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Delito de Opinião

Os filmes da minha vida (25)

Pedro Correia, 31.12.10

All that Roy
Alguns actores acompanham-nos em períodos decisivos das nossas vidas. Servem-nos de modelos, tornam-se nossos confidentes, transmitem-nos um gesto, um esgar, uma expressão, uma frase que logo tornamos nossa. Um dia verificamos que desapareceram para sempre. É como certas amizades, que se evaporam quase sem nos darmos conta disso.
Aconteceu-me em Fevereiro de 2008 com Roy Scheider: li a notícia de que morreu, aos 75 anos, e estranhei o facto de não sentir sequer um fio de emoção. Porque Roy Scheider acompanhou-me durante quase uma década de idas assíduas às salas de cinema. Lá estava o seu rosto angular, de onde sobressaía um par de olhos tristes, dialogando com Jane Fonda em Klute. Lembro-me também dele em Os Incorruptíveis Contra a Droga e O Homem da Maratona. Recordo-o igualmente em Tubarão – esse filme nuclear, que marcou o regresso de Hollywood ao grande cinema depois de vários anos errantes a querer macaquear o pior dos filmes europeus enquanto as produções britânicas amealhavam Oscares. E lembro-me dele sobretudo em All That Jazz, de Bob Fosse: raras vezes um actor levou a representação a tais limites de esforço físico e psicológico: li algures que estava arrasado quando acabou de rodar o filme.
Valeu a pena o esforço: All That Jazz teve várias nomeações para o Óscar e conquistou a Palma de Ouro em Cannes.
Depois perdi-me dele. Ou ele perdeu-se de mim. Vi-o ainda, quase de fugida, em Na Calada da Noite (Robert Benton, 1982), um daqueles múltiplos filmes que se reclamavam da herança de Hitchcock sem lhe chegarem aos calcanhares. O mesmo rosto angular, os mesmos olhos tristes, a mesma expressão de quem já se decepcionou com quase tudo. Decepcionantes foram também as várias “sequelas” de Tubarão em que esbanjou talento. Aí já não parecia aquele Roy de outros tempos.
Nunca mais o vi. Ou, se o vi, foi como se não o reconhecesse. Correspondia a um período da minha vida ultrapassado para sempre. O cinema também é isto: enche-nos de emoção, seca-nos as emoções em ritmos e ciclos alternados. So long, Roy. Foi bom ter-te conhecido naqueles anos irrepetíveis em que descobria o encanto do cinema e ao mesmo tempo me descobria a mim próprio.

Lido e registado (17)

Sérgio de Almeida Correia, 31.12.10

Cavaco Silva é um político profissional – mas às vezes não parece. Era evidente que, na campanha eleitoral, iria ter de explicar muito bem as suas relações com o BPN e os detalhes do negócio em que comprou e vendeu acções da SLN. É básico: em democracia, os candidatos a cargos públicos devem contar aos eleitores, com detalhes, toda a sua vida financeira. Por isso, devia ter-se preparado para responder às dúvidas, às suspeitas e até às acusações – com factos, com argumentos e com documentos. O problema é que Cavaco Silva acha que está acima disso.”

 

Quando diz que os seus adversários teriam de “nascer duas vezes” para “serem mais honestos” do que ele, mostra presunção; quando equipara todas as dúvidas sobre o seu percurso a “uma campanha suja”, revela insensatez; quando qualifica as intervenções de adversários como “tretas” e “larachas”, exibe desespero.”

 

Enquanto Cavaco Silva não explicar muito bem as suas ligações (ou a falta delas) ao Banco Português de Negócios, o assunto vai voltar a ser falado – uma vez, e outra, e outra, até que finalmente, exausto e farto, o candidato será obrigado a reconhecer que o tema merece comentário. Aí, será demasiado tarde.

 

Editorial, Sábado, 29/12/2010

2011: ano da cidadania

Sérgio de Almeida Correia, 31.12.10

 

Como dizia o criador da pantera cor-de-rosa, a vida é um estado de espírito e isso exige que saibamos encará-la em 2011, com ou sem crises, na exacta medida dos nossos sonhos, fazendo da intervenção cívica um grito ao serviço da comunidade e do Estado de direito. Sem este não há democracia, nem estado social, nem liberdade. E a cidadania acabará por definhar e fenecer. Por isso desde já declaro 2011 o ano da cidadania.

 

Mas se por qualquer razão 2011 fizer de nós todos cartoons, então que o sejamos respirando saúde e lucidez.

Adeus 2010

Leonor Barros, 31.12.10

 

Concentremo-nos no essencial. Harmonia, tranquilidade, saúde, lucidez e preseverança para que 2011 se afirme como um ano positivo. A todos os comentadores, visitantes e aos meus companheiros de escrita, votos de um feliz e pleno Ano Novo.

O caso Ensitel (2)

Paulo Gorjão, 31.12.10

Será seguramente a partir desta semana o caso de estudo mais notório em Portugal. Adiante. A Ensitel acaba de anunciar que retira a queixa. Demorou uma eternidade, causou dano desnecessário, mas vergou perante os factos. Resta arrumar a casa e retirar as devidas lições. É a vida.

2011 e Nós

Laura Ramos, 31.12.10

 

- Nada há de mais deprimente do que um ano de dificuldades pré-anunciadas? Um rol interminável de privações pessoais, desistências nacionais, sofrimento social?

Pois eu digo: - Não há nada de mais enervante!

Talvez possamos reencontrar o sentido da cidadania. Talvez a sociedade civil acorde.

Talvez possamos refundar a democracia, em vez de lhe lavrar o epitáfio. Talvez tenhamos uma oportunidade única de exigir mais da acção política e dos próprios políticos.

Talvez aqueles que têm mais a dar ao país do que a receber deixem de se esconder, e de temer trocar a sua honra pela participação na coisa pública.

Depende de cada um de nós, independentemente da responsabilidade dos outros.

E isto não é retórica. É puro bom senso.

Não se deprimam: - Enervem-se!

E tenham um bom ano.

O animal feroz...

João Carvalho, 31.12.10

... põe-se em guarda. Não está habituado à coragem quase desafiadora da pomba frágil que finge ignorá-lo.

O melhor é ficar quieto e manter-me de sobreaviso — pensa o animal feroz. — Isto não me cheira nada bem.

Acho que já o assustei — pensa a pomba. — Está na hora de chamar o pombal inteiro e mostrar-lhe com quantos paus se faz uma canoa.

Um 'gentleman'

Pedro Correia, 31.12.10

 

Gosto de acentuar isto numa época em que é moda bater nos políticos: nos meus anos de repórter parlamentar conheci vários deputados com grande estatura política, cultural e humana - deputados de todas as bancadas, do CDS ao Bloco de Esquerda.

Desses tempos, de que falarei um dia aqui em pormenor, guardei bons contactos e até algumas amizades para a vida. Tempos em que conheci Eduardo Azevedo Soares, agora falecido aos 69 anos. Foi ministro, secretário de Estado, vice-presidente e secretário-geral do PSD, além de parlamentar. Mantive com ele diversos contactos profissionais, por vezes a propósito de assuntos muito polémicos, e nunca o vi perder uma das suas características principais, que bem o definiam: era um gentleman. Assim o recordo, na hora triste da sua partida. Precisamente por ser um atributo cada vez mais raro na sociedade portuguesa, tomada de assalto nos últimos anos por uma fornada de "animais ferozes".

No tempo dos gentlemen vivíamos melhor.

Lido e registado (16)

Sérgio de Almeida Correia, 31.12.10

Se nem face ao Governo socialista Cavaco exerceu qualquer contrapeso na arena socioeconómica, imagine-se face a um governo do PSD…”

 

O partido do actual Presidente, o PSD, apresentou um projecto de revisão constitucional onde propõe uma liberalização dos despedimentos e um recuo significativo do papel do Estado na Saúde ou na Educação, logo apontando para uma privatização (pelo menos parcial) destes serviços. Finalmente, os apoiantes de Cavaco querem o recuo do Estado social. Rui Ramos (e o seu discípulo H. Raposo), recentemente convidado para apresentar o último livro de Cavaco, todas as semanas se insurge no Expresso contra o Estado social, contra os privilégios dos funcionários públicos, contra os sindicatos e os grevistas, etc. (…). Logo, Cavaco não tem condições para ser um contrapeso em defesa do Estado social: muitos dos seus apoiantes pressioná-lo-ão para que seja o seu coveiro” – André Freire, Público, 27/12/2010

Como servir um vinho espumante

Rui Rocha, 31.12.10

Este é o dia certo para discutir, em termos científicos, a melhor maneira de servir um vinho espumante. Ao leitor sedento peço, todavia, um tudo-nada de paciência. Antes de nos aventurarmos nesse  efervescente desafio, importa perceber a que se deve a natureza borbulhante desta apreciada bebida. Ocorre-me, precisamente neste momento, que bebida, em rigor, ainda não foi. Na verdade, nem sequer foi servida! Temos, pois, um caso flagrante de algo que antes de ser já o era. E o que são as associações de ideias, eis que me vem à lembrança o Estado Social. Aquele que já não o sendo, dizem dele que ainda é. Este que nos servem, quando já foi totalmente consumido. Puxa-me o leitor pelo braço para que volte às borbulhas. A mim, que já me perdia com quistos. Pois as borbulhas resultam, caríssimo leitor, do simples facto de os vinhos espumantes terem um nível significativo de dióxido de carbono. Daí que na recente Cimeira de Cancun, depois de terem chegado a um fantástico acordo sobre a climatização da sala de congressos (nem mais nem menos que 23 graus célsius na escala de Richter), os ali presentes tenham festejado com o mais nobre dos espumantes: o champanhe. Foi, concordará, uma poderosa metáfora sobre os efeitos do dióxido de carbono. Os aguerridos congressistas deram o copo ao manifesto. E beberam-no frio, em clara oposição ao aquecimento global. Prossigamos. O que se passa, paciente leitor, é que a concentração de dióxido de carbono dentro da garrafa é muito superior à que existe na atmosfera. Tirando-se a rolha, o dióxido de carbono liberta-se, formando as festivas borbulhas. Mal comparado, é como se fosse um aumento da função pública aprovado antes das eleições. Depois das eleições, que fazem aqui o papel de rolha, os aumentos perdem-se na atmosfera. E o que acontece dentro da garrafa? Ora enfeites de Natal! Isso o leitor já sabe. Dentro da garrafa fica menos dinheiro do que aquele que o funcionário público tinha antes de tirar a rolha. Percebida a subtileza do mecanismo, é então altura de aprofundar o método. Permito-me, todavia, uma última deambulação pelos conhecimentos elementares sobre espumantes. Para dizer que estes apresentam, basicamente, três tipos. Socorro-me do futebol para ser melhor compreendido. Se o vinho for aparentado com José Mourinho, dizemos dele ser bruto. Se for do género Guardiola, chamamos-lhe doce. Se se apresentar como o cabelo do Jorge Jesus antes de uma segunda demão de Farandol, será meio-seco. Método, dizíamos. Vamos a ele. O vinho espumante pode servir-se na vertical. Tal e qual como subiu a cápsula que resgatou os mineiros chilenos.  Tal e qual como se fosse o descontrolo das contas públicas da Grécia. É o conhecido método wikileaks.  Profusão de borbulhas que se perdem no ar. Também lhe pode chamar método Gonçalo M. Tavares. Mas, só se o vinho for de qualidade. Em alternativa, ponha-se o copo inclinado. Neste caso, o contacto entre o líquido e o cristal que o há-de amparar faz-se de forma menos turbulenta. Como se fosse uma derrapagem da dívida soberana portuguesa. Controlada pela intervenção do BCE no mercado. Como se fosse o descalabro do BPN. (Des)controlado por injecções de milhões. De uma maneira ou de outra, o líquido chegará ao Fundo. Do copo. A diferença, leitor, é que, pondo-se este inclinado, a libertação do gás é, no imediato, menos intensa. E o gozo da bebida é mais prolongado. Agora que o leitor conhece o método correcto, devo-lhe algumas recomendações. O espumante celebra a amizade. Deve bebê-lo mesmo que as cadeiras de Liu Xiaobo e Guillermo Fariñas se mantenham vazias. Não há nada mais perturbador para os carcereiros do que as borbulhas que se libertam. Mas, não se esqueça, leitor. Antes de beber, deve fazer prova. De rendimentos. A taxa de alcoolemia admissível impõe a moderação. Daí as famosas taxas moderadoras. O leitor bem sabe que o povo tem de sofrer a crise como o Governo a sofre. O espumante também azeda. E isto está uma boa Merkel. Posto isto, em vez de passas, acompanhe com PECs. Três por 2010 e mais um pelo ano que aí vem. O que importa, leitor, é que acabámos de percorrer alguns dos acontecimentos mais importantes do ano que termina. Esqueci-me de algum? Qual? O casamento homossexual? Rima. Mas, não é verdade. Na foto coloquei dois copos felizes. Do mesmo género. Brindemos então com este espumante que não mata a sede, mas sa-CIA. Desejo-lhe um Guantánamo Novo muito feliz. Salve-se. Se puder!

Lido e registado (15)

Sérgio de Almeida Correia, 31.12.10

O princípio, que não admira tenha sido aceite tacitamente pelos maiores partidos (PS e PSD), é indecoroso. Ao nível do vulgar cidadão, um infractor não tem como compensar a multa a que foi condenado, por tribunais ou pela polícia. Os partidos, pelo contrário, transformam a multa em ‘investimento’: pagam-na agora, mas recebem-na depois. Se outras multas aplicadas a dirigentes partidários passarem também a ser incluídas nas despesas correntes, seja por mau estacionamento ou por qualquer acto indevido e punível, então todas elas passarão a ser pagas pelo Estado, ou seja, por todos os contribuintes, deixando incólumes os infractores”. – Editorial, Público, 27/12/2010

O caso Ensitel

Paulo Gorjão, 31.12.10

O caso Ensitel para mim é muito simples. Não estamos a falar de um conflito de consumo. Isso ficou lá para trás e é secundário para o caso. O que está aqui em causa, nesta altura, é a liberdade de expressão. É a liberdade de expressão da Maria João Nogueira (MJN), mas poderia ser a sua ou a minha. E nisso, peço desculpa, mas não tem que existir qualquer tipo de hesitação. Há que lutar com unhas e dentes. A MJN já nos faz o favor de defender a sua e a nossa liberdade de expressão. Ninguém lhe paga o tempo e as chatices. O mínimo que podemos -- e devemos -- fazer é ajudar a pagar os custos judiciais. No canto superior direito. É muito fácil e muito rápido. Vamos TODOS ajudar a defender a NOSSA liberdade de expressão. Uma pequena migalhinha a cada um não custa nada. O efeito acumulado é imenso. Passem a palavra. Um bom ano de 2011 para todos.

 

P.S. -- Quem preferir fazer um donativo não via PayPal mas através do NIB da MJN, nesse caso o número é o 0033 0000 45293471486 05.

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