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Delito de Opinião

Nenhum 'estado social' será viável se a Europa estiver falida

Pedro Correia, 08.11.11

 

É um truque característico de uma certa retórica política, recorrente no debate público português: desvaloriza-se quem pensa de forma diferente e atribui-se-lhe uma intenção que está longe de corresponder ao seu pensamento. Habituei-me há vários anos a ler com proveito as reflexões do Sérgio Lavos, mesmo quando discordava dele, e é por isso com alguma surpresa que o vejo recorrer também àquele truque a propósito do que o Rui Rocha e eu escrevemos sobre a gravíssima crise grega. Garante que pretendemos "apontar o dedo a quem mais sofre com o austeritarismo imposto por Merkozy" e recomenda-nos "bom senso". Nem mais.

Mas vamos ao que interessa. Na sua réplica, o Rui Rocha acerta em cheio ao escrever isto: "O Estado Social, na Grécia, não é mais do que um expediente utilizado pelos políticos para calar os cidadãos e utilizado por certos cidadãos como desculpa para absolver os políticos. O Estado promete o que não tem e dá a quem não deve dar, comprando o silêncio e o compromisso daqueles que furam o sistema como podem, recebendo, em prejuízo de outros, aquilo a que não têm direito." Faz-me aliás cada vez mais confusão ver pessoas inteligentes, como o Sérgio Lavos, ostentarem uma atitude de total complacência perante todos quantos se aproveitam do modelo social europeu para o perverter, levando-o à falência.
Não há modelo social europeu numa Europa falida. Quem defende um 'estado social' deve defender, no mesmo passo, finanças sólidas. Perante o actual "Inverno demográfico" e os anémicos índices de crescimento económico hoje existentes, deixou de ser possível encarar com aquela complacência a gigantesca rede de fraudes que desvia sem remissão o 'estado social' dos seus fins legítimos.
Eu defendo o modelo social europeu. E, por isso mesmo, não consigo encarar essas fraudes com a benevolente tolerância adoptada pelo Sérgio. A questão de fundo é esta -- e não qualquer outra.
Quanto à Grécia -- país que ostenta o nada invejável título de recordista europeu da fraude fiscal -- não esqueçamos outro facto relevante: o Governo de Atenas mentiu às instituições europeias sobre o estado real das suas finanças públicas. Violando o direito comunitário. E violando, antes disso, todos os parâmetros éticos que devem reger as relações entre Estados num mundo civilizado. Sem reconhecermos isto, parece-me, todo o debate em torno da crise grega está inquinado logo à partida.

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