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Delito de Opinião

O país atávico no país moderno

Pedro Correia, 21.06.17

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 Foto: Rafael Marchante/Reuters

 

O país das startups, da Web Summit, das ciclovias citadinas, do partido dos animais, dos chefs da moda, dos quarenta e tal novos hotéis lisboetas, despertou por estes dias para um horror atávico que o pôs no mapa da imprensa mundial pelos piores motivos. Desta vez não por ser um dos "mais bem guardados segredos turísticos" em foco nas publirreportagens de revistas elegantes mas por não conseguir poupar vidas humanas quando a inclemência da natureza - eventualmente associada à incompetência humana - lhe bate à porta.

É um país ainda demasiado semelhante ao das inundações de Novembro de 1967, tragédia sem nome que vitimou centenas de pessoas e nem a férrea censura salazarista conseguiu silenciar.

 

É o país modernaço, das dez mil rotundas e dos cento e cinquenta pavilhões municipais e dos dez estádios construídos de raiz ou totalmente remodelados para o Europeu de futebol. O país onde a palavra modernidade provoca contínuos suspirinhos de comoção. O país que continua demasiado dependente da bondade de estrangeiros para sustentar necessidades básicas e um número incontável de vícios. O país que quer continuar a atrair turistas enquanto descura o património histórico e reduz a cinzas boa parte do seu património natural.

Um país sempre tão sujeito à avaliação externa, submergido por estes dias com títulos como Portugal, a Country Helplessly Prone to Forest Fires (no New York Times), Portuguese wildfires: early warnings hindered by damaged phone lines (no Guardian), Le Portugal en proie aux incendies meurtriers (no Le Monde), Incendie au Portugal: après les larmes, la colère (no Figaro), Crecen las dudas sobre la gestión del incendio de Portugal (no El País), Caos en el mayor incendio de la historia de Portugal: 64 muertos, un avión fantasma y 27 aldeas evacuadas (no El Mundo).

 

São títulos que parecem falar-nos de outro país, assombrado pela impotência face à calamidade.

Mas não: falam-nos deste. Do nosso.

4 comentários

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    Pedro Correia 21.06.2017

    O que o Governo tem de fazer é assumir responsabilidades pela tragédia ocorrida, explicar muito bem explicado o que aconteceu e garantir todas as condições, legislativas e logísticas, para que este drama não se repita. Um drama que mergulhou a nação portuguesa no luto e nos envergonhou perante todas as nações civilizadas.
    Se tiver de haver demissões, que haja. A culpa não pode morrer solteira. Nunca mais. É uma elementar exigência de cidadania.
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    V. 22.06.2017

    Para mim tanto faz, não tenho grande esperança noutros políticos mesmo que estes fujam para o Brasil. O que receio é que vão ainda estragar o que resta do campo e da floresta, porque esta gente não consegue meter a pata em nada de forma isenta e apartidária e sem benefício para o estado central e para as suas corporações.
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    Pedro Correia 22.06.2017

    Vivemos apavorados com o que possam pensar de nós lá fora. O facto de esta tragédia ter sido alvo de enorme cobertura mediática nos mais influentes jornais europeus e americanos forçará os responsáveis políticos a agir depressa e bem nesta matéria. Por uma vez.
    Estas 64 vítimas mortais não podem ter desaparecido em vão.
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