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Delito de Opinião

Justamente

José Maria Gui Pimentel, 31.10.13

Livros de Cabeceira (12)

João André, 31.10.13

 

Não tenho mesa de cabeceira, o que estraga um pouco o sentido da ideia, mas gosto de ler na cama. Na fotografia acima falta o telemóvel (foi usado para a fotografia) onde costumo também fazer algumas leituras (jornais e alguns e-books), mas está o essencial do monte ao lado da cama. Está também o candeeiro e a ficha onde o candeeiro e o carregador do telemóvel vão buscar a energia. Vamos aos livros:

 

Está obviamente o livro de que falei há pouco tempo e que vou lendo, bem como Europe's Tragedy, de Peter H. Wilson, que também referi. Tenho também A Máquina de Fazer Espanhóis, de Valter Hugo Mãe, que decidi contrariar usando maiúsculas. Por acaso tenho lá um livro para o trabalho: Porous Ceramic and Metallic Microreactors, de Halil Can Aran. Trata-se da tese de doutoramento de um antigo colega e que estou a ler para ir refrescando conhecimentos de outras áreas. Espaço ainda para o futebol com The Blizzard, uma fanzine (que recomendo a qualquer pessoa que pense que Luís Freitas Lobo sabe escrever bem) com contribuições de alguns dos melhores escritores sobre futebol em língua inglesa (e não só) e cujas versões em e-book podem ser obtidas aqui com a contribuição que se entender. Confesso que nunca paguei menos de 5 libras. Tenho por fim a edição de Julho da National Geographic com um artigo dedicado à formação do sistema solar. A NG tem-se tornado um pouco sensacionalista nos últimos anos (especialmente o canal de televisão) mas ainda vai valendo a pena.

O brainstorming da reforma do estado

João André, 31.10.13

Na empresa onde trabalho (indústria química) há de tempos a tempos um brainstorming (tem outro nome interno) subordinado a um tema escolhido antecipadamente. Durante o período definido para tal, os membros dessa jam podem lançar as suas ideias, com os motivos para a apresentarem, e uma indicação dos benefícios para a empresa, bem como porque razão faz sentido a empresa avançar com ela (experiência prévia, novos mercados, etc). No final, os temas mais votados pelos participantes e seleccionados por dois ou três painéis internos de especialistas e gestores acabam por receber uma dotação orçamental para serem desenvolvidos.

 

O Guião para a Reforma do Estado parece ter saído de uma sessão de brainstorming. O governo chegou ao pé dos seus funcionários, dos (sub)secretários de estado, dos especialistas, colaboradores, motoristas e quiçá empregadas de limpeza, e perguntou-lhes se teriam ideias para a reforma. O governo pegou nelas, decidiu-se por retirar aquelas que não fariam muito sentido (baixar o preço do Ajax limpa-vidros não fará muito sentido, suponho) e agora apresentou ao público em geral o apanhado.

 

O próximo passo será então a votação (eleições, claro) e a avaliação final pelo painel de especialistas e gestores (a troika tem mais gestores que especialistas, mas enfim). A diferença entre o Guião e o brainstorming aqui da casa é apenas e só uma: a segunda procura apenas uma ou duas ideias, as quais têm que estar subordinadas à estratégia da empresa; já o Guião para a Reforma do Estado acaba por ir pedir ideias que justifiquem a sua existência. O guiãozinho é portanto uma inutilidade absoluta, independentemente dos números de circo que sirvam para o apresentar.

Nem bom vento nem bom casamento

Pedro Correia, 31.10.13

A "lufada de ar fresco" e o "novo ciclo de esperança para a Europa" que prometiam vir de Paris não passaram afinal de miragem para iludir incautos: com 73% de opiniões negativas, François Hollande é o chefe do Estado francês mais impopular desde que há registos. E até já vê a Frente Nacional, de Marine Le Pen, ultrapassar o seu Partido Socialista nas intenções de voto.

Nos dias que correm, o inquilino do Eliseu só pode transmitir más vibrações à son ami Tó Zé no Largo do Rato. Seguro vai ter de encontrar outra fonte de inspiração. Antes que se constipe com tanto ar fresco.

Um biorritmo peculiar

José Maria Gui Pimentel, 30.10.13

Lembro-me de ter lido um artigo na Sábado – um raro bom artigo, hoje em dia – sobre as especificidades do sistema político português. Havia várias muito curiosas. Ficaram-me três na retina. A primeira o surgimento – e o rápido crescimento nos últimos anos – de ex-políticos (sendo que o prefixo “ex” é, naturalmente, questionável) como comentadores políticos, retirando protagonismo a jornalistas, politólogos, etc… A segunda dizia respeito à predisposição dos governantes portugueses para prestarem declarações sempre que fazem uma aparição pública, algo que não é normal no resto da Europa.

A terceira, e talvez mais curiosa, dessas particularidades portuguesas prendia-se com o peculiar biorritmo da nossa atividade política. Enquanto nos restantes países europeus – mesmo incluindo os chamados “países mediterrânicos” – os grandes anúncios políticos são feitos normalmente da parte da manhã, ficando o resto do dia para a análise dos comentadores, as reações dos vários intervenientes e até a reflexão dos cidadãos, em Portugal o prime time político ocorre já após o dia normal de trabalho, perto ou sobre a abertura dos telejornais. Lembro-me sempre desta peculiaridade do sistema quando surgem já ao fim do dia intervenções importantes do Primeiro-Ministro, da Ministra das Finanças, dos juízes do Tribunal Constitucional (da última vez que me lembro já passava das 20h30m), do Presidente da República ou, como foi o caso de hoje, do Vice-Primeiro-Ministro. Como se fosse às 20h que, qual coruja, o país tivesse o seu pico de actividade. É um sistema curioso, algo perverso, e que merecia um estudo sociológico Curiosamente, as únicas excepções a esta norma de que me recordo no passado recente são as avaliações da troikaet pour cause...

Sophia em acordês? Não, muito obrigado

Pedro Correia, 30.10.13

 

I

Entro na Livraria Barata, espreito os títulos nos escaparates. Atrai-me a atenção um livro de contos de Sophia de Mello Breyner Andresen, da Porto Editora, intitulado Quatro Contos Dispersos. Contos que não conheço. Tratando-se ainda por cima de um género literário que tanto aprecio, pego num exemplar. Já disposto a levá-lo.

Mas eis que uma campainha de alarme soa dentro de mim: consulto a ficha técnica desta obra, editada em 2012. Lá surge o aviso aos incautos: "Este livro respeita as regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa." Por outras palavras, muito menos eufemísticas: o livro vem redigido não como a autora o escreveu mas segundo as absurdas normas do pseudo-acordo ortográfico de 1990 que apenas a administração pública portuguesa aplica, felizmente ainda sem carácter obrigatório, e o resto do mundo lusófono ignora.

Esclarece a ficha técnica que os herdeiros de Sophia deram o necessário consentimento a esta edição, apesar das consoantes mutiladas. Algo que me deixa admirado, pois Miguel Sousa Tavares, um dos herdeiros da autora do Livro Sexto, é um dos mais notórios adversários do AOLP.

Poiso o livro, devolvendo-o ao seu lugar. Gosto muito da obra desta grande escritora, mas nem de borla levaria um volume que lhe desfigura a escrita. Ainda por cima com a chancela de uma editora cujo administrador e director editorial, Vasco Teixeira, se assume como crítico do convénio que se propôs "unificar" a grafia portuguesa sem ter atingido este objectivo, aliás indesejável.

 

II

Dirijo-me à secção de livros usados, na mesma livraria -- uma secção em expansão crescente pois há cada vez mais bibliotecas domésticas a desfazer-se na sequência de óbitos e divórcios e desentendimentos familiares de diversa ordem e dos efeitos da crise económica -- e descubro um exemplar da primeira edição d' O Secreto Adeus, o romance de estreia de Baptista-Bastos, faz agora precisamente meio século.

É uma das raras obras portuguesas de ficção centradas no jornalismo e numa redacção de jornal. Li-a há quase 30 anos, numa edição muito posterior a esta, que tem a nobre chancela da velha Portugália Editora e capa desenhada por João da Câmara Leme (1930-84), um dos nossos melhores ilustradores do século XX, também responsável pelo grafismo das edições originais de Felizmente Há Luar, de Luís Sttau Monteiro, Barranco de Cegos, de Alves Redol, e Apelo da Noite, de Vergílio Ferreira, entre tantas outras.

É uma edição em muito bom estado, integrada numa colecção então intitulada "novos romancistas", o que demonstra a velocidade de esgotamento deste género de rótulos. E traz, como atracção suplementar, um autógrafo do autor, datado de Junho de 1968 e dirigido a uma "confrade das letras", cujo nome menciona.

Nem hesito: trago comigo O Secreto Adeus (título de que sempre gostei). Custou-me 25 euros, preço módico atendendo à data da edição e ao autógrafo personalizado.

E com a vantagem suplementar de ter impressas todas as vogais e consoantes. Sem mutilações.

 

III

Lamento, caríssimos herdeiros de Sophia, mas tenho demasiada consideração pela autora dos Contos Exemplares para lê-la numa grafia que ela não escolheu nem certamente defenderia. Como nem o próprio editor defende.

Felizmente restam as edições antigas, cada vez mais disponíveis por aí. Felizmente também há ainda muitas editoras que resistem em render-se ao acordês, recusando perpetuar delitos de lesa-cultura em páginas impressas. Felizmente, neste ano de 2013, podemos ver Sophia bem reeditada. Abro a décima edição de Coral, por exemplo, lançada há poucos meses pela Assírio & Alvim (por ironia, pertencente ao grupo Porto Editora), escolho um poema ao acaso: "Nardo / Pesado e denso, / Opaco e branco, / Feito / De obscura respiração / E de nocturno embalo."

Assim mesmo. Sem a supressão de supostas consoantes mudas.

À memória de Sophia e daqueles que sabem respeitar o seu legado literário, aqui fica a calorosa homenagem deste leitor atento.

 

Leitura complementar:

Há males que vêm por bem

Como desperdiçar clientes em tempo de crise

Como desperdiçar clientes em tempo de crise (2)

Saber ouvir...

Helena Sacadura Cabral, 30.10.13

A economista e professora Manuela Silva, que coordena o grupo Economia e Sociedade da Comissão Nacional Justiça e Paz, da Igreja Católica, concedeu ao jornal Público uma curiosa entrevista que pode ser lida aqui.


Muitas das suas sugestões deveriam ser pensadas pelo actual governo cuja navegação à vista tem trazido os resultados que se conhecem. Mas em Portugal dialogar, ouvir quem pensa diferente, questionar as próprias decisões, não são apanágio da "partidarite bacoca" que se apossou do que entendemos ser a democracia. E isto, infelizmente, aplica-se tanto ao governo como à oposição.

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