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Delito de Opinião

Foi um ar que lhe deu

Sérgio de Almeida Correia, 21.07.10

A bizarra proposta de revisão constitucional apresentada por Passos Coelho, ou mero ante-projecto como entretanto já passou a ser, num fogacho ficou em fanicos.

Se não fosse suficiente para perceber a monstruosidade do erro o que dentro do próprio PSD se disse logo, começando em Paulo Rangel, passando por António Capucho e Marcelo Rebelo de Sousa, e terminando em Alberto João Jardim, a conversa que ontem Mário Crespo teve com o Prof. Jorge Miranda foi bem elucidativa.

Com a autoridade, a independência e a abertura de espírito que sempre o caracterizaram, o constitucionalista arrumou com quaisquer dúvidas sobre a inoportunidade e o disparate jurídico que constituiria a proposta de revisão avançada. Pena é que a totalidade da intervenção do Prof. Jorge Miranda não esteja integralmente disponível no site da SIC-N, visto que isso permitiria compreender melhor os argumentos.

É evidente que o texto constitucional não é imutável, não é um monólito que está ali para ser venerado pelos portugueses. Mas se na sua essência ele tem correspondido ao que dele se esperava, se tem servido e servido bem a causa da democracia e se não é por via dele que o país não funciona ou funciona mal, por que razão se haveria de mexer nele agora e da forma que Passos Coelho pretende fazê-lo?

Como bem salientou Jorge Miranda, com tanta preocupação em mudar deixaram ficar o socialismo no preâmbulo.

Se é preciso rever a Constituição, embora eu pense que esse não seja o problema do país, nem como referiu Jorge Sampaio isso seja prioritário, então que isso seja feito com tempo, reflexão, discussão e ponderação, e não ao estilo sangria desatada e meia-bola e força.

Os últimos exemplos de revisões de textos legais (Processo Penal, Processo Civil, Código Civil, Código Penal, etc)  demonstraram que a pressa é má conselheira e dá sempre mau resultado, em especial quando feita por quem não domina a matéria. Já bastou o exemplo de Celeste Cardona com a reforma da acção executiva, erro que ainda hoje estamos a pagar com juros elevadíssimos. 

Seria bom que a Constituição não se transformasse num regulamento de empresa destinado a servir a incompetência de alguns gestores e políticos medíocres, que à falta de melhores argumentos encontram nas sucessivas revisões constitucionais que promovem a razão para as imerecidas tenças que recebem.

Da maneira como foi apresentado e pelas reacções que já gerou, não tenho dúvidas de que o ante-projecto (este) acabará no local que merece e lhe está desde já destinado: o cesto dos papéis. 

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