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Delito de Opinião

Uma questão de direitos fundamentais

Pedro Correia, 21.06.13

As eleições autárquicas deste ano estão a ser dominadas não pela política mas pelos tribunais, forçados a substituir-se à Assembleia da República na interpretação da lei que estabelece um limite de três mandatos consecutivos aos presidentes das câmaras municipais.

Na falta de uma definição exacta da lei, o que constitui um sinal de evidente descrédito do Parlamento, cada juiz vem decidindo à sua maneira. Em Lisboa e no Porto entende-se a proibição como irrestrita: quem exerceu funções em Gaia não pode candidatar-se na outra margem do Douro, quem foi autarca em Sintra não poderá sê-lo na capital. Muito diferente é o critério dos tribunais de Évora, Guarda, Loures e Tavira: aqui os juízes fazem uma interpretação restritiva da lei, considerando que só pode abranger o município onde já foi desempenhada a função autárquica. É este, de resto, o entendimento da maioria dos partidos representados na AR: só o Bloco de Esquerda defende a tese oposta.

 

Um dos vícios deste debate é travá-lo em função dos protagonistas concretos, transformando-o em discussão política. Mas importa que não seja desviado do seu terreno, que é o dos direitos. Sabendo-se que nenhum direito é absoluto, a sua restrição deve porém ser entendida sempre como excepção e não como regra.

Havendo dúvidas na interpretação da lei, custa-me entender que em matéria de direitos os juízes decidam fazer interpretações extensivas - ou seja, vendo nelas o que não vem lá expressamente mencionado.

Se a moda pega, à luz destas interpretações, começamos hoje por restringir o direito dos partidos a apresentar candidaturas e amanhã veremos também tribunais comuns a comprimir os direitos de reunião, de expressão e de manifestação, a liberdade de imprensa e o exercício do direito à greve. Nestas coisas sabe-se sempre como se começa mas nunca como se acaba...

 

Por tudo isto, revejo-me naturalmente nas decisões dos tribunais de Évora, Guarda, Loures e Tavira. E considero, pelo contrário, que as decisões dos juízes em Lisboa e no Porto, dando provimento às participações do Movimento Revolução Branca, são uma preocupante compressão de direitos políticos que a lei não prevê e a jurisprudência não pode consagrar. Sob pena de, daqui para a frente, tudo passar a ser revisto, numa óptica restritiva, em matéria de direitos, liberdades e garantias.

Tenho a certeza que será este mesmo o entendimento do Tribunal Constitucional, na linha da argumentação já expressa por Vital Moreira. Sejam quem forem os protagonistas das candidaturas autárquicas. Porque esta é uma questão de direitos fundamentais.

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