Semear ventos
Um eterno secretário-geral de um partido que se proclama "dos trabalhadores" mas no qual os trabalhadores jamais votam apressou-se a marcar presença no prime time televisivo da greve da CGTP, à meia-noite, falando com a autoridade política que os seus zero vírgula qualquer coisa obtidos nas urnas lhe conferem: «É preciso fazer tantas greves gerais quantas forem necessárias até derrubar o Governo. (...) É preciso que este governo tenha que morrer.»
Felizmente nenhum assalariado português, esteja ou não esteja em greve, se revê nesta linguagem bélica de quem diz representar "a classe operária e os restantes trabalhadores" e é incapaz de aceitar os mecanismos elementares da democracia representativa. No sistema democrático que felizmente é o nosso, há adversários políticos e não inimigos, como a alusão à "morte", com o seu simbolismo carregado de ódio, deixaria entender. Quanto ao facto de greves sucessivas poderem contribuir para o derrube de governos escolhidos nas urnas, basta lembrar os trágicos resultados do Chile de 1973 que deviam funcionar como alerta para quem gosta de semear ventos ansiando por tempestades.
A história pode sempre repetir-se - e, ao contrário do que escreveu Marx, não necessariamente como farsa.
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