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Estas coisas acontecem de cem em cem anos. Ainda estávamos em Janeiro e discutia-se o processo de destituição do inquilino da Casa Branca. Nessa altura, muita gente escreveu que a morte de um general iraniano ia custar caro aos americanos, que no mínimo seriam expulsos do Médio Oriente. Tudo isto agora nos parece anterior à guerra anterior. No Irão, país comandado por gente do século XIV, morre-se à porta do hospital; já ninguém quer saber da campanha eleitoral na América, muito menos da independência da Catalunha; e já ninguém se lembra dos temas fracturantes que entre nós se discutiam com emoção (que temas eram esses, exactamente?). O mundo mudou e vai mudar ainda mais: muitos vão defender os muros que ontem criticavam, seja para migrantes sírios ou turistas espanhóis; muitos vão condenar os políticos que ontem consideravam geniais ou indispensáveis; muitos vão pedir mais segurança, mais distância em relação aos outros, mais repressão de comportamentos irreflectidos, menos tolerância para açambarcadores e outros parasitas. Depois, a grande vassoura da opinião pública vai remover os governantes que falharam e será reconstruida uma economia menos dependente da globalização, das fábricas chinesas e das decisões dos burocratas de Bruxelas.