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Delito de Opinião

Centrão: a terceira travessia

João Carvalho, 30.08.09

Sempre que se fala em grandes projectos políticos, ela aí está. Chamam-lhe a terceira travessia. Não se adivinhava, mas os primeiros sinais concretos foram assinalados aqui pelo Pedro Correia, há quatro dias: a entrevista de João de Deus Pinheiro ao i era «a resposta simétrica às recentes declarações de Ferro Rodrigues ao Expresso». Faltava apenas ligar as duas margens. Foram ligadas ontem, quando um socialista fez a apologia do programa eleitoral dos sociais-democratas.

Joaquim Pina Moura representa a terceira travessia. Ele é a ponte que faltava. Agora, resta apenas saber quem irá liderar o Bloco Central depois de 27 de Setembro, porque o projecto já é real e está pronto a ir por diante. A menos que a Terra trema, cheira-me que há muita gente por aí que vai ficar com cara de peixe. E com os bicos dos sapatos esfolados em vão.

Uma dúvida

Paulo Gorjão, 30.08.09

O que farão os apoiantes de Manuela Ferreira Leite, que andam por aí a dizer de José Sócrates e do PS o que Maomé não disse do toucinho, se a líder do PSD aceitar fazer parte ou liderar um governo de Bloco Central? Nesse mesmo dia demitem-se do PSD (ou assumem a ruptura, no caso dos independentes), ou é apenas mais um sapo -- a juntar a outros -- que engolirão em nome do acesso ao poder, a bem de Portugal, claro?

P.S. -- Sobre o Bloco Central, mais algumas notas aqui.

Ambiente: o ciclo da ineficácia

João Carvalho, 29.08.09

Cíclica e cansativamente, passou a ser um fado arrastado ouvir que o Estado tem continuado a produzir muitos papéis e pouca obra para salvar a orla marítima. Nos quase mil quilómetros da costa continental, os atentados são escandalosos e agrupam-se maioritariamente em dois planos: barracas, habitações precárias e casas modestas construídas sem autorização e que não dispõem das infraestruturas mínimas indispensáveis de salubridade e quejandas (clandestinas, portanto); construções familiares de veraneio ou de exploração turística erguidas com autorização suspeita por conveniências inconfessáveis (de clandestinidade encoberta por despachos irregulares, portanto).

Ainda há poucos anos, o anterior ministro do Ambiente parecia um irredutível gaulês quando declarou que iria arrasar com tudo o que estivesse a mais. Ia fazê-lo em dois tempos, mas ficou tudo na mesma em dois contratempos: primeiro, o tal ex-ministro deve ter percebido que tinha de arrasar com a sua propriedade de ócio numa reserva natural e, depois, ainda por cima, ele próprio não teve tempo para cumprir a sua palavra por estar muito ocupado a estudar o destino de milhares de sobreiros que a lei determinara serem intocáveis. Um caso bicudo, como se calcula, já que era preciso abatê-los sem lhes tocar. Era como estrelar um ovo sem lhe partir a casca, não é verdade?

Já nestes últimos anos, o actual governo foi deixando as coisas como estavam, mas acaba por ter menos culpas no seu cartório. É o resultado – reconheça-se em abono da verdade – de ter Ministério do Ambiente e não ter ministro. Temos de ser justos: era muito difícil alterar a situação com este estranho modelo.

Imagem — Um raminho de sobreiro intocável

que sobrou do célebre abate em Portucale.

A greve compensa

Jorge Assunção, 29.08.09

Esta empresa dá prejuízo atrás de prejuízo. A TAP que, por lei, não pode controlar a empresa, na prática, controla-a. Há muito que a companhia aérea nacional procura um investidor privado que queira comprar a Groundforce (como já referi, a legislação a isso obriga). Contudo, dificilmente alguém estará interessado numa empresa que em 2008 apresentou um prejuízo de cerca de 36 milhões de euros. Uma reestruturação da mesma é necessária. Os sindicatos, em nada aproveitando o facto de estarmos próximos de eleições, forçam a adopção de um acordo que dificulta qualquer reestruturação, pedindo a acção do governo para salvar postos de trabalho na empresa. O governo, através da TAP, cede à pressão dos sindicatos. Nem tão cedo aparecerá um privado interessado na empresa. Nem tão cedo a empresa deixará de apresentar prejuízo. Para um privado o prejuízo constante não é opção. Em empresas controladas pelo Estado é. Todos sabemos quem é que paga. Para o contribuinte não há quem o salve. Neste país, o direito à greve, legítimo e justo, está totalmente desvirtuado, aproveitando sobretudo a quem procura extrair rendas junto do contribuinte.

A importância do primeiro parágrafo

Pedro Correia, 29.08.09

  

É o maior desafio para qualquer jornalista: como agarrar o leitor logo nas primeiras linhas? Há técnicas clássicas que se desenvolveram para focar a atenção das pessoas num texto, seduzindo-as com o estilo e o conteúdo. Um desafio estimulante, diga-se. E tanto mais estimulante quanto é certo que a capacidade de concentração da generalidade dos leitores contemporâneos está cada vez mais diluída. A estética de videoclip, o culto do zapping, as mil e umas artimanhas da linguagem publicitária, as centenas de canais televisivos ao dispor de cada um, as mensagens de telemóvel que a todo o momento nos assaltam e a magia da Internet tornam-nos seres dispersos e errantes. A ninguém sobra hoje tempo nem paciência para ler textos de jornal que se estendem por várias páginas. A comunicação moderna tem requisitos bem específicos neste domínio.

Mas não seria assim também noutras épocas? Na sua memorável comédia A Primeira Página, escrita há oito décadas, os dramaturgos norte-americanos Ben Hetch e Charles MacArthur centraram toda a acção numa redacção de jornal – daquelas bem antigas, cheias de fumo e com garrafas de uísque em cima das secretárias. O director do Chicago Examiner, Walter Burns, pede ao mais conceituado dos seus repórteres para lhe ler o parágrafo de abertura da prosa que tem na máquina de escrever. Não gosta nada do que ouve, preguntando-lhe por determinado pormenor. “Isso vem no segundo parágrafo”, esclarece o repórter. “E quem diabo vai ler o segundo parágrafo?”, dispara o director.
Tantos anos depois, este é um dilema que permanentemente nos assalta: quem acabará por ler os segundos parágrafos de cada texto nosso?

Nada na manga

João Carvalho, 28.08.09

— ... E por isso é que temos de proceder a esta busca. Diga-nos lá: o senhor tem alguma coisa escondida em qualquer local da casa?

— Nada tenho a esconder na casa-de-banho secreta com uma porta secreta para um aposento secreto que é o meu escritório secreto. Estou com a consciência secreta tranquila por ter feito tudo com a maior clareza secreta e transparência.

Reading Snack (3)

Paulo Gorjão, 28.08.09

Se o leitor tivesse que escolher apenas um artigo para ler hoje sobre política internacional, a minha recomendação seria esta: Douglas Farah, "Chávez Excellent Adventure".

 

 

P.S. -- Sobre o crescente papel da China na cena internacional, aqui.

 

Movimento anti-marquises

Pedro Correia, 28.08.09

 

Finalmente, uma ideia digna de aplauso: pôr fim ao pesadelo estético que é a proliferação de marquises, feíssimo fenómeno português sem paralelo na Europa e no Mundo. Se este senhor Luís Mesquita Dias fosse candidato autárquico em Lisboa, votava nele.

 

Imagens: Lisboa antes de ser invadida pela praga das marquises. Tinha muito melhor aspecto, não acham?

 

O ministro-ampulheta

João Carvalho, 28.08.09

A estas horas, já o primeiro-ministro assistiu ao fecho da comporta da Barragem de Odelouca. Acompanhado por quem? Não se imagina. A acompanhá-lo estava nem-mais-nem-menos que o ministro do Ambiente. Em pessoa. Imparável. Hiperactivo. Ninguém o segura. Depois de duas aparições na praia Maria Luísa, Nunes Correia (assim se chama ele) reaparece (ó loucura!) em Odelouca.

Está visto que o ministro do Ambiente é uma espécie de ampulheta do governo: é posto em pé no início do ciclo e volta a aparecer para avisar que a areia está prestes a acabar.