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Delito de Opinião

A teia de cumplicidades na guerra

Pedro Correia, 31.08.09

Sem uma profunda teia de cumplicidades pessoais, ao mais alto nível, a II Guerra Mundial não teria sido o que foi. Esta é a tese central do historiador francês Marc Ferro no seu livro Sete Homens em Guerra. As cumplicidades foram simétricas: assentaram, do lado do Eixo, na forte relação pessoal entre Hitler e Mussolini e, do lado ocidental, na firme aliança entre Roosevelt e Churchill. Entre os dois pólos, oscilou Estaline – que em 1939 assinou o pacto de não-agressão com Berlim e em 1941, com os tanques germânicos a acossá-lo, se aliou a Londres e Washington. As restantes figuras históricas que justificam o título do livro são o general Charles de Gaulle, chefe da França Livre, e o imperador japonês Hirohito, aliado de Hitler no Oriente.

 

Ferro revela múltiplos episódios protagonizados por todos eles. Hitler, por exemplo, era um antigo admirador de Mussolini. Quando se encontraram pela primeira vez, o alemão ofereceu ao italiano as obras de Nietzsche, o seu filósofo preferido. Estaline, por sua vez, manteve laços diplomáticos com a Roma fascista durante cerca de uma década. E no início dos anos 30 mandou traduzir para russo o Mein Kampf, de Hitler, obra que leu atentamente. Churchill, embora detestasse o líder nazi, chegou a ser um notório admirador de Mussolini. Roosevelt e Estaline estimavam-se mutuamente. A tal ponto que na conferência de Ialta, quando o presidente americano não compareceu a uma sessão de trabalho por se encontrar muito doente, o ditador soviético teve a preocupação de visitá-lo. “Porque é que a natureza o castiga desta forma?”, interrogou-se no final, virando-se para Molotov e Gromyko, que o acompanhavam.
 
Alguns outros episódios:
– Quando visitou Estaline, em Dezembro de 1944, De Gaulle recusou dormir na Casa de Hóspedes do Kremlin, alegadamente por ter “muitos micróbios”, optando pela embaixada francesa. E enalteceu Estalinegrado como “símbolo da unidade entre aliados”, ignorando o esforço solitário dos russos. Resultado: Estaline reservou-lhe um tratamento glacial.
– Em Ialta, o ditador soviético apresentou o temível Beria, chefe do KGB, a Roosevelt e Churchill. “Quem é?”, perguntou-lhe o inquilino da Casa Branca. “É o nosso Himmler”, respondeu Estaline, deixando os seus interlocutores gelados.
Abril de 1943: Hitler e Mussolini encontram-se em Salzburgo. Estão macilentos, precocemente envelhecidos. “Dois doentes”, arrisca alguém. “Não, dois cadáveres”, corrige o dr. Pozzi, médico de Mussolini. Não se enganava: para os dois tiranos, aquele era o princípio do fim.

 

Sete Homens em Guerra. De Marc Ferro (Bertrand, 2008)

395 páginas

Classificação: * * *

Blog da Semana

Teresa Ribeiro, 31.08.09

Não é um baby blog daqueles que alinham as gracinhas dos filhotes como se de um diário se tratasse para mais tarde recordar, nem tão pouco o port folio dos estados de alma sempre tão intensos e impregnados de sentimentos de culpa, frustrações e paixões desmedidas que assolam as mães modernas e saudáveis. A Um Metro do Chão faz tangentes a tudo isso com uma subtileza e humor admiráveis. Note-se que nada tenho contra baby blogs, mas este tem a particularidade de não reclamar do leitor cumplicidades fechadas, só partilháveis por mães. Por outras palavras, não exclui. Porque não se esgota na relação mãe-filhos, antes parte dela para espreitar o mundo com outros olhos. Os olhos de uma mãe.

TAP: evolução na continuidade

João Carvalho, 31.08.09

Que a TAP apresenta uma "situação financeira crítica" nada tem de novo, para lá da actualização dos números sobre o desastre do costume: no primeiro semestre deste ano, o grupo apresentava 247,2 milhões de euros negativos. Só que isto é bem mais do que os 171,7 milhões de euros negativos com que fechou 2008.

 

Ora, se esta é a sina da TAP que andamos todos a pagar, escusava de ser nossa sina ter de aturar aquilo a que, pelos vistos, ninguém hoje resiste: a terminologia dos exercícios literários desajustados que passaram a ser moda, só para dizer coisas que antigamente eram simples e formais. No caso, por exemplo, o relatório do semestre passado da Parpública (accionista única do Grupo TAP) diz que a situação crítica se mantém por causa do «resultado negativo apurado no semestre». M. de La Palisse cairia derrotado se lesse estes impagáveis nacos de prosa que passaram a ser norma entre nós.

 

Do mesmo relatório ressaltam coisas assim, vejam só:

– o segmento das "actividades aeronáuticas" «continua a ter um peso relativo extremamente expressivo no âmbito do Grupo» (pudera!);

– «neste segmento o capital próprio, que já era negativo no final de 2008, apresenta ainda uma redução de aproximadamente 77 milhões de euros, integralmente explicada pela evolução do Grupo TAP» (evolução!);

– «este prejuízo, embora bastante significativo, representa menos de metade do registado em igual período do ano anterior e está em linha com o orçamentado» (parabéns!);

– «há assim uma evolução positiva a qual se deve essencialmente aos resultados do negócio do transporte aéreo» (é a chamada evolução positiva dos resultados negativos do negócio que me cheira ser a vocação da TAP!).

 

Poupo-vos outras pérolas do mesmo quilate. E peço desculpa pelo desafio à vossa paciência, mas foi só para registar mais este ensaio literário que vem ajudar a arrumar na gaveta da História o tempo em que as coisas simples eram relatadas com simplicidade.

E o Porto aqui tão perto?

Carlos Barbosa de Oliveira, 31.08.09

Quando, no início de Agosto, tracei aqui no DO os cenários possíveis  resultantes das eleições do próximo dia 27, afastei a hipótese de reedição do Bloco Central e defendi que se o PSD vencesse as eleições, o governo não duraria mais de dois anos.
Nos últimos dias, multiplicaram-se as entrevistas  a “ilustres” do PS e do PSD admitindo a possibilidade de um novo Bloco Central. Não há fumo sem fogo, pelo que esta tentativa de reanimação de um “nado morto” deve estar a ser cozinhada nos bastidores, com a cumplicidade e empenho de alguém interessado nessa solução para o país.
Duvido é que ela  venha a concretizar-se com a dupla Sócrates/ MFL.
Se o PSD vencer as eleições e a única solução governativa for uma aliança com o PS, não acredito que Sócrates renuncie ao cargo de líder dos rosas, para viabilizar um governo presidido por MFL. Tão pouco me parece que MFL, vencendo as eleições, abdique do seu lugar, para entregar a chefia do Governo, por exemplo, a Rui Rio. Logo, se o PSD vencer as eleições, parece-me pouco provável um governo do Bloco Central.
No caso de o PS ser o vencedor, já me parece mais viável. Sócrates manter-se-ia à frente do governo e MFL – para alívio de muitos- iria tratar do netinho, deixando a outra figura do PSD a missão de dirigir a equipa governativa. Neste caso, a figura de Rui Rio poderia voltar a ser falada. Ora, nesse caso, os portuenses correm o risco de eleger no dia 11 de Outubro – por esmagadora maioria- um presidente de câmara que nunca chegará a exercer o seu mandato. Elisa Ferreira irá explorar esta hipótese durante a campanha eleitoral?

Uma coisa é certa: com ou sem  governo de Bloco Central, o Centrão  continuará a governar o país, como faz  há quase 30 anos. Logo, o essencial não muda. Muito por culpa de um Bloco de Esquerda autista, que insiste em manter-se afastado do poder, talvez receoso de vir a esboroar-se, no caso de aceitar responsabilidades governativas. Mas isso fica para outra análise...

Escrever direito, por linhas tortas

Carlos Barbosa de Oliveira, 31.08.09

Vasco Pulido Valente escreve um artigo no “Público” de sábado, onde minimiza o interesse dos programas eleitorais e, a partir daí, tira a ilação de que a escolha dos portugueses será feita com base na personalidade de Sócrates e MFL.
VPV escreve a determinada altura:
“MFL estabeleceu uma diferença entre ela e o engº Sócrates. Não se confundem. Nem no estilo, nem no carácter, nem na visão da sociedade, nem no que se propõem fazer.”
Não poderia estar mais de acordo. No entanto, se esses fossem os parâmetros de avaliação dos portugueses, Sócrates já poderia cantar vitória. Apesar de todos os defeitos  que se lhe reconhecem,  está a anos-luz de MFL.
Sócrates é mais consistente. É arrogante, mas não recorre sistematicamente ao insulto, nem passa o tempo a lançar a suspeição sobre os seus adversários políticos. Tem, apesar de tudo, uma visão da sociedade menos intolerante. Preocupa-se (pouco) com os mais desfavorecidos, mas não os despreza. Não enche a boca com declarações farisaicas de verdade e transparência, para  depois incluir nas listas de deputados gente com comportamentos cívicos (não estou a falar de questões judiciais) como o de António Preto. Não é cobarde. Quando vai à Madeira não se deixa humilhar, remetendo-se ao silêncio. Faz propostas para Portugal, não discorre sobre o vazio.
A diferença, objectiva, de carácter e estilo, é francamente favorável a Sócrates. A sua visão da sociedade portuguesa e as propostas que faz para o país são, apesar de tudo, bem mais consentâneas com as necessidades da sociedade portuguesa.
A explicação é simples. Sócrates acredita que está a fazer o melhor para Portugal. MFL quer o poder a qualquer preço e não faz a mínima ideia do que fará se o poder lhe cair nas mãos.
 

E a gripe, como vai?

J.M. Coutinho Ribeiro, 31.08.09

As notícias sobre o crescendo de casos de gripe A preocupam-me. É que eu conheço muitas pessoas, mas não conheço ninguém que tenha contraído a doença. E também não conheço alguém que conheça alguém que esteja com gripe A. E - entendamo-nos - conheço pessoas que estiveram de férias no México, no Algarve, em Londres e conheço pessoas que conhecem pessoas que estiveram em muitos outros sítios suspeitos. Nada, de nada, por mais que até conheça pessoas que, deitadas no meu sofá, estarreciam, pedindo-me que lhes lesse na net os sintomas, para ver se convergiam com o mal-estar. Nada, outra vez. Com estas e com outras, fico na dúvida: será que não conheço as pessoas certas, ou será que ainda vai sobrar para mim?

União de facto pior que gripe

João Carvalho, 31.08.09

O candidato recém-aliciado do PS Miguel Vale de Almeida dá hoje explicações no lugar do costume por causa de «alguma confusão noticiosa sobre o que disse ontem no Campus da JS em Santa Cruz». Ninguém sabe se foi a imprensa que não o compreendeu, se foi ele que não se fez explicar. Mas fez questão de deixar agora mais claro que «reduzir» o que quis dizer «a uma questão politiqueira entre o PS e o BE é coisa que não» lhe «interessa nem motiva». Designadamente, «porque bem mais importante é denunciar o projecto reaccionário do PSD».

Em suma: Vale de Almeida ainda não está no segredo dos deuses. Mas há-de estar. Mais tarde. Ou tarde de mais. Quando os seus novos amigos começarem a viver em união de facto com os tais «reaccionários». O Bloco Central ainda vai ser pior do que a gripe A.

Intuições que podem sair caras

J.M. Coutinho Ribeiro, 31.08.09

Já fiz tantas apostas de que o PS perde as próximas eleições legislativas, que, se a coisa corre mal, arrisco a insolvência. Ainda por cima, já não me lembro com quem apostei que o PSD ganharia as europeias, pelo que nem sequer posso opôr compensações. Mas há mais: meteu-se-me na cabeça que o resultado vai ser tão tortuoso, que o próximo PM vai sair do Porto, numa solução de emergência. Deliro?

O comentário da semana

Pedro Correia, 31.08.09

 

"Ao dizer que a ética é separada da política, Maquiavel, contrariamente à versão corrente do seu pensamento, não quer dizer que a política não tem ética, quer apenas dizer que o que faz um bom cidadão não é o mesmo que aquilo que faz um bom indivíduo, reflexão cujos contornos e implicações não podem ser explorados neste espaço. Não era a primeira vez que nos víamos diante de boas pessoas que não cumprem as leis do estado. Portanto, Paulo Rangel está enganado. Mas enganado está também Marques Mendes se considera que a legislação, que estabelece apenas limites para a acção, pode governar as acções e decisões individuais e ajuizar acerca da vida pessoal. Veja-se a Antígona, de Sófocles, para perceber que um bom cidadão, respeitador da lei, pode encontrar em si mesmo motivos que, pela sua superioridade moral, conduzem à violação das leis da comunidade. É esta imprevisibilidade da decisão pessoal que a lei, necessariamente generalizante, não contempla e ainda bem, pois, caso contrário, estaríamos diante de uma tentativa de generalização moralizante de costumes que depressa se transformariam em regras comportamentais, de mera adequação, coartando toda a criatividade pessoal. Para além disso, Marques Mendes esquece-se que somos todos inocentes, até prova em contrário, prova essa que depende de um juízo em tribunal.
Um exemplo que serve para ambos os casos, embora seja um exemplo-limite: durante o regime nazi, um bom alemão - leia-se, um bom cidadão do estado nazi - seria aquele que denunciaria os judeus às autoridades, estando legalmente estabelecido que essa seria a conduta apropriada; no entanto, poucos serão aqueles que consideram tal cidadão uma boa pessoa, pois a lei moral, por assim dizer, pode contrariar e sobrepor-se à lei da comunidade. Ora, se no caso da proposta de Paulo Rangel estamos diante de uma espécie de vale-tudo político, em que a ética é negligenciável, no caso da proposta de Marques Mendes arriscamos também a acabar com a ética, tornando-nos, no limite e em casos extremos a que se chega aplicando o seu raciocínio, marionetas do regime.
Resumindo: um partido pode e deve avaliar o nível de confiança política e pessoal que lhe merece determinado membro, funcionando aí como se de uma pessoa colectiva se tratasse, avaliando acerca do mérito de determinado comportamento. Um estado não pode, à revelia da sua Constituição e de um direito fundamental, legislar acerca do mérito ético do comportamento pessoal de um seu cidadão, pois o que está em causa, para o estado, é a violação ou não das leis que delimitam o que é possível ou não fazer, e não os modos de o realizar. Assim, se há suspeita, acuse-se, leve-se a tribunal, e logo se puna, se a culpa for provada. Caso contrário, os direitos de cada um devem ser respeitados, cabendo ao mesmo decidir e agir de acordo com o que pensa ser certo. É verdade que isto não é confortável, nem oferece soluções imediatas, mas a ética e a política não são, ao contrário do que para aí se vê praticar, uma espécie de matemática social, e assim evitam-se deslizes em rampas que, já se sabe, têm sempre tendência para inclinações acentuadas."

 

Do nosso leitor Miguel Pereira. A propósito deste meu texto. Imagem: Maquiavel

O seu blogue é viciante

Pedro Correia, 30.08.09

 

Ao contrário do que acontece noutros blogues, cheios de Gente Importantíssima que não passa cartão aos outros, aqui no DELITO DE OPINIÃO agradecemos as referências elogiosas que nos fazem e damos sequência às correntes que nos propõem. A mais recente é esta, destinada a distinguir as características "viciantes" do nosso blogue. Um prémio que nos foi dado por sete colegas da blogosfera que passo a enumerar:

 

As Minhas Leituras

Branco no Branco

Câmara dos Lordes

Direito de Opinião

Mátria Minha

O Bom Gigante

Palavrossavrvs Rex

 

Mandam as regras que, além do selo do prémio já posto ali em cima, enuncie também três objectivos a curto prazo. Aqui ficam:

1. Manter o blogue com estas características - aberto e plural;

2. Alargar o elenco de autores, sempre com a marca da qualidade;

3. Seguir em frente, sem prazo limite.

 

Falta passar a corrente a dez blogues que justificam o título de 'viciante', no bom sentido. São estes:

Deserto do Sara

Dias Assim

Esse Bandido

Estação Central

Grande Jóia

Lóbi do Chá

O Escafandro

O Homem do Leme

Página de Rosto

Ponteiros Parados

 

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