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Delito de Opinião

Uma revolução para o sistema fiscal

Rui Rocha, 29.05.12

Boa parte da crise que atravessamos tem origem no sistema fiscal. Insiste-se em tributar a riqueza. Ora, em Portugal, produz-se pouca e esta tem quase sempre origem duvidosa. É claro que riqueza com pecado original não se declara. Assim, sobra quase nada para tributar e redistribuir. Para além disso, a riqueza tem outras características que colocam graves dificuldades técnicas. Até determinado nível de carga fiscal, a riqueza esconde-se. A partir daí, foge. Isto é, a famosa curva de Laffer, mais do que uma curva, é uma estrada sinuosa que passa pela economia paralela doméstica, mas acaba, mais tarde ou mais cedo, no cofre gelado de um banco em Genebra (daí a expressão pôr-se ao fresco). Num esforço inglório, alguns entusiasmadinhos da tributação inventaram há uns anos esta coisa dos sinais exteriores de riqueza. Mais um erro. Rico que é rico tem. Não ostenta. Ou melhor, quando quer ostentar pega no dinheiro que tem na Suíça e compra um chalé numa estância exclusiva da Áustria. É por isso que passamos a vida a tentar tributar casas de praia em Vale da Coelha, coisa que, como se sabe, dá pouca receita. O problema está pois nesta obsessão absurda por tributar o que praticamente não existe. Lá fora, há riqueza a sério. Faz todo o sentido tributá-la. Aqui não. Por isso, devíamos adaptar o sistema fiscal à nossa realidade. E tributar o que temos em abundância. Ora, abundante, para além do cabelo do Jorge Jesus, só vejo a pobreza de espírito. A sua presença, recorrente e transversal, é o único facto incontestável em Portugal. É necessário elevá-la, agora, a facto tributário. Se virmos bem, um sistema fiscal assente na tributação da pobreza de espírito assegura enormes vantagens. Desde logo, a base tributária seria alargada. Depois, em rigor, nenhum de nós estaria isento. Todos temos momentos para esquecer. E para, em consequência, tributar. Para além disso, porque o é, a pobreza de espírito revela-se a cada passo e dificilmente se esconde. Um só funcionário, sentado um dia inteiro em frente à televisão, arrecadaria mais imposto do que todas as repartições de finanças da Dinamarca. Sim, isto implica um novo imposto directo. Mas, nada impede que tributemos também a pobreza de espírito transmitida em diferido. Por outro lado, nada como introduzir uma nota de progressividade no sistema. Uma colecta mais do que proporcional em relação à matéria colectável deixaria cheios os cofres do Estado e os nossos corações insuflados de sentido de justiça. Por último, mas não menos importante, a evasão fiscal tornar-se-ia algo muito desejável. É certo que a exportação da pobreza de espírito implicaria, no curto prazo, uma diminuição de receita. Mas, em contrapartida, no médio prazo, uma fuga maciça à tributação tornaria Portugal um país infinitamente melhor.

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