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Delito de Opinião

Rostos do Sul (5)

Carlos Barbosa de Oliveira, 02.10.09


“De seringueira a presidente do Brasil”.  Este  pode ser o título de alguns jornais em todo o mundo se, em 2010, Marina Silva suceder a Lula da Silva, no palácio do Planalto.  Se esta mulher for eleita presidente do Brasil, não será apenas mais uma mulher sul americana a torpedear o destino. Será o rosto de uma mudança radical no modelo de desenvolvimento do Brasil e de uma grande parte do globo.
Filha de seringueiros,  nasceu em 1958 num seringal, no coração do Brasil verde. Teve uma infância igual à da maioria das crianças da região. O seu único direito era trabalhar, ajudando os pais no sustento da família. Condenada  a ser analfabeta, o seu destino mudou aos 15 anos. Uma hepatite levou-a para Rio Branco, onde foi acolhida numa  missão católica. Queria ser freira e aprender a ler. Aos 16 anos iniciou a sua alfabetização e nunca mais parou, até concluir uma  licenciatura em História e tornar-se professora.
Foi através da Igreja Católica que deu os primeiros passos na política,  mas o  activismo nas organizações  populares de base levou-a a perceber que o seu caminho passaria por outras vias: a luta contra o regime militar que governava o Brasil.
O teatro amador proporcionou-lhe os  primeiros  contactos com o Partido Revolucionário Comunista – que integrava o PT. Rapidamente  entrou nas lutas do movimento sindical  fundando em 1985, com Chico Mendes, a central Única dos Trabalhadores, na província de Acre.
A sua ascensão política foi rápida. Em 1988 foi eleita vereadora  em Rio Branco e, em 1995,  senadora pelo PT. Em 2003, Lula escolhe-a para ministra do ambiente.
Conhecedora da realidade amazónica e das implicações ambientais resultantes da sua destruição, desenvolveu um trabalho notável. Perseverante, proibiu a comercialização e cultivo de organismos geneticamente modificados e  tomou medidas arrojadas em diversas áreas, contrariando interesses económicos e criminalizando as empresas que, na cadeia produtiva, se comportavam como predadoras. Cerca de 1500 empresas foram obrigadas a alterar os seus procedimentos.
Contrária à visão passadista que vê nas políticas ambientais um entrave ao desenvolvimento, procurou tomar medidas estruturantes que se reflectissem num modelo de desenvolvimento sustentável.  Confrontada com as contradições  de desenvolvimento seguidas pelo governo e com os entraves colocados às suas medidas de protecção ambiental, terá entrado em ruptura com Lula, optando por abandonar o governo em 2008 e o PT já em 2009.
Numa entrevista recente a Jô Soares, reiterou a sua fidelidade ao PT, onde militou durante mais de 20 anos e construiu a sua consciência de cidadania. Na mesma entrevista afirmou que não saiu do governo para combater o PT. Fê-lo para provocar um maior debate sobre as questões ambientais. Aparentemente, conseguiu o objectivo.  Mobilizou os media brasileiros em torno do debate sobre a temática ambiental.
A luta que tem travado na defesa das questões ambientais não teve apenas repercussão no Brasil. Em 2007 recebeu o prémio “Champions of the Earth” – o mais importante atribuído pelas Nações Unidas na área do ambiente. Em 2008, a WWF entregou-lhe, em Londres, o  mais prestigiado prémio da organização, como reconhecimento pelo seu trabalho em defesa da Amazónia. Já este ano deslocou-se a Oslo para receber o prémio da fundação Sophie, criada pelo autor de “O mundo de Sofia”.  O reconhecimento internacional da relevância do seu trabalho em questões de desenvolvimento sustentável está bem patente na distinção que lhe foi atribuída pelo “The Guardian” que a considerou uma das 50 pessoas com melhores condições para salvar o planeta.
Tornar-se presidente do Brasil, pode ser um forte contributo mas, por agora, Marina Silva recusa-se a confirmar se avança com a  candidatura, apoiada pelo Partido Verde. “Quero provocar o encontro entre as políticas de desenvolvimento e as medidas ambientais,  não quero provocar o confronto” - disse recentemente numa entrevista.
 

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