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Delito de Opinião

A barbárie é a barbárie: breves reflexões sobre o terrorismo

Pedro Correia, 24.05.17

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 Paris, Novembro de 2015

(foto: Charles Platieu, Reuters)

 

1

O terrorismo jiadista combate-se como se combateu o terrorismo extremista na Itália e na Alemanha, na década de 70. Combate-se como se combateu o terrorismo da ETA, como se combateu o terrorismo do IRA.

Como?

Com serviços de informações competentes e organizados em rede, infiltrados nas organizações terroristas e dotados de meios efectivos para desarticulá-las. Quebrando-lhes as células dirigentes, os circuitos informáticos e as vias de abastecimento de armas e munições. E utilizando dissidentes e terroristas arrependidos nessas operações.

Não é preciso inventar a pólvora. A pólvora já foi inventada há milhares de anos.

 

2

Alguns tudólogos com lugar cativo no espaço mediático teimam em "perceber" o "porquê de o serem [assassinos], o que os levou a isso". Estes raciocínios sempre me conduzem àqueles judeus que tentaram "perceber" as motivações dos nazis entre 1933 e 1939. Alguns desses judeus contemporizaram com a barbárie, deixaram que lhes saqueassem lojas e confiscassem propriedades enquanto procuravam mostrar-se bons cidadãos alemães: muitos escutavam Wagner e exibiam orgulhosamente as condecorações obtidas em combate na I Guerra Mundial em defesa do império germânico.

Acabaram nos campos de extermínio e nas câmaras de gás tal como os outros, os que não tinham tentado "perceber" o que levava as hordas hitlerianas a comportarem-se como bestas sanguinárias.

 

3

Rejeito as teses deterministas. Acredito firmemente no livre arbítrio e na responsabilidade individual: ninguém é criminoso antes de praticar um crime.
Mas não recorro a eufemismos para qualificar actos criminosos.
Lamentavelmente, quando ocorre um atentado terrorista, logo surge gente a considerar que os assassinos são vítimas. Da economia, da crise, da sociedade, da discriminação, do capitalismo, do aquecimento global, do planeta Terra, do sistema solar.
Isto para mim é inaceitável.
Um crime é um crime. A barbárie é a barbárie - tenha a cor ideológica que tiver, idolatre os deuses que idolatrar. Ponto final.

 

4

A ladainha da "destruição do Iraque", invocada por sistema quando ocorrem atentados terroristas na Europa, equivale a dizer que as vítimas inocentes destes atentados "estavam mesmo a pedi-las".
Equivale também a considerar vítimas os assassinos. Coitados, argumentam os arautos de tal tese, eles estão apenas a vingar o que os malandros dos ocidentais fizeram ao Iraque.
Essa é a lógica hitleriana do olho por olho, dente por dente. Hitler conquistou metade da Europa, espezinhando-a e escravizando-a, para vingar as humilhações sofridas pela Alemanha no Tratado de Versalhes. Alegava ele. E muitos concordaram.
Quando começamos a chamar vítimas aos assassinos os nossos padrões éticos invertem-se. O passo seguinte, nesta rota descendente, será chamar criminosos às vítimas verdadeiras.

 

5

É um absurdo incorporar um homicida numa categoria étnica, religiosa ou cultural, fixando-o neste rótulo.
Há assassinos em todos os quadrantes, em todas as etnias, em todas as classes sociais.
Este princípio não é de via única. É tão absurdo dizer ou escrever que "os muçulmanos professam uma ideologia assassina" como fazer proclamações genéricas de sentido inverso: "os ocidentais são culpados de terem explorado populações noutros continentes e estão a pagar pelo que fizeram" ou "os americanos foram lançar bombas ao Iraque e agora recebem o troco".

 

6

A vida humana para mim tem valor absoluto em qualquer lado. Em Paris como na Síria. Em Bruxelas como no Paquistão. Sou incapaz de alimentar duas teses sobre o assunto em função das coordenadas geográficas.

A minha posição é clara: não quero "compreender" os terroristas. Que armam meninos na Libéria e os transformam em carne para canhão. Ou que usam meninas na Nigéria como bombas humanas. Ou que investem com demencial fúria apocalíptica contra crianças e adolescentes, como ainda há dois dias aconteceu em Manchester.
Nem conseguiria, mesmo que quisesse.

4 comentários

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    Einstürzende Neubauten 24.05.2017

    Costa, veja a simpatia do duque de Hamilton, ou de Eduardo VIII, e muitos outros políticos britânicos, pela causa nazi. Pegando nas suas palavras " coisa de passado tão recente, seja tão esquecida. Esquecida, decerto, não por acidente."


  • Sem imagem de perfil

    Costa 24.05.2017

    Esquecidos, esses casos? Não me goze... Falados e documentados abundantemente.

    Mas onde quer você chegar? A isso dos erros, ou pior, de uns legitimarem a mais repugnante maldade de outros? "Outros" que com larguíssima cobertura mediática berram impunemente um virginal estatuto de ausência de qualquer mal e posse de todo o bem? Ao masoquista dogma de que o mundo ocidental tudo merece de horrores e nunca expiará a sua infinita culpa (até, talvez, isso chegar à sua porta; a um filho seu, a si, aos seus bens)?

    Não partilho dessa sua visão daa coisas. Mas é bem possível que ainda, eu os os meus, venha a pagar por ela. O que você achará, pelo menos, muito natural.

    Costa

  • Sem imagem de perfil

    Nebauten 25.05.2017

    Meu caro , essa história do mufti também está sobejamente documentada - ex : Jerusalém, de Montefiore - ao contrário das simpatias inglesas, americanas, croatas, ucranianas, romenas pelo nazismo.
    O que abomino é a hipocrisia do Ocidente, herdeiro de Pilatos. Nós o somos o par do Oriente num tango de morte.
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