Convidado: NUNO GOUVEIA
Socialismo moderno
Existe uma velha cartilha ideológica que diz que a esquerda é amiga dos pobres, enquanto a direita, essa maléfica trupe de malfeitores, defende apenas os ricos e os capitalistas. Este simplismo ideológico, que muito boa gente genuinamente acredita e defende, tende a dificultar um debate sério sobre o desenvolvimento de uma sociedade. Claro que em países politicamente maturos esta cartilha não é tão evidente no debate público. Mas em Portugal, onde o partido mais à direita se chama Centro Democrático Social e o grande partido de centro-direita é o Partido Social Democrata, esta divisão adultera muitas vezes o debate. Se tentarmos explicar que o que existe são projectos diferentes para a sociedade, com a direita a acreditar mais no papel dos cidadãos e dos privados como motor do progresso económico e social, rapidamente nos chamam de neoliberais (esse fantasma que ninguém percebe muito bem o que é) e nos mandam calar. O Estado, na direita que eu acredito, tem um papel importante na regulação da sociedade, no estabelecimento de rigor na vida pública e também na ajuda aos mais desfavorecidos e desafortunados.
Mas a realidade é perversa e muitas vezes encarrega-se de desmentir estas falsas visões. Nada melhor que olhar para actuação do governo socialista para desmentir esta visão simplista. E nem é preciso dizer que na última década e meia, quase sempre governados por socialistas, os portugueses viram o seu nível de vida agravar-se, com a classe média a viver pior e o número de pobres a aumentar. Mas prefiro analisar políticas concretas.
Nas suas políticas de controlo das contas públicas, e contrariando o defendido pelos partidos do centro-direita, o PS apostou numa sobrecarga fiscal (desde 2005 que os impostos têm subido de forma ininterrupta), e nunca cortou na despesa do Estado, a grande responsável pela situação deplorável das contas. Mais grave ainda: nos últimos meses, ao abrigo das políticas de austeridade, têm sido cortados apoios essenciais para os mais desfavorecidos, em contraste com a manutenção dos grandes elefantes brancos do Estado: as fundações inúteis continuam intocáveis, o desperdício corrente da Administração mantém-se e os luxos execráveis, como a compra de 900 automóveis, não param. A opção politica foi outra: além de um novo aumento de impostos, cortou-se nos apoios aos desempregados, numa altura em que já representam mais de 10 por cento da população. E este mês soube-se que as bolsas para o ensino superior vão baixar no próximo ano. Este assunto toca-me particularmente, pois desempenhei funções enquanto estudante no Conselho de Acção Social da minha Universidade e conheço de perto a realidade dos alunos bolseiros. Segundo números do Administrador de Acção Social da Universidade do Minho (uma das zonas mais afectadas pela crise) no próximo ano cerca de 50 por cento dos alunos bolseiros podem ficar sem acesso à bolsa com estas novas regras. Ora digam-me se isto é de quem se preocupa com os mais pobres?
As soluções defendidas pelo centro-direita só podem divergir desta lógica socialista, que tudo pretende controlar através do Estado, que interfere em tudo o que mexe na sociedade civil, mas que em momentos de aperto e de crise não se recusa em cortar apoios substanciais às classes desfavorecidas, apenas para manter as regalias de um Estado forte e omnipotente. A alternativa terá de surgir por libertar a sociedade do estado, mantendo uma rede de ajuda aos mais precisam; não para estes se encostarem ao Estado, mas para evoluírem e se reerguerem. Este deverá ser o caminho para Portugal. Veremos se ousamos segui-lo.