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Delito de Opinião

Depois não se queixem

Sérgio de Almeida Correia, 25.04.11

Num dia tornado solene por força das circunstâncias, quatro homens bons discursaram em Belém. Procuraram falar de Portugal a Portugal e aos portugueses. Quiseram falar de nós. Uns com mais jeito do que outros mas todos, todos sem excepção, de uma forma séria e comedida. Olhos nos olhos. Se houve ali um denominador comum foi o apelo à participação, ao esforço colectivo, ao empenhamento cívico, à razão e ao bom-senso. As palavras foram sinceras, contidas, não perdendo o brilho que lhes foi conferido por cada discurso. E não se esqueceram de falar na próxima jornada eleitoral. Em suma, aqueles quatro homens generosos procuraram conferir seriedade à intervenção política.

 

A Única deu a conhecer na sua última edição, como também já o tinha feito por ocasião da Festa do Pontal, no Verão de 2010, mais algumas facetas do líder do PSD. Ao mesmo tempo, graças ao Público e a mais duas revistas, os portugueses ficaram agora a saber que Passos Coelho gostava de ter mais filhos, que o ar de menino do coro tem correspondência na prática, que é especialista em farófias, papos-de-anjos e queijadas e que no meio da sua intensa agenda política e dos profundos pensamentos em que deve estar imbuído para salvar a pátria, ainda arranjou um tempinho para tirar umas fotografias para as revistas cor-de-rosa nos jardins do Palácio Marquês de Pombal, Oeiras. Ah, e já me esquecia, os portugueses também ficaram a saber que o candidato a primeiro-ministro tem quatro cadelas que não irão viver para S. Bento. Valha-nos isso.

 

Do que li não consegui perceber se a casa de Massamá, popularizada por Mendes Bota, é um apartamento em regime de propriedade horizontal ou uma moradia, E também não fiquei esclarecido sobre quem levava às cadelas à rua, se estas faziam os dejectos à porta de sua casa ou da do vizinho, nem se depois era o próprio líder do PSD que calçava umas luvinhas e os apanhava do passeio ou se deixava as "prendas" expostas para que um incauto as pisasse.

 

Pese embora tão lamentáveis falhas no esclarecimento da opinião pública, o Público revela que as reportagens são uma "jogada de marketing político montada pelos seus estrategas de campanha" e que duas das revistas cor-de-rosa pertencem ao universo Cofina. Um verdadeiro póquer.

 

José Sócrates poderá reunir em si, neste momento, todo o asco da opinião pública e ter um percurso "nebuloso". Passos Coelho poderá ser um homem bem-intencionado e "transparente". Mas mesmo que tivéssemos um 25 de Abril em Belém todas as semanas, com quatro Presidentes a discursarem, estas reportagens desmentem qualquer boa intenção. Será culpa dos jornalistas?

 

Em boa verdade, o que estas reportagens nos dizem é que os problemas dos portugueses se resumem a isto: uma questão de publicidade a cadelas e farófias nas revistas cor-de-rosa.  

 

Se este é o caminho que Passos Coelho e os seus brilhantes estrategas têm a apontar ao país, se é pelo caminho da mais obscena frivolidade que o líder do PSD pretende formar um governo de maioria sólido e coeso que devolva a dignidade aos portugueses, então o melhor talvez seja mesmo arranjar umas armas, pedir desculpa àqueles senhores que hoje discursaram, e fazer um novo 25 de Abril.

 

Está na hora de se fazer uma nova revolução. Penso que foi isto que Cavaco Silva também quis dizer no discurso da sua tomada de posse, que hoje foi reafirmado por quatro homens sérios e bem-intencionados e cujo verdadeiro alcance só nesta altura consegui compreender depois de ler o que li.

 

Meus amigos: um sobressalto cívico seria "defenestrar" quem depois de se entreter a cozinhar reportagens destas ainda tem o desplante de se apresentar a votos e aspira ser primeiro-ministro e ministro de Portugal. Se não o fizermos acabaremos todos por ser tratados como cães. E a votar nas cadelas. E nos seus filhos. Já faltou mais. 

 

(a foto que ilustra este post é do Público e de Rui Gaudêncio) 

   

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