Não faltam vozes de escândalo perante a intenção da Alemanha de impor um comissário que passaria a decidir as questões orçamentais gregas. Vejamos então:
- Que soberania existe em precisar de dinheiro emprestado para pagar aos médicos, professores e polícias?
- Alguns dos que agora se indignam passam os dias a clamar contra as vergonhas do nosso país (nomeações de boys, desperdício de dinheiros público, regabofe na Madeira, buraco das autarquias, evasão fiscal, desigualdade na tributação em favor dos de sempre, parcerias público-privadas, privilégios do BES ou da MOTA ENGIL, etc). Estão errados? Claro que não. Tudo isso acontece. Na Grécia é pior.
- Não falta quem aponte as questões estruturais de concepção do Euro (défices de balança comercial da periferia) como única causa do descalabro grego. Talvez fosse bom recordar que a adesão à moeda única foi voluntária (soberana). Se a escolha foi errada... E, para dizer tudo, essa visão esquece todas as desgraças que ninguém nega (as situações descritas no ponto anterior são meros exemplos e existem em dobro na Grécia). Estamos então a defender a soberania do país ou a corporacia dos interesses para os quais é essencial que tudo fique na mesma, lá como cá?
- Em certos discursos parece ser que a única soberania que merece protecção é a dos países devedores. Quando se trata de usar os impostos dos cidadãos para socorrer os devedores, a ideia de soberania some-se. Os interessados não devem pronunciar-se.
Esta é uma questão que vai até ao osso. A ideia de criar um comissário orçamental é péssima. Mas, a sua recusa não se pode fundamentar numa soberania ancorada em factos folclóricos passados porque estes são igualmente péssimos. Só pode fundamentar-se num certo futuro: o de um país responsável, com cidadãos adultos e políticos exemplares. Capazes de libertar o Estado das dependências, vícios, teias e ilusões em que se deixou envolver. Se acreditarmos nisto, percebo a defesa sem concessões da soberania. Se não for assim, o discurso inflamado reduz-se a berrar que os nossos são uns bastardos, mas são os nossos bastardos. Não me importo de participar. Mas, nesse caso, apresentemo-nos todos com a bandeira, à guisa de barrete, enfiada até às orelhas.