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Delito de Opinião

João Soares, Costa e o 'Público'

Pedro Correia, 08.04.16

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Foto Miguel A. Lopes/Lusa 

 

Depois de um ministro (Carlos Borrego) ter sido forçado a abandonar o Governo de Cavaco Silva por contar uma anedota de mau gosto e de José Sócrates ter apontado a porta de saída a outro ministro (Manuel Pinho) por simular um par de cornos em plena sessão parlamentar, dirigindo-se a um deputado da oposição, João Soares deixou de ter condições para permanecer no Governo após ter escrito o que escreveu no seu Facebook. Foi a primeira baixa no Executivo de António Costa, há pouco mais de quatro meses em funções, e certamente aquela que o primeiro-ministro menos lamentará: é tranquilizante, para ele, saber que existe um troublemaker a menos no Conselho de Ministros.

A demissão foi tornada pública só ao fim da manhã de hoje. Mas tornou-se irreversível logo ontem à noite, no momento em que Costa pronunciou as seguintes palavras: "Já recordei aos membros do Governo que, enquanto membros do Governo, nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo." O português pode não ser primoroso, convenhamos, mas o significado político desta expressão era inequívoco: restava a Soares remover os pertences pessoais do seu gabinete.

 

O que espanta, lendo os jornais desta manhã já após o anúncio da saída do ministro da Cultura, é a assombrosa frouxidão do editorial do Público - afinal o diário que deveria sentir-se mais visado no polémico texto de João Soares. Duplamente visado, aliás, pois o agora ex-governante prometia dar bofetadas a um par de colunistas deste matutino, Augusto Seabra e Vasco Pulido Valente.

Esperava-se que hoje o jornal reagisse em termos enérgicos. Pura ilusão. A anónima pena de turno ao editorial calça luvas de pelica, enverniza a prosa e nem lhe ocorre exigir ao chefe do Governo que ponha termo à curta carreira ministerial de Soares. Pelo contrário, chega ao ponto de escrever: "Afastar João Soares do Governo podia trazer mais dissabores do que sossego a António Costa." Prometer "bofetadas" e condicionar seriamente a liberdade de crítica de dois dos seus mais antigos colaboradores não basta, pelos vistos, para indignar hoje o jornal que Vicente Jorge Silva fundou.

Raras vezes tenho lido um editorial tão timorato e conformado - espelho, só por si, da profunda crise do jornalismo português. Felizmente Costa nem sequer o leu.

 

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