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Delito de Opinião

Os melhores filmes de 2012 - parte 2

José Navarro de Andrade, 28.12.12

Com a notória excepção das comédias românticas, e por vezes nem essas escapam, impressiona o facto de todos os filmes americanos serem sempre tão marcadamente políticos. Nem é preciso referir os casos evidentes dos dramas jurídicos, ou militares, ou detectivescos, ou policiais – o comentário institucional faz parte do DNA do cinema americano.

Ainda assim, atrevo-me a votar em “Being there” (“Benvindo mr. Chance” em português) como o melhor, e de certeza o mais premonitório, filme político de sempre. Peter Sellers interpreta supinamente o jardineiro de mente simples como uma criança, que nas voltas do enredo acaba consagrado como um formidável comentador político. Ao dizer na televisão coisas tão profundas como “First comes spring and summer, but then we have fall and winter.”, levanta um vendaval de análises, porque ninguém deixa de ver profundas alegorias no que ele profere literalmente.

Até este Dezembro de 2012 nunca entendi por que razão o realizador Hal Ashby arruína o filme com o plano final em que Chance caminha sobre as águas. Mas ao ver a prodigiosa esparrela do sr. Artur Baptista da Silva fez-se-me luz: o cineasta queria salvaguardar com aquele plano o carácter ficcional da sua obra, não fosse a realidade superar o resto.

Um sintoma.

Luís Menezes Leitão, 24.12.12

Este caso é um sintoma do estado do nosso país. Quando nos anos 60 Portugal travava uma guerra colonial sem sentido, o regime dizia que não tínhamos outra alternativa e que o mundo acabaria por nos dar razão. O mundo, porém, deixava-nos completamente isolados. Precisamente por isso quando houve uns pândegos que se resolveram mascarar de sheiks árabes em visita ao país foram recebidos pelas mais altas instâncias nacionais e objecto de grande cobertura mediática. Depois o país descobriu estupefacto que tudo não passava de uma brincadeira e que os verdadeiros árabes não nos ligavam absolutamente nenhuma.

 

Hoje o país trava igualmente uma guerra perdida, sendo que os resultados do combate ao défice que são anunciados correspondem a derrotas sucessivas. Mas mesmo assim o Governo prossegue inabalável até ao colapso final. O país sonhava por isso que aparecesse alguém com credibilidade internacional a chamar a atenção do Governo para os riscos em que estava a colocar o país e o sofrimento que causava às pessoas. E nestes casos há sempre alguém disposto a aproveitar a oportunidade, bastando invocar uma qualquer pertença internacional, que os indígenas acolhem-no veneradamente. Para isso as Nações Unidas eram o organismo ideal. Assim, se alguém aparecesse a dizer que vinha da ONU a avisar da preocupação do organismo com o estado do país, naturalmente que teria tempo de antena e exigir-se-ia que o Governo o ouvisse. E se ele dissesse que tinha uma tropa de capacetes azuis pronta a invadir Portugal para pôr o Governo na ordem, continuariam a dar-lhe o mesmo crédito.

 

Como nos anos 60, o país acaba assim a descobrir que as Nações Unidas também não ligam nada a Portugal e que o país vai afundar-se completamente sozinho. O que é grave é que esta credulidade é um péssimo sintoma do actual estado dos portugueses.