Convidada: MARGARIDA C. AGUIAR
Envelhecimento demográfico, um desafio à inovação
Nas economias mais desenvolvidas, o fenómeno do envelhecimento demográfico é uma realidade inexorável que está a entrar, cada vez mais, pela casa adentro. Por cá, o assunto não tem merecido a atenção que exige, não apenas pela dificuldade que temos demonstrado de descolarmos do curto prazo, mas também pela falta de visão necessária para o desenho de políticas públicas com objectivos que no médio e longo prazos operem os efeitos desejáveis.
O envelhecimento demográfico é considerado por muitos um problema para o futuro. E não deixa de ter razão quem assim pensa numa sociedade que não é capaz de pensar de forma diferente. A primeira transformação a fazer é cultural. Não sendo possível inverter o envelhecimento demográfico, o que verdadeiramente importa é sermos capazes de encontrar soluções que se adaptem às novas realidades.
Com efeito, o fenómeno do envelhecimento não é novo – todos sabemos. Os números são sobejamente conhecidos e as projecções têm uma probabilidade elevada de se concretizarem, bastando para tal olhar para o passado e o presente. Há muito que a estatística nacional e que estatísticas e estudos de instâncias e centros de investigação europeus vêm chamando a atenção para as trajectórias inversas da curva de natalidade e da curva de longevidade. A primeira em movimento descendente e a segunda, pelo contrário, em movimento crescente. A população total está a reduzir-se e estamos a envelhecer. Portugal é um dos países mais envelhecidos do mundo. Os números não oferecem dúvidas. Estes, ao contrário de muitos outros, não têm discussão.
Vivermos mais tempo é motivo para nos deixar mais felizes. Seria expectável que esta perspectiva de bem-estar nos obrigasse a pensar e a actuar no sentido de criarmos condições para que a boa notícia do aumento da esperança de vida possa ser vivida com dignidade e qualidade de vida.
Políticas públicas e sociedade civil deveriam conjugar esforços para remar ambas para o mesmo lado, complementando-se e articulando-se na definição de estratégias nacionais integradas e transversais, intertemporalmente consistentes, fortemente apostadas no investimento na inovação, identificando caminhos para os quais deve ser canalizado o esforço.
É muito importante que as populações tomem consciência do envelhecimento. Não basta saberem que vivem mais anos: é fundamental que compreendam as políticas públicas do envelhecimento e participem nelas, se organizem enquanto sociedade civil, de modo a criar um clima favorável às transformações da economia e organização social. Temos toda a vantagem em sermos protagonistas da mudança. Antecipar caminhos, dispor de uma estratégia para lidar com as boas e as más notícias é a única via. O pior que nos pode acontecer é o futuro bater à nossa porta e não estarmos preparados para o receber.
Portugal não está ainda preparado para a complexa realidade trazida pelas alterações demográficas, com reflexos, entre outros, na economia, nos hábitos de poupança, na equidade intergeracional, na gestão do ciclo de vida, na organização do trabalho e da sociedade, no emprego, na ocupação do tempo e no entretenimento, nas redes familiares e sociais.
O envelhecimento demográfico tem impactos significativos na despesa pública com os sistemas de pensões e de cuidados de saúde ou na gestão da dívida pública.
Com a população activa a reduzir-se, temos pela frente um desafio superior que é o de sermos capazes de aproveitar as capacidades das pessoas mais velhas, contribuindo não apenas para melhorar a produtividade, mas também para humanizar a sociedade, erguendo pontes entre as gerações mais novas e as gerações mais velhas.
O caminho passa por as populações dos países envelhecidos tomarem consciência da relação entre a solução dos problemas criados pelo envelhecimento e a existência de uma cultura pró-inovação. Portugal está dentro deste "barco". Está em causa uma transformação cultural que, evidentemente, se vai fazendo. Mas precisamos de agir com antecedência, de modo a, com tempo, nos organizarmos.