe venderam como se fosse a sua cara. Não devia pensar nisso, até porque as louras hoje devem estar todas encarquilhadas e o desportivo está na sucata há muitos anos…

Estava ali a almoçar, com aqueles homens cansados de trabalhar como escravos, com vontade de fazer uma revolução, pelo menos de palavras. Ele nem isso. Continuava às voltas com o passado, tão mal resolvido…

Ali ninguém o reconhecia e ainda bem. Ainda lhe chamavam parvo, por ter deitado tanta coisa fora… por ser agora também “escravo” nesta sua última vida. Foi então que, à boa maneira portuguesa, se tentou confortar, “lambendo as feridas” e dizendo para os seus botões que ganhava uma miséria e não gostava nem um pouco do que fazia, mas pelo menos tinha trabalho.

Olhou o relógio, pagou a despesa e despediu-se da malta, pois tinha de se fazer à estrada, na velha Transit, cada vez menos voadora…

 

 

Luís Milheiro

(blogue LARGO DA MEMÓRIA)

Grandes animais

Pedro Correia, 28.04.17

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Nestas coisas nunca sei o que me choca mais: se aqueles que são capazes, aos milhares, de subscrever um abaixo-assinado contra o abate de um rottweiler que segundo fonte policial deixou  praticamente desfigurada uma criança de quatro anos na via pública (faltando saber se os mesmos ou outros militantes animalistas já se mobilizam em defesa de um arraçado de Serra da Estrela que arrancou uma orelha a outra criança, esta de nove anos), se aqueles que são capazes de desejar a morte de um menino de seis anos só porque teve a desdita de confessar que gostaria de ser toureiro.

Que uns e outros são grandes animais, não me restam dúvidas. Acrescento que, ao contrário do que os visados possam supor, isto não constitui um elogio.

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