Ganas? Não temos
Acusam os portugueses de cobardia, ou na melhor das hipóteses de falta de nervo quando os comparam com os gregos, os islandeses e os irlandeses. Evocam os conhecidos versos do O'Neill para confirmar, desconsolados, que o tempo passa e a natureza lusa permanece mansa, quase vegetal. Os portugueses abstractos continuam a vergonha dos portugueses concretos. A indignação é pública e notória quando os portugueses concretos, agitadamente sentados à mesa de tertúlias televisivas ou a derramar as suas prosas incendiárias em colunas de jornais, fustigam os portugueses abstractos clamando por mais agitação popular.
Não fosse esta saudável esquizofrenia e talvez o desespero já tivesse incendiado as nossas ruas. Chamo-lhe saudável não porque gera esta paz podre, mas porque nos salvaguarda de um mal maior, que é o da identificação pessoal com um colectivo que não funciona. Não é a cobardia nem a lassidão que nos tolhe, mas a falta de fé no todo que formamos, essa doença endémica que a História, a política recente e as estatísticas do Eurostat, da OCDE e outros organismos competentes, ajudam a explicar. Até a raiva precisa de esperança.