Assim tudo se tornou mais fácil para a AD
Isto foi um golpe baixo: Sócrates, ao revelar em quem tinha votado, facilitou a vida à Aliança Democrática. Montenegro pode agradecer-lhe este contributo para o resultado.
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Isto foi um golpe baixo: Sócrates, ao revelar em quem tinha votado, facilitou a vida à Aliança Democrática. Montenegro pode agradecer-lhe este contributo para o resultado.
O sossego da pacata Ericeira foi perturbado ao fim da tarde de ontem. José Sócrates desceu do primeiro andar à porta da casa de empréstimo onde há vários anos vive amesendado e dispôs-se a responder às perguntas dos repórteres que ali se encontravam. Queriam obter uma reacção do antigo primeiro-ministro à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de levá-lo a julgamento por três crimes de corrupção, 12 crimes de branqueamento de capitais e seis crimes de fraude fiscal. Vitória clara do Ministério Público, derrota sem paliativos do juiz Ivo Rosa.
O "animal feroz", fiel à sua imagem de marca, não ocultava a irritação. Quando um jornalista lhe fez uma pergunta usando o vocativo "você", reagiu de imediato: «Não diga você! Trate-me por senhor.» O jovem assim fez. Daí a momentos, Sócrates dirigiu-se a ele tratando-o por "você", já esquecido da regra que ditara pouco antes. A cortesia de linguagem, na versão socrática, funciona em sentido único.
Arrogância e soberba, denotando tique de classe. Mitómano imaginando-se membro de casta superior. No ancien régime comportar-se-ia como senhor feudal, impondo direito de pernada aos súbditos mais tementes.
Nada menos socialista. Mas também é verdade que o "senhor Sócrates" rasgou o cartão de militante do PS. Cortou o mal pela raiz: agora já ninguém lhe chama camarada.
Passam hoje exactamente nove anos sobre o dia em que "O Senhor Engenheiro José Sócrates" (Eduardo Lourenço dixit) foi detido, vítima de um ataque "justicialista" do Ministério Público - a crer-se na interpretação do seu correligionário Ferro Rodrigues, ex-presidente da Assembleia de República. Felizmente que a intentona do aparelho judicial não foi bem conseguida, pois todos estes anos decorridos ainda não houve julgamento.
De qualquer forma urge pôr o tal Ministério Público "na ordem", como defende o actual presidente da Assembleia da República, Santos Silva, homónimo do amigo do actual vice-presidente do Parlamento Europeu, um tal de Silva Pereira. O tipo que na lista de candidatos estava atrás (apesar de, pelos vistos, ser deputado mais importante) da mulher do Vital Moreira, esse antigo cabeça-de-lista de Sócrates. Esse que também quer pôr o Ministério Público bem ordenado...
Mas, e repito-me, temos de nos congratular. Pois, pelo menos, o "Senhor Engenheiro José Sócrates" ainda não foi julgado pelos "justicialistas".
Nos governos de Sócrates houve uma constante defesa daquele líder, independentemente do que era tão óbvio. Nisso se afadigaram militantes do PS, e basta recordar as maiorias "albanesas" que Sócrates obtinha nos congressos do partido. E também os simpatizantes foram "activistas" produtores da nuvem de fumo que pretendia esconder a malandragem governativa. E não seria necessário recordar esse período não fosse ter vária dessa gente transitado para os governos de Costa, como Fernando Medina ou Augusto Santos Silva - esse que agora vai ao Conselho de Estado afirmar que é necessário "pôr em ordem o Ministério Público", e que foi o único governante socialista que gozou a população por causa do escândalo do socratismo, ao dizer-se "parolo" por não ter percebido o detalhe do seu homónimo e alegado "financiador" do neto do volframista, nisso tanto demonstrando o seu desplante avesso à democratização do país. Ou recompensados com tenças em Estrasburgo/Bruxelas, como o braço-direito Silva Pereira, ou Marques e Leitão Marques. E também muitos desses militantes e ou simpatizantes, então, pois mais jovens, apenas frenéticos publicistas do socratismo, ascenderam ao governo, como o célebre Galamba ou o agora mui mudo Adão e Silva.
Tendo regressado ao poder, após o hiato da gestão da quase catastrófica crise financeira global, o PS de Costa tentou barrar o processo ao socratismo. E o afastamento de Marques Vidal da PGR foi o caso mais sonante, no fundo uma manobra desse desejado "pôr em ordem o Ministério Público", para além de todas as manobras de controlo da comunicação social - e será de lembrar que chegaram ao ponto de nomear como responsável da informação do serviço público uma prima de Costa, que se viu obrigada a demitir-se tais práticas teve nesse posto. Depois, tão insuportável era o conúbio com a imagem de Sócrates que o PS decidiu dele se apartar, deitar borda fora aquele lastro para resistir à tormenta: o ardil foi simples, em dias consecutivos num final de semana, o presidente do partido Carlos César, a célebre Câncio, renomada publicista socratista, e Galamba, então mero deputado e criatura de Sócrates, vieram demarcar-se publicamente do ex-primeiro-ministro.
Assim enviado o fedorento cadáver político às revoltas águas da Ericeira o PS de Costa seguiu livre no poder. Entre inúmeros - e tantos deles patéticos - "casos e casinhos" a pax costista estabeleceu-se. Primeiro com o apoio dos partidos comunistas, seduzidos por algumas prebendas redistribrutivas para as suas bases e clientelas. E depois sozinhos, por quatro anos, que nos habituássemos nós. Grosso modo, as pessoas eram as mesmas, as práticas são as mesmas, as diferenças virão apenas dos trejeitos individuais.
Na passada semana "o modo português de ser socialista", para glosar Gilberto Freyre, sofreu um KO técnico. Ontem, António Costa reergueu-se e veio ao ringue apresentar a "narrativa" que o PS procurará apresentar aos seus fiéis e restantes adeptos, temerosos do que a malvada "direita" lhes fará. No fundo Costa apresentou-se como epígono de Isaltino de Morais, num trinado um pouco diferente: "temos dinheiro nos gabinetes mas fazemos".
Caberá aos jornalistas, a politólogos ou mesmo a historiadores da contemporaneidade o elencar com detalhe a miríade de "casos e casinhos", e suas articulações, destes oito anos. Para a sua compreensão será muito produtivo associá-los ao acontecido nos governos do anterior primeiro-ministro socialista. E, para uma visão mais "antropológica" - mais estrutural, por assim dizer - julgo que será relevante fazer recuar esta análise ao historial da administração socialista de Macau, molde que foi do modus faciendi das posteriores gerações de políticos daquele partido. Cujos últimos restantes agora (definitivamente?) colapsam.
Trata-se de um partido de gentes que já há mais de vinte anos estavam incapazes de rebelarem contra os presidentes Soares abraçado ao fugitivo Craxi, ou Sampaio abraçado a Abílio Curto, sempre em nome de uma tal de "amizade". Ou seja, o que hoje se passa não é um momento, é sim fruto de uma mundividência colectiva, predominante naquele partido. Sendo assim, o PS não se regenerará, sofre de necrose política. Estuporado diante da visão de Madrid é incapaz de sopesar, e nisso actuar sobre si mesmo, o que aconteceu aos seus congéneres de França, Grécia, Itália... Pois o problema não é "Costa", é tudo aquilo. E, para mal dos nossos muitos pecados, diante de toda esta decadência temos o pior presidente da República do nosso regime, o mais incompetente pois o mais ininteligente, uma total inadequação sobre a qual me repito desde há muitos anos. É assim necessário sublinhar isto: estamos muito mal entregues. Pois assim o votámos.
Entre a incessante série de comentários recebidos sobre a actual situação escolho divulgar estes três. Porque dizem tudo o que é básico sobre a torpe "narrativa" que António Costa quer legar ao seu partido.
Ver esta publicação no InstagramUma publicação partilhada por Sandra Felgueiras (@sandrafelgueiras_oficial)
Segundo o Expresso, o julgamento do ex-primeiro-ministro está paralisado devido a uma falha do atual Governo.
Entretanto, em 2024 alguns dos crimes de que é acusado, irão prescreve.
Estou certo que os mais convictos apoiantes do poder socialista justificarão esta falha como resultado da incompetência que já assistimos em tantos outros casos, e não a um propósito deliberado.
Eu acho que os socialistas no poder são muito incompetentes mas, antes disso, têm também um forte sentido gregário de protecção mútua. Por isso, atrevo-me a afirmar que se António Costa não dissesse o que disse quando visitou Sócrates na prisão (que ele era um lutador naquilo que acreditava ser a sua verdade – a frase politicamente mais mortífera da última década), agora não lhe poderia fazer “o jeito” de o poupar a um julgamento.
Pelo caminho António Costa já o acusou de “aldrabar” o PS. Para o partido que tomou o poder em Portugal, essas afirmações serão o julgamento que conta. E que a justiça dos plebeus não se atreva meter o bedelho onde não é chamada.
Foto: DR
A ala "abrantina" do Governo Sócrat... perdão, do Governo Costa acaba de ser muito reforçada com esta (cof, cof...) "remodelação governamental".
Tem tudo para dar certo. Do ponto de vista das oposições.
Caetano Veloso - Sozinho (Ao Vivo No Rio De Janeiro / 1998)
Numa campanha marcada pelo contínuo desfile de animais, talvez devido à acção pedagógica do PAN, aquele que mais deu nas vistas acabou por ser um elefante. Plantado num local nada cómodo para António Costa: a sala de visitas do PS. Roubando espaço de manobra ao líder socialista e lembrando-lhe um passado que ele queria varrer para debaixo da alcatifa.
José Sócrates ressurgiu faz hoje oito dias, em longa entrevista nocturna à CNN Portugal. Quando Costa ainda batia no peito a pedir maioria absoluta. O conselheiro que o persuadiu a adoptar tal estratégia não podia estar mais equivocado.
Exibindo aquele ar de quem anda sempre de mal com o mundo e sente um desprezo sem fim por quantos não lhe alimentam o ego, o autoproclamado «animal feroz» deu um ralhete público ao seu antigo ministro da Administração Interna, que com ele trabalhou entre 2005 e 2007.
«O único conselho que eu daria a quem quer uma maioria absoluta: talvez devesse começar por não desmerecer a única que o PS teve na sua história, aquela que eu tive em 2005.» Eis Sócrates igual a si próprio: não esquece um agravo, considera-se traído por Costa e consegue usar o pronome “eu” duas vezes na mesma frase.
Como se não bastasse, insistiu: «Talvez fosse melhor começar por não pôr em causa a história do PS, que teve um momento muito importante em 2005.»
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, 64 anos, conseguiu irritar o secretário-geral socialista ao romper o silêncio em plena campanha eleitoral. Na manhã seguinte, confrontado pelos jornalistas que lhe pediam uma reacção à entrevista, Costa não escondia o desagrado. «Não tive oportunidade de ver», reagiu secamente. E seguiu adiante. Tinha o dia estragado. Nada lhe podia agradar menos, nesta romagem às urnas em que disputa cada voto, do que surgir associado à era socrática.
Felizmente para ele, Sócrates deixou claro não ter hoje «nenhuma relação com a direcção do PS» e lembrou que já devolveu o cartão de militante: «Decidi abandonar o partido para preservar a minha dignidade.» Mas revelou que ainda se sente integrado na família socialista, mantém muita gente amiga nas listas eleitorais e continuará fiel ao emblema quando assinalar a cruz no boletim de voto. E rematou, com um esgar de desdém: «O PS não é António Costa.»
A aparição de Sócrates na campanha, entrando como fantasma hamletiano pela porta das traseiras, não podia ter ocorrido em pior momento para alguém que promete confiança e credibilidade aos portugueses. Costa, político com instinto apurado, percebeu de imediato que devia abandonar a reivindicação da maioria absoluta – associada pelos eleitores àqueles anos em que ele se sentava no Conselho de Ministros presidido pelo mais mediático arguido da Operação Marquês. Assim fez: não voltou a aludir ao tema.
A partir daí apenas Pedro Nuno Santos, integrado na caravana socialista em Espinho, insistiu na tecla reivindicando «a maior maioria absoluta que pudermos». Parecia falar com entoação irónica, mas só ele poderá esclarecer.
Texto publicado no semanário Novo
Primeiro andamento:
«O que me ofende são algumas afirmações que por aí vejo, de gente... aliás alguns deles próximos de mim, que acham que eu andei a inventar que a minha família tinha posses que nunca teve, que o meu avô não era um homem rico, que nunca trabalhou no volfrâmio, que nunca enriqueceu no volfrâmio. Eu apresentei ao juiz a prova. Fui buscar as escrituras das partilhas da herança da minha mãe feitas nos anos 80. Para provar que a minha família tinha recursos, que a minha mãe era uma mulher rica, uma mulher que tem três heranças nos anos 80.»
«A minha mãe teve um conjunto de heranças que sensivelmente, pelos cálculos que podemos hoje fazer... de cerca de um milhão de contos.»
«A minha mãe teve sempre um cofre em casa, toda a vida. Toda a gente sabia.»
«O meu avô era um homem muito rico, era um homem de muitas posses.»
Segundo andamento:
«O engenheiro Carlos Santos Silva fez-me empréstimos em 2013 e 2014.»
«Em 2013 o engenheiro Carlos Santos Silva ofereceu-se para me ajudar porque eu estava a viver em Paris. Decidi ir para Paris para estar com os meus filhos, para fazer um mestrado e para que os meus filhos concluíssem o seu ensino secundário numa escola estrangeira. Não foi nenhuma vida de luxo. Foi um investimento na minha educação e na dos meus filhos. E o engenheiro Carlos Santos Silva decidiu financiar-me, ajudar-me nisso.»
«Estes empréstimos totalizam 560 mil euros.»
Excertos da entrevista que José Sócrates deu ontem à TVI
Tudo se resume a uma única palavra: medíocre.
Medíocre a governar, medíocre a liderar o partido, medíocre a mentir, medíocre a defender-se.
Mas talvez não tão medíocre como os que o guindaram à posição que atingiu, o seguiram acefalamente dentro do partido, ainda lá estão como se nada tivesse sido com eles, e o protegeram até ao fim.
MERCADEJAR, definição:
«Negociar; comerciar; traficar» (Dicionário Porto Editora)
«Auferir rendimento ou benefício de forma ilegal = traficar» (Priberam)
Na passada sexta-feira não ouvi o juiz Rosa. Li breve sinopse do que ele proferiu. Peço que me corrijam se o incompreendi: Rosa constatou que o antigo PM e ex-secretário-geral do PS é culpado de crimes de corrupção já prescritos e enviou-o para tribunal como réu devido a crimes económicos cometidos enquanto Primeiro-Ministro. Isto é uma verdadeira bomba, um escândalo!
Os agentes do socratismo, os videirinhos a la blog Jugular, atrevem-se agora a gargalhar na internet e a clamar que se desmontou uma incompetente cabala. E até as raríssimas vozes socialistas então menos atreitas a Sócrates limitam-se a criticar a Justiça. Elidem, totalmente, este escândalo. E a cumplicidade do seu partido, de militantes e dirigentes, e dos inúmeros opinadores públicos (académicos e jornalistas em especial) com aquele miserável período. Pois em termos estruturais o pior nem foi a corrupção instalada no poder - algo recorrente em qualquer regime. Mas sim a penosa corrupção do espaço público, feita de cumplicidade e de conivência. Instalada, repito, na Academia e na Imprensa. E estas sonsas reacções mostram como isso não mudou, como essa gente, moles de dependentes, está "pronta para outra"...
Tudo isto é doloroso. Mas temos que sofrer estes nossos compatriotas. Têm o direito de assim serem, por miseráveis que sejam. Mas já diferente é aceitar que uma estadista estrangeira, ex-presidente de um país aliado, se venha intrometer na nossa vida nacional apoiando um réu de tamanho calibre. Que escumalha esta Rousseff.
Se todos os juízes fossem como Ivo Rosa, os advogados ficavam no desemprego. Ser defensor de arguidos em tribunal tornava-se profissão inútil.
Os adeptos de Sócrates irão comemorar a sua vitória. Em plena pandemia espero que a polícia impeça estas cenas, que potenciarão as infecções. Quanto ao resto, ao traste ex-PM, seus cúmplices e coniventes, mais os avençados? Continuam aí, a mandar.
Faz agora dez anos, o primeiro-ministro José Sócrates, pressionado pelo ministro das Finanças e vergado pela força das circunstâncias, anunciava ao País um pedido urgente de intervenção estrangeira para salvar in extremis as contas públicas em derrapagem alucinada.
Quarenta e oito horas antes, havia jurado aos portugueses, pela enésima vez, que não solicitaria ajuda das instituições financeiras internacionais. Cedeu no dia seguinte, perante um ultimato em uníssono dos banqueiros, protagonizando um dos rumos mais erráticos na política nacional dos últimos 45 anos. Quando a nossa credibilidade externa valia zero.
Seis anos depois de chegar ao Governo, e prestes a cessar funções, legava aos compatriotas um cenário arrasador: a mais alta carga fiscal de sempre, a maior dívida pública, o mais elevado défice externo, a maior taxa de desemprego, o estado social à beira do colapso. Fizera da mentira um instrumento político permanente, deixando o país em dupla bancarrota: financeira e moral.
Feridas que levaram anos a sarar. Mas nem todas: algumas permanecem entre nós. E podem reavivar-se enquanto os seus herdeiros espirituais andarem por aí.
Não há primeiro de abril em que eu não me lembre deste senhor.
Deixo aqui uma sugestão dirigida ao sempre seu fiel clube de fãs “José Sócrates Sempre”. E que tal o lançamento das bases para o regresso às luzes da ribalta do seu adorado ídolo?
Na senda da credibilidade de outros movimentos que têm surgido nestes tempos de pandemia, sugiro um nome vencedor. Mentirosos pela verdade. Tinha tudo para vencer.
O jornal Sol publicou isto na primeira página de hoje:
O que temos aqui é um dos mais óbvios exemplos do problema de titular entrevistas com frases fora do contexto: José Sócrates disse aquilo como censura - ou como elogio? Assim pendurada no ar, a frase até parece sugerir a primeira hipótese. Contudo, conhecendo nós o historial de Sócrates como o conhecemos, só é possível interpretá-la como um arrebatado elogio.
(Agora a sério: se é de uma enorme cara-de-pau Sócrates criticar, com tal argumento, este PS que o renegou quando caiu nas redes da Justiça, também foi de uma enorme cara-de-pau a demarcação por este PS que "nunca viu nada" nos anos em que o aclamava.)
Juan Carlos em 1975 com o filho, o actual Rei
Dizem-me que alguns dos mais estridentes defensores de José Sócrates no espaço mediático, que nunca cessaram de proclamar a presunção de inocência do antigo primeiro-ministro, encontram-se agora entre os que negam esse mesmo direito constitucional ao Rei emérito de Espanha.
Tomam as imputações feitas ao pai do actual monarca por uma notória trampolineira social como se fossem verdades absolutas, jamais as questionando, e apressam-se a condená-lo na praça pública.
Negando a Juan Carlos o que sempre reclamaram para Sócrates.
Duplicidade de critério, dupla moral - admitindo que existe alguma. Dois pesos e duas medidas. Para esta gente, a presunção da inocência cai à medida das conveniências políticas do momento e da trincheira em que se instalam.
Gostem ou não gostem, o emérito não foi constituído arguido, sobre ele não pesa qualquer acusação, tem todo o direito de se deslocar para onde entender e de fixar residência sabe-se lá onde.
Algumas carpideiras poderão acusá-lo de ser mulherengo e trair os votos de fidelidade conjugal feitos à Rainha Sofia, sua legítima mulher desde 1962.
Convenhamos que é uma crítica repassada de moralismo passadista, além de uma invasão da esfera íntima do cidadão Borbón. Aliás também aqui sujeita a duplo critério analítico: não me recordo de ouvir os queixumes destas beatas quando o antigo Presidente francês François Mitterrand foi a enterrar na presença simultânea da esposa, da amante e da filha adolescente nascida fora do longo e aparentemente feliz enlace conjugal com Danielle Mitterrand.
Sobra a questão do regime.
A esquerda radical, aliada aos separatistas catalães, pretende transformar um suposto caso de ilícito penal e tributário associado ao pai de Filipe VI em pretexto para proclamar a república. Parece-me algo tão absurdo como se os norte-americanos tivessem aproveitado em 1974 o caso Watergate, que levou à demissão de Richard Nixon, para iniciarem uma acalorada discussão em torno da forma de Estado, admitindo a instauração da monarquia nos EUA.
Acresce que a república esteve sempre associada ao pior da vida política espanhola nos dois curtos períodos em que vigorou, acabando por morrer de implosão. Na primeira versão durou 22 meses, entre Fevereiro de 1873 e Dezembro de 1874. Na segunda, decorreu entre Abril de 1931 e Março de 1939, embora sobre a totalidade do território espanhol só até Julho de 1936, quando eclodiu a guerra civil, que partiu o país ao meio.
Não deixou saudades em qualquer dos casos.