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A gripe A tem sido a grande figura mediática do Outono. Os vírus, como algumas pessoas, ganham protagonismo não pela sua capacidade técnica ou intelectual, mas pela forma como se insinuam e conseguem passar a sua mensagem junto da comunicação social. Foi o que aconteceu com o vírus da gripe A. Sendo menos letal do que o vírus da gripe sazonal, ganhou mediatismo graças à prodigiosa capacidade de contágio, que pôs a Organização Mundial de Saúde em alerta e a indústria farmacêutica com os cofres a abarrotar.
Acontece o mesmo com algumas pessoas. Sendo medianamente competentes , conseguem alcançar um lugar mediano que lhes permite exercer, de forma tentacular, a sua influência. Vão ganhando prestígio e poder até se transformarem em vírus disseminadores da corrupção.
Foi este vírus que espalhou pelo mundo a gripe C. De crise. A gripe C é muito mais letal do que a gripe A. Ao longo deste ano condenou milhões de pessoas a uma morte lenta, atirando-as para o desemprego, de onde não sairão até ao fim das suas vidas. O vírus da gripe C é sádico. Não mata, mas infecta, sujeitando as vítimas a um sofrimento terrível: desemprego, miséria e fome. Não provoca uma doença física, mas uma doença moral que mina toda a sociedade. A competência deste vírus não deixou dúvidas a ninguém e a crise por ele desencadeada foi anunciada como sendo a mais grave desde 1929. Não admira, por isso, que tenha estado no centro das atenções do mundo inteiro durante quase um ano.
Entretanto, os governos descobriram a vacina contra o vírus da gripe C. Para o combater, injectaram dinheiro dos contribuintes nos agentes disseminadores: os bancos. Os contribuintes reagiram mal, quando souberam que teriam ser eles a pagar a vacina. O ambiente social ameaçava entrar ebulição, quando se deu o milagre.
Corria a Primavera para o fim, no hemisfério norte, quando o México anunciou que um vírus turista desembarcara em Cancún e lançara o pânico e a morte entre a população local. De imediato o centro das atenções desviou-se para este novo agente. As doenças físicas exercem sempre maior atracção sobre os media do que as doenças morais. São mais visíveis as suas características e os seus efeitos mais devastadores e espectaculares. Por isso os media se agarraram a ela com unhas e dentes. Mostrar cadáveres é muito mais emocionante do que falar de cidadãos enfermos.
Chegado o Outono ao hemisfério norte, sendo o número de mortes provocados pela gripe A insignificante,as notícias centraram-se nos seus potenciais efeitos devastadores. Simultaneamente, era anunciado que a gripe C dava fortes indícios de rápidas melhoras. Sintomas da convalescença? As bolsas recuperam,os governos continuam a injectar dinheiro nos bancos, para que os administradores possam continuar a receber vencimentos principescos,à custa do dinheiro dos contribuintes, e renova-se o apelo à moderação salarial.
Obviamente, as notícias de recuperação da crise são manifestamente exageradas. Assim como nenhum doente recupera de uma doença gastro-intestinal, comendo feijoada e caril todos os dias, também nenhuma crise financeira pode ser debelada se os seus agentes continuarem a ser premiados com salários indecorosos pagos pelos contribuintes. Não se recupera de uma doença grave com recurso às mèzinhas das receitas tradicionais: fortalecendo vírus (os bancos e o grande capital) e mantendo os doentes à míngua, com salários baixos.
Com este receituário, a convalescença da crise é uma quimera. Uma recaída (esperada) poderá fazer o mundo entrar em coma profundo. É preciso fazer alguma coisa, antes que seja tarde mas, por agora, a única notícia boa é que o vírus Blair – ideólogo da mentira, do nihilismo da Terceira Via e um dos grandes responsáveis pelo retrocesso da Europa - foi afastado da corrida à presidência europeia. Paz à sua alma.