Manobras de diversão
É um sintoma do espantoso subdesenvolvimento cultural português, exercido pela classes que se dizem letradas e atentas, que todos os problemas se discutam reduzindo-se a questões políticas e, pior, abaixados à politiquice do jogo partidário. É o velho aforismo: quando se tem um martelo, todos os problemas são pregos.
O caso da compra da TVI-PRISA pela PT-Altice, demonstra tragicamente os equívocos de semelhante tacanhez. Num desplante, mas nada despropositado para quem tem interesses corporativos a defender, o Senhor Primeiro Ministro António Costa colocou as interrogações a esta operação nos termos que mais lhe convêm. Dado o tom, foi logo a banda bradar grande charivari à porta da ERC, um organismo de momento letá¡rgico, mas de génese e funções ignóbeis (qualificação que terei todo o prazer em esmiuçar em circunstâncias mais alargadas).
E no entanto os grandes dilemas criados pelas intenções da PT-Altice colocam-se num plano muitíssimo mais determinante, influente e alarmante, do que de a preocupação e conveniência táctica de saber quem ficará a mandar no alinhamento dos telejornais - "It's economics, stupid."
Era esperado que se a PT-Altice abocanhasse a TVI-PRISA, como numa queda em dominó, a NOS se fizesse à SIC-IMPRESA. Postas as coisas em movimento a questão fundamental é só uma:
Como será a paisagem audiovisual portuguesa?
Decorrem imediatamente daqui dois assombros:
- Em que outro país europeu (ou mesmo mundial) CINCO indústrias (a televisão aberta, a televisão por cabo, a Internet, as comunicações móveis e as comunicações fixas) ficam agregadas numa empresa? E se a NOS executar os seus propósitos acrescentem-se MAIS TRÊS: a exibição cinematográfica e a distribuição cinematográfica. E os direitos de futebol.
- Que liberdade de mercado, económica, comercial e de escolha se antevêem quando tantas áreas industriais de tamanha dimensão e incidência se limitam a um duopólio?
Enquanto a discussão não enveredar por este caminho é poeira nos olhos. Boa sorte.